Morte de Papa Francisco suspende canonização de Carlo Acutis e é marcada por legado de fé e inclusão

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O mundo se despediu ontem (21) do Papa Francisco, líder máximo da Igreja Católica por 12 anos. Jorge Mario Bergoglio, o primeiro papa latino-americano da história, morreu aos 88 anos, em Roma, após enfrentar complicações de saúde relacionadas a uma infecção respiratória.

A morte de Francisco também impactou diretamente os eventos religiosos no país. A canonização do beato Carlo Acutis, jovem italiano a quem é atribuído um milagre relatado em Campo Grande (MS), foi suspensa. A cerimônia, prevista para o dia 27 de abril, durante o Jubileu dos Adolescentes, seria presidida pelo papa.

Durante coletiva de imprensa realizada ontem (21) na Capela do Milagre, na Capital, padre Marcelo Tenório se pronunciou sobre a morte do Papa Francisco e sobre a canonização do beato Carlo Acutis. Tenório destacou a relevância de Francisco durante seu papado e detalhou que a decisão do conclave pode interferir na canonização do beato. O sacerdote, contudo, demonstrou confiança de que a canonização será abençoada pelo novo pontífice, devido ao importante legado construído por Carlo.

Padre Marcelo Tenório relembrou o carinho do Papa Francisco para com Carlo Acutis – Foto: Roberta Martins

“O novo Papa dará continuidade aos processos já iniciados, mas ele também traz suas prioridades e estilo. De toda forma, confiamos que o legado de Carlo e tudo que já foi construído até aqui será respeitado e levado adiante. O caso do Carlo é realmente excepcional. Apenas quatro anos após sua beatificação, sua canonização já estava marcada. Isso mostra a força do testemunho dele e o impacto que ele tem causado, especialmente entre os jovens”, ressaltou.

Tenório também esclareceu a importância do papel do Papa na Igreja Católica e explicou que, por isso, a canonização só pode ser realizada pelo pontífice — ou por alguém designado por ele. Sobre o processo de canonização de Acutis, ele detalhou que a cerimônia ocorrerá apenas após as solenidades fúnebres do Papa, que duram cerca de sete dias, e após a decisão do conclave, prevista para ser concluída entre 15 e 20 dias.

“Na Igreja Católica, o Papa é a autoridade máxima, e somente ele pode canonizar um beato. Ele também pode delegar essa função a outra pessoa. No nosso caso, o Papa Francisco já havia assinado o decreto de canonização de Carlo Acutis. No entanto, para que a cerimônia aconteça, é necessário que ele esteja presente ou que tenha nomeado um delegado para representá-lo. Com o falecimento do Papa, esse delegado ainda não foi definido, e agora o foco está nos funerais e na eleição do novo pontífice. Portanto, precisamos aguardar”, esclareceu.

Ao comentar sobre o papado de Francisco, padre Marcelo Tenório o definiu como o “Papa das multidões, das massas”, ressaltando o “diálogo com todos” como uma de suas maiores virtudes e ensinamentos. Segundo ele, essa foi a principal marca deixada por Francisco.

“Cada Papa tem sua peculiaridade, sua marca. Bento XVI foi o Papa da teologia. Francisco foi o Papa das multidões, das massas. Esse é o grande legado que ele deixa: o diálogo com todos, com pessoas de diferentes pensamentos e realidades. Não que Bento XVI também não dialogasse, mas cada um deixou sua marca mais firme em algum ponto. Penso que esse espírito de abertura e proximidade com o povo é o grande legado de Francisco.”

Com o falecimento do Papa, padre Tenório informou que as festividades que antecederiam a canonização de Carlo Acutis foram canceladas, assim como a missa em celebração de ação de graças que seria celebrada no próximo domingo (27). “Agora, aguardamos uma nova data, que só poderá ser definida após a eleição do novo Papa. Assim que tivermos essa definição, divulgaremos a nova programação”, explicou.

Foto: Roberta Martins

Outras atividades realizadas pela Arquidiocese também foram suspensas. Na noite de ontem (21), foi celebrada uma missa na catedral em homenagem a Francisco, com a presença do clero e fiéis.

Ainda durante sua fala, Marcelo Tenório relembrou o carinho que Francisco nutria por Carlo Acutis. O padre recordou ocasiões em que o jovem foi citado em documentos oficiais do Vaticano e um momento de prece significativo, no qual o Papa carregava consigo uma foto de Carlo.

“O Papa era muito devoto do Carlo. Nós sempre contamos com essa amizade e carinho que ele demonstrava. Tanto é que Carlo foi citado três vezes em documentos oficiais do Vaticano. E, certa vez, o Papa rezava sozinho na Praça de São Pedro, e dentro do seu livro de orações havia uma pequena foto do Carlo. Ele queria muito estar presente na canonização, porque realmente nutria grande carinho por ele”, rememorou.

O jovem Carlo Acutis também é prestigiado por sua forte influência com os mais jovens e por seu ativismo voltado à religião.“Carlo é um jovem do nosso tempo. Muitos santos que veneramos viveram há séculos, o que às vezes gera uma sensação de distanciamento. Já o Carlo é diferente: ele faleceu em 2006. É possível encontrar vídeos, textos, fotos dele. Para o Papa, ele representa um grande ícone da juventude atual — assim como João Paulo II também despertava grande admiração entre os jovens”, destaca.

Pe. Marcelo Tenório reforçou que o calendário será seguido a risca após a escolha do novo Papa assim como a apresentação da no relíquia do Beato, que já está em Campo Grande.

