Helton Vaccari expõe em SP

Foto: Arquivo Pessoal
Foto: Arquivo Pessoal

Artista campo-grandense participa de exposição no Sesc Belenzinho na mostra “Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro”

[Texto: Ana Cavalcante, Jornal O Estado de MS]

Helton Vaccari, nascido e criado em Campo Grande, é um dos artistas expositores da mais abrangente mostra à produção de artistas negros “Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro”. Instalada no Sesc Belenzinho, a abertura da exposição vai acontecer na terça (2), às 19 horas, em São Paulo. A exposição é composta por fotografias, pinturas, entre outras produções de mais de 240 artistas e receberá visitantes até 28 de janeiro de 2024. A partir do ano que vem, parte da instalação circulará pelas unidades do Sesc pelo país.

Helton é artista visual formado pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), mas o seu percurso artístico passou por uma instituição muito mais importante. Seu primeiro estudo no campo das artes foi por meio de desenhos traçados em cadernos da mãe, desde então, certificou-se que o seu caminho não poderia ser outro, a não ser o de cumprir o papel fundamental e importante que é o do artista. “Assim como para a maioria dos artistas, sempre tive afinidade com as artes desde muito cedo, desenhando em qualquer pedaço de papel, principalmente dos livros e revistas de receitas da minha mãe”, afirma.

Durante sua formação artística, o profissional se relacionou com várias linguagens até encontrar uma prática que contemplasse seu desejo em expressar. Experimentando desde o desenho, até escultura e fotografia, mas é com a pintura que o artista se realiza. “Além de desenho, tive alguma experiência com a fotografia e com escultura, e foram as linguagens que mais me interessavam em desenvolver na faculdade, mas, até aí, era só afinidade com alguma prática artística em si. E eu experimentava muita coisa, mas ainda não havia encontrado uma poética própria, até surgir meu encontro com a pintura.”

Foto: Divulgação

Helton ainda explica que o repertório intrínseco em sua arte advém do universo acadêmico, porém, as trocas estabelecidas nesse meio e fora dele, além de enriquecer seus conhecimentos técnicos para a execução da arte, também
o conduziram para uma vida mais consciente e crítica em relação ao meio social. “Tive a oportunidade de fazer muitas trocas com amigos, professores, colegas dentro e fora da academia. Foram trocas que, em maior ou menor grau, contribuíram nesse processo, onde eu passei a tomar consciência da minha negritude”, explica o artista.

Racismo estrutural e ausência de políticas públicas efetivas são alguns dos temas articulados simbolicamente em suas obras. Discursos que estão enraizados na organização social e atravessam os indivíduos, e nesse caso, em específico, as pessoas negras. “O trabalho que desenvolvo hoje deriva do meu interesse sobre efeitos que a vivência em um contextosocial extremamente hostil, como é o nosso, estruturado pelo racismo, tem sobre nossa subjetividade. Além disso, com essas pesquisas tive contato com a obra de grandes autoras e autores e também pude revisitar as minhas próprias vivências e sentimentos que, até então, não sabia dar nome; as situações de discriminação explícitas ou veladas, a rejeição à minha autoimagem, e a falta de uma perspectiva positiva sobre meu próprio futuro”, declara o artista.

Sobre a obra selecionada para exposição, são retratados os pés de uma pessoa negra que se equilibra sobre o crânio, que por sua vez flutua no mar sem um horizonte visível, de acordo com o autor, e Helton explica sobre as referências articuladas em seu desenho. “A imensa gama de significados que podem ser atribuídos ao crânio é o que o torna um elemento onipresente nas minhas obras. Na obra em questão, o crânio flutua sobre a água e pode nos remeter à instabilidade, a iminência da morte, ou mesmo da miséria ou escassez, e também assume outras possibilidades quando nos atentamos à forma como ela flutua e o peso que sustenta. Não correspondem às leis do mundo como conhecemos, é algo impossível. O mesmo acontece com os pés que, apesar da instabilidade que a lógica sugere, repousam e mantêm seu equilíbrio com uma certa leveza. Isso é sobre a resistência ao longo dos séculos de morte e exploração, e pode falar também dos antepassados que pavimentaram o caminho até aqui. O mar tem intima relação com a história do povo africano e afro-brasileiro, tanto pela sua religiosidade ou pelas marcas da diáspora.” O artista ainda comenta que a pintura compõe uma série denominada “Atlas” e faz referência ao titã da mitologia grega que sustenta o céu (ou o peso do mundo) em seus ombros.

O artista visual ainda acrescenta que iniciativas como essa são de suma importância para a representatividade da produção afro-brasileira. “Uma mobilização como essa é essencial, pois promover a pesquisa e a produção intelectual negra nos dá autonomia para recontar a nossa história e a história do país”, afirma Helton.

‘Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro’

Com mais de 300 obras e 240 artistas, é a maior mostra já realizada no país voltada à visibilidade da produção afro-brasileira. A exposição “Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro” apresenta obras de diversas linguagens, pintura, fotografia, escultura, instalações e videoinstalações de artistas de todos os Estados. Com o cuidado de se atentar ao interior e olhar para outros lugares além das capitais, também foram selecionadas obras desde o fim do século 18 até o século 21, produzidas por homens e mulheres cis e trans negros de todo o Brasil. Preocupado em abrir o espaço para os mais diversos segmentos sociais, o projeto é uma iniciativa do Sesc Belenzinho (Serviço Social do Comércio).

A instituição desenvolveu um projeto que pudesse viabilizar narrativas que outrora foram proibidas de compor e contar as suas próprias histórias.

Divulgação

A curadoria é assinada por Igor Simões em parceria com Marcelo Campos e Lorraine Mendes. “O projeto nasce em 2018, com a vontade do Sesc e partir de suas próprias ações e acervo, para ter um olhar voltado para a produção negra na cultura brasileira. A princípio, foram 100 vagas disponibilizadas, mas recebemos mais de 500 inscritos, então abrimos 150 vagas a mais”, explica.

Para Ana Sandim, campo-grandense, artista e mestre em ensino de arte pela UFMS, Helton ser um dos convidados à exposição, além de ser uma honra para a Capital é um ato de relevância para a representação e debates sobre a produção artística e social da negritude.

“Ter o Helton Vaccari representando a arte de Campo Grande é mais que  necessário, é urgente. Além de seu talento inquestionável, domínio da técnica e pintura absurdamente rebuscada, o mesmo se debruça sobre a arte contemporânea e suas urgências: realiza em suas obras um olhar a partir de sua identidade e tece potentes debates sobre a negritude e seus enfrentamentos como homem negro no nosso país”, afirma.

A artista ainda acrescenta que é importante mais incentivos e atenção à cultura da cidade, pois por mais que haja avanços, alguns retrocessos aconteceram. “Campo Grande tem avançado, e muito, nos incentivos à cultura. Mas ainda falta muito”, pondera.

O Espaço Sesc Belenzinho fica na rua Padre Adelino, 1.000, Belenzinho, São Paulo–SP. Para mais informações sobre o evento, o centro cultural tem o perfil no Instagram: @sescbelenzinho. Sobre o trabalho artístico de Helton, visite o perfil @helton.vaccari.

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