123 anos: Com ares de interior, Capital tem convivência pacífica entre humanos e animais nos parques

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Imagem: Reprodução/André Bittar

Por Méri Oliveira – Jornal O Estado do MS

Que Campo Grande é uma cidade bastante arborizada, todos nós já sabemos. Que a Morena tem gorjear de pássaros variados a cada nova manhã, também. Que temos animais fofinhos passeando pelas ruas e parques, então, nem se fala. Que vivemos em uma Capital com atmosfera interiorana, é algo do qual nos gabamos desavergonhadamente. Mas será que temos real consciência e noção do quanto somos privilegiados por tantas belezas que nos enchem os olhos e encantam os ouvidos diariamente dentro do nosso tão amado “fazendão”?

André Bittar, fotógrafo de natureza, começou como fotojornalista e, com o passar do tempo, acabou indo para a fotografia de natureza, capturando imagens, em especial, de araras. “Eu acho muito legal esse lance das araras. Eu sei que foram as araras que me colocaram onde eu estou, então, com certeza, as araras de Campo Grande têm um papel muito importante na minha carreira na fotografia de natureza. Inclusive, me tiraram de um momento de muita tristeza, foram elas que me salvaram. Eu fico até emocionado de poder falar das araras de novo na minha vida”, afirma André.

A ideia de comercializar veio do lado artístico do fotógrafo, que queria transformar seu trabalho em obra de arte. “Depois que eu fiz o workshop do Araquém Alcântara [fotógrafo de natureza] na Serra do Amolar, ele me falou uma coisa muito interessante: ‘O processo da fotografia só acaba na parede’, que é ela como obra de arte. Eu sempre fui envolvido com arte, com desenho, com quadros, minha família também, então, foi um jeito que eu encontrei de continuar este lado artístico – fotografia é arte, como um todo –, mas as fotografias de natureza, impressas, conseguiram me aproximar de alguns familiares e do que eu sempre fiz, porque eu sempre desenhei, sempre pintei”, conta Bittar.

E o desejo de André não se resume a apenas mostrar seu olhar, ou aves eternizadas em fotografias, não. A dedicação pelo que faz tem objetivos que vão muito além, e se traduzem – indiretamente – em uma declaração de amor pela Cidade Morena. “Eu queria que as pessoas de Campo Grande e – do Brasil –, porque hoje eu já consegui vender fotos até para fora do país, inclusive de araras, para Holanda, França, Alemanha, então, gostaria de as pessoas conhecessem a biodiversidade que a gente tem em Campo Grande, essa ‘natureza urbana’, essa simbiose de natureza com cidade que Campo Grande proporciona”, dispara.

Privilégio

Para o biólogo e doutor em Ecologia e Conservação José Milton Longo, a convivência com os animais em plena área urbana é uma dádiva. “É um privilégio Campo Grande ter esse monte de fundo de vale, que proporciona esse encontro com a fauna silvestre, como as araras.” O lado biólogo, no entanto, vê com certa aflição e preocupação a presença dos bichinhos em área urbana, que acabam por procurar abrigo na cidade, como consequência do desmatamento e da devastação de seu habitat.

Um ponto que Longo salienta é no que tange à interação, que deve ser evitada, pois há o risco de o ser humano passar doenças aos bichinhos, tanto quanto pode contraí-las deles. “A proximidade com a fauna silvestre tem de ser de longa distância, pelo menos 15 metros para você garantir a sua segurança e a segurança do animal. A capivara, por exemplo, tem dentes incisivos que são uma ‘navalha’, e podem proporcionar um ferimento severo, caso ela se sinta acuada, mesmo em uma situação dessas, de carinho. Só visual, foto, isso já traz uma sensação de bem-estar, não é necessário você se aproximar da fauna silvestre”, assevera Milton.

Ele explica que Campo Grande oferece, também, possibilidades às aves. “Todas as praças e parques urbanos oferecem recursos para atração das aves. A gente tem araras e outra quantidade de aves silvestres, como tucanos, canários, bem-te-vis, sabiás, de várias espécies que também participam dessa vida urbana, porque a cidade tem condições de oferecer esses recursos a essas aves, mesmo que temporariamente.”

A alimentação de animais silvestres também é abordada pelo profissional: “Não se deve alimentar a fauna silvestre! Porque você não dá alimentação adequada a ela. Os animais procuram seus próprios alimentos nos remanescentes de vegetação, na natureza, mesmo. Você pode interferir – além do comportamento dela, ao fazer esse tipo oferta de alimentos, porque ela vai desaprender a caçar e vai ficar muito dependente da sua oferta – você pode introduzir uma alimentação inadequada, que pode interferir até no desenvolvimento hormonal desse indivíduo”, pontua.

Poderia ser melhor

Para o jornalista Maurício Ribeiro, que tem no Parque das Nações Indígenas o seu cantinho preferido na Capital, a convivência entre humanos e bichinhos poderia ser melhor por aqui. “Embora eu tenha ouvido de pessoas que moram fora, que têm em suas cidades espaços similares ao parque, e até de técnicos que atuam na área, que a convivência do campo-grandense com os animais do parque é relativamente boa, particularmente, penso que poderia ser melhor.”

A afirmação de Maurício vem ao encontro das informações passadas por Milton sobre alimentação de animais. “Não é raro ver as crianças correndo atrás dos animais sem a interferência dos pais ou responsáveis, a galera alimentando os animais e, na maioria das vezes, com produtos industrializados como salgadinhos, biscoitos. A relação poderia ser muito mais tranquila, respeitosa, de contemplação, respeitando o animal e ter um limite saudável”, pontua Ribeiro.

O jornalista finaliza, afirmando que não há melhor remédio para a saúde mental: “Quanto ao lance da saúde mental, com certeza! Ter essa experiência, o contato com a natureza, aquele visual, ter o privilégio de apreciar tudo isso é o melhor antidepressivo e ansiolítico que existe”.

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