Enquanto movimentos estratégicos e exposição na mídia acontecem majoritariamente entre homens, pré-candidaturas femininas seguem invisibilizada
A fase pré-eleitoral de 2025 em Mato Grosso do Sul expõe um cenário que preocupa algumas parlamentares mulheres: a quase total ausência de figuras femininas entre as pré-candidaturas e filiações em destaque. Conforme levantamento da equipe de reportagem de O Estado, que conversou com deputadas estaduais e vereadoras de Campo Grande, mulheres seguem invisibilizadas no processo político, e esse apagamento já ameaça o desempenho feminino nas urnas em 2026.
Hoje, os números da representatividade feminina no Estado são escassos. Das 24 cadeiras da Assembleia Legislativa, apenas três são ocupadas por mulheres. Na Câmara dos Deputados, de oito parlamentares federais, somente uma é mulher. Na Câmara Municipal de Campo Grande, das 29 cadeiras, apenas duas são ocupadas por mulheres. O único contraste está no Senado, onde duas das três vagas são femininas, uma exceção em meio a um panorama predominantemente masculino.
A baixa presença de mulheres no debate pré-eleitoral de 2025 reforça a preocupação: a falta de visibilidade agora pode resultar em ainda menos mulheres eleitas em 2026. O risco de retrocesso é mencionado por quase todas as parlamentares ouvidas pela reportagem. Para algumas isso significa menos estrutura, menos apoio partidário, menos tempo de preparação e menos visibilidade para as mulheres quando o processo de campanha começar.
Pré-eleitoral dominado por homens limita projeção feminina para 2026
Embora o período pré-eleitoral costume ser decisivo para impulsionar nomes, construir alianças e consolidar candidaturas, em 2025 o protagonismo se concentra quase exclusivamente nos homens. São eles que ocupam os espaços de mídia, as filiações de maior repercussão e os primeiros movimentos estratégicos para o pleito de 2026.
A deputada estadual Lia Nogueira (PSDB), que disputará a reeleição, reconhece o risco, mas acredita em possibilidade de avanço, ainda que difícil. Para ela, a sub-representação é histórica e acompanhada de obstáculos que atingem apenas as mulheres. “Nós estamos na segunda vez na história de Mato Grosso do Sul com três mulheres na Assembleia. Mas, em um universo de 24 parlamentares, nossa participação está muito aquém. Existe uma dificuldade maior para as mulheres, isso é fato”, afirma.
Lia também relembra episódios de violência política de gênero vividos tanto por ela quanto pela deputada Gleice Jane. “Todos os dias nós precisamos quebrar barreiras. Não basta ser competente, precisamos provar isso diariamente. A sociedade não quer nos ouvir e não quer que tenhamos espaço de fala”. Apesar disso, acredita que um movimento organizado pode elevar a presença feminina nas campanhas de 2026.
A também deputada estadual Gleice Jane (PT), que busca a reeleição, é direta sobre o cenário, a violência política, o aumento dos feminicídios e a sobrecarga de responsabilidades colocam as mulheres em posição de desvantagem. “Há um contexto de opressão na sociedade contra as mulheres. Elas não participam da política porque têm uma demanda gigante de trabalho é porque são oprimidas nos espaços onde estão”, afirma.
Ela ressalta que o pré-eleitoral deveria ser exatamente o momento em que as legendas apresentassem suas pré-candidaturas femininas, caso realmente levassem a sério as cotas de gênero, o que, segundo ela, não ocorre. “As mulheres não estão aparecendo no período pré-eleitoral, não são pré-candidatas. Aí, quando chega no processo eleitoral, têm menos condições de se eleger. Isso é muito sério”. Gleice reforça que partidos, se não assumirem responsabilidade, irão repetir o habitual, candidaturas femininas lançadas apenas para cumprir cota, sem estrutura real.
A deputada estadual Mara Caseiro (PSDB), pré-candidata a deputada federal, enxerga risco real de diminuição do número de mulheres eleitas tanto para a Assembleia quanto para a Câmara Federal em 2026. “Quando filiações e pré-candidaturas masculinas recebem mais destaque, isso impacta o estímulo para que mais mulheres disputem espaço. Há risco de retrocesso”.
Para ela, apenas uma mudança na postura dos partidos pode alterar o quadro. “A representatividade precisa ser construída. Os partidos devem dar visibilidade real às pré-candidaturas femininas, garantir estrutura de campanha, formação política e ambientes internos em que as mulheres sejam ouvidas e respeitadas”.
A deputada reforça ainda que a diversidade melhora a qualidade das políticas públicas, destacando que representatividade não é pauta apenas das mulheres, e sim, uma pauta democrática.
Entre as pré-candidatas a deputada estadual, a vereadora Ana Portela (PL) reconhece o histórico conservador do Estado, mas acredita em um crescimento da participação feminina em 2026, e rejeita a ideia de que mulheres não apoiam outras mulheres.
“Havia aquela fala de que mulher não vota em mulher. Eu acho que vota, sim. Acho que cada vez mais as mulheres, nós estamos juntas num propósito de querer realmente um estado melhor, um município melhor, então, eu acredito que a gente vai conseguir aumentar os números de vagas de mulheres realmente que querem fazer a diferença, que não estão ali só realmente para cumprir cota”, comentou.
No entanto, ainda que otimista, ela reconhece a estrutura majoritariamente masculina dos partidos. “As vagas sempre ficam para os homens, seja na Câmara Municipal, na Assembleia ou na Câmara dos Deputados”.
Já a vereadora Luiza Ribeiro (PT) traz uma análise estrutural: as cotas de candidaturas não são suficientes para mudar o resultado das urnas. “Na hora da disputa, as mulheres ficam para trás: no financiamento, nos apoios políticos, no tempo de exposição”.
Ela defende a adoção de um modelo que já funciona em países latino-americanos. “Precisamos aprovar leis que garantam a paridade de cadeiras, metade mulheres, metade homens. Enquanto isso não acontecer, teremos muita dificuldade de avançar”, relatou.
Para Luiza, a perspectiva para 2027 não é de aumento espontâneo da presença feminina nos parlamentos. “Vamos lutar para aumentar, mas a tendência não é positiva. Sem paridade dos eleitos, não teremos democracia representativa de verdade”.
Risco real de retrocesso
A avaliação geral das parlamentares e especialistas indica um consenso preocupante: a invisibilidade das mulheres no pré-eleitoral de 2025 pode resultar em menos mulheres eleitas em 2026, agravando uma sub-representação que já é crítica.
Com as siglas priorizando homens nas estratégias de filiação, na construção de lideranças e no investimento prévio, mulheres entram mais tarde no processo e chegam às urnas com menor competitividade.
Por Brunna Paula
Acesse as redes sociais do Estado Online no Facebook e Instagram