Pequenos negócios são os mais afetados com a inflação da proteína
Assim como não existe feijoada, sem feijão preto, em algumas receitas de confeitaria não tem como substituir um dos ingredientes-chave, o ovo. Cerca de 85% dos estabelecimentos de alimentação fora do lar no Brasil são de pequeno porte, e são os mais prejudicados com os aumentos dos ovos, segundo defende o presidente da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), Paulo Solmucci.
“A alta no preço dos ovos afeta especialmente os pequenos negócios, que são a maioria no setor, com estrutura enxuta e margem apertada. Para esses empreendedores, oscilações de custo como essa comprometem diretamente a sustentabilidade do negócio”, avalia o representante do setor. O ovo de galinha vem registrando sucessivos aumentos de preço. Somente em março, a alta foi de 13,13%, segundo dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
Estabelecimentos de alimentação fora do lar que dependem do ovo em suas receitas estão entre os mais vulneráveis à escalada de preços. De bolos à panetones, na confeitaria Doces da Isa, as produções exigem uma grande quantidade de ovos, e nas sobremesas citadas não há como substituir a proteína por outro produto que garanta a mesma qualidade e sabor.
“Infelizmente o ovo é um dos ingredientes mais importantes na confeitaria, substituir o produto é impossível na maioria dos casos, então para nós desse ramo a única solução é imbuir esse aumento de valor em nossos produtos, pois uma substituição desse ingrediente poderia comprometer no resultado final dos nossos produtos”, explica a proprietária, Isadora Melgarejo.
Em alguns comércios existem a dificuldade de repassar o aumento dos custos para o produto, e consequentemente para o consumidor, casos em que os empresários acabam arcando com o prejuízo para não perder o cliente. Solmucci, ainda pontua que há um descompasso entre o ritmo da inflação e a capacidade de repasse. “A lógica do setor não permite aumentos automáticos de preço, como ocorre em outras cadeias produtivas. Quem não consegue ajustar a operação com rapidez, vê a rentabilidade desaparecer”, ressalta.
Embora a produção nacional tenha alcançado um recorde em 2024, com crescimento de 10% em relação ao ano anterior, o aumento dos preços não foi contido. No quarto trimestre, a produção chegou a 1,2 bilhão de dúzias, o maior volume trimestral da série histórica do IBGE. Ainda assim, o impacto dos custos, somado ao aumento das exportações, sustenta a tendência de encarecimento.
Margem de lucro comprometida
A tomada de decisão de não repassar para o consumidor final os aumentos dos insumos, é uma realidade que acontece com cerca de 32% dos estabelecimentos de serviço e comércio. Segundo pesquisa da Abrasel, realizada em março, quase um terço dos empresários de alimentação fora do lar não conseguiram repassar os preços, e 59% reajustaram conforme ou abaixo da inflação.
Para compreender como o insumo afeta a operação e as finanças, Sérgio Molinari, especialista em mercado de foodservice, destaca um ponto crítico: “O ovo é muito perecível. Você não pode estocar por muito tempo, o que faz com que, mesmo com preços em alta, seja necessário comprar frequentemente, dificultando que o estabelecimento possa se beneficiar de compras grandes para obter melhores preços e se antecipar a novas altas”, comenta.
O profissional ressalta que é necessário entender o peso desse ingrediente nas receitas. “De uma omelete até as receitas em que é coadjuvante, a inflação dos ovos impactará diretamente nos custos do estabelecimento”, explica. Molinari defende que é fundamental adotar estratégias que minimizem os impactos da inflação.
Entre as alternativas apontadas estão o redirecionamento das vendas para pratos com maior margem de lucro e menor uso de ovos, a avaliação da substituição dos ovos in natura por versões líquidas ou em pó, e o controle rigoroso sobre perdas e desperdícios. A negociação com fornecedores também é vista como essencial para conseguir melhores condições comerciais.
Top 3 dos mais caros
Os aumentos nos preços do ovo de galinha, café moído e do tomate puxaram a inflação dos alimentos, em março, conforme revelou o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15), divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O arroz, por outro lado, teve redução de preços pelo quinto mês consecutivo.
No geral, a inflação da alimentação no domicílio acelerou a 1,25% em março. O resultado veio após alta de 0,63% em fevereiro. O ovo de galinha disparou 19,44% em março, enquanto o café moído mostrou alta de 8,53%. Com isso, cada um gerou impacto de 0,05 ponto percentual no IPCA-15. Foram as principais pressões do lado dos alimentos.
A carestia do ovo já tinha chamado a atenção no índice oficial de inflação do Brasil, o IPCA, também calculado pelo IBGE. Em fevereiro, a alta no IPCA havia sido de 15,39%, a maior desde o início do Plano Real. O IBGE atribui a inflação do ovo a uma combinação de fatores, como a maior demanda em razão do retorno das aulas no país, as exportações devido a problemas de gripe aviária nos Estados Unidos e os impactos do calor na produção no Brasil.
Por Suzi Jarde
Confira as redes sociais do O Estado Online no Facebook e Instagram
Leia mais
Inadimplência atinge 28,8% das empresas do Estado em fevereiro