“Ela será apresentada apenas quando a nova data for anunciada. Seguiremos rigorosamente o calendário que já havíamos preparado. As datas mudarão, mas manteremos a programação original. A relíquia será apresentada no primeiro dia da nova programação”, afirma.

Saúde fragilizada

Francisco estava internado desde fevereiro, inicialmente diagnosticado com bronquite. O quadro evoluiu para uma infecção polimicrobiana e, mais tarde, para uma pneumonia bilateral. Mesmo hospitalizado, o pontífice participou de atividades religiosas até que sua condição se agravasse, culminando em cerca de 40 dias de internação no hospital Agostino Gemelli.

O papa se despediu oficialmente do cargo em uma cerimônia emocionante na Praça de São Pedro, reunindo milhares de fiéis e líderes religiosos de todo o mundo. Sua renúncia já vinha sendo especulada devido à saúde fragilizada, e foi confirmada sob a justificativa de “diminuição das forças físicas e o desejo de garantir o bom funcionamento da Igreja”.

Entre suas ações mais emblemáticas, destacam-se a reforma da Cúria Romana com foco em transparência financeira, a abertura ao diálogo com grupos marginalizados, o acolhimento de imigrantes e a luta contra a pobreza. Também se posicionou de forma firme em questões políticas, como durante a pandemia de Covid-19, quando rezou sozinho na Praça de São Pedro, pedindo pela humanidade em quarentena.

Despedidas

Em Campo Grande, o arcebispo Dom Dimas Lara Barbosa prestou uma homenagem emocionada ao pontífice, a quem sempre considerou uma grande inspiração. Para Dom Dimas, embora o momento seja de luto, também é de esperança e fé. “Tenho certeza de que hoje é dia de festa no céu”, declarou.
Em entrevista ao jornal O Estado, o arcebispo compartilhou a dor da perda: “É alguém que eu sempre admirei muito, que sempre procurei pautar…não conseguia, mas sempre procurei pautar o meu ministério à luz dos ensinamentos do papa Francisco. Naturalmente, do Evangelho em primeiro lugar, e dos ensinamentos do papa em segundo.” A programação completa das homenagens ainda será definida em conjunto com os padres da Arquidiocese.

Foto: Nilson Figueiredo

Dom Dimas relembrou com carinho os momentos em que esteve com o papa Francisco, inclusive antes de ele assumir o papado. Um dos encontros mais significativos aconteceu em Aparecida (SP), durante a visita do então papa Bento XVI, quando Jorge Mario Bergoglio, ainda cardeal e arcebispo de Buenos Aires, chefiou a redação da Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, em 2007.

“Sempre fui muito percebido por ele. Aquele foi meu primeiro contato mais direto. Foram 16 dias de convivência e partilha”, disse. Desde então, Dimas esteve com Francisco ao menos seis vezes, em encontros no Rio de Janeiro, Medellín (Colômbia), Puebla (México), Santo Domingo (República Dominicana) e Roma, em visita oficial ad limina apostolorum com os bispos de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

Durante um desses encontros no Vaticano, o papa surpreendeu os bispos ao pedir que todos falassem em português. “Mais uma vez, ele confirmou aquilo que a gente já sabia: muito acolhedor. Ele falava em espanhol, e a gente se entendia muito bem. Trago muitas e boas recordações do papa Francisco”, afirmou.

Ao comentar sobre o legado do pontífice, Dom Dimas destacou duas marcas profundas deixadas por Francisco: a atenção aos pobres e sofredores, e a centralidade da misericórdia de Deus. “Ele foi o Papa da misericórdia. Sempre que havia conflitos, ele se manifestava, oferecia ajuda, pedia orações. Isso vale para a Ucrânia, a Faixa de Gaza, a África, a Nicarágua…”, explicou.

Dom Dimas também ressaltou que Francisco abriu a Igreja para um novo tempo. “Ele nos ensinou a ser uma Igreja em saída, que vai ao encontro das periferias existenciais — dos angustiados, deprimidos, esquecidos, abandonados. Ele nos chamava a estar com os que mais sofrem.”
Sobre o futuro da Igreja, Dom Dimas disse confiar na condução divina. “Quando o Papa Bento renunciou, foi uma comoção. E aí veio Francisco, um latino-americano. Uma bênção. Agora, os caminhos de Deus vão continuar. Tenho certeza de que será escolhido aquele que a Igreja precisa neste momento”

O que acontece agora

Com a morte de Francisco, a Igreja entra na fase chamada Sé Vacante, período em que o trono de Pedro fica vazio até a eleição de um novo papa. Durante esse intervalo, o Vaticano é administrado pelo camerlengo, atualmente, o cardeal irlandês Kevin Joseph Farrell, responsável por cuidar dos bens da Santa Sé e coordenar o funcionamento da estrutura eclesiástica.

Nos próximos dias, o Colégio dos Cardeais se reunirá nas chamadas Congregações Gerais para definir os detalhes do funeral e preparar o Conclave, cerimônia que elege o novo pontífice. Dos 252 cardeais, 138 têm direito a voto, incluindo sete brasileiros.

O Conclave ocorre na Capela Sistina, em completo isolamento. Para ser eleito, o novo papa precisa alcançar dois terços dos votos. Quando isso acontece, a tradicional fumaça branca sobe pela chaminé, anunciando ao mundo: Habemus Papam — “Temos um Papa”.

 

Por Inez Nazira, Juliana Aguilar e Ana Cavalcante

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