“Vacina, sim. Vacina sempre”, diz médico pioneiro no tratamento da poliomielite em MS

Imagem: Reprodução/Agência Brasil
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Erradicada há mais de 30 anos, a doença pode retornar ao Brasil devido queda da cobertura vacinal

Talvez nem todo mundo saiba, mas o Dr. Hélio Mandetta, 91 anos, pai do ex-ministro da Saúde, Henrique Mandetta, foi pioneiro da ortopedia em Mato Grosso do Sul e no tratamento de crianças e adolescentes com poliomielite durante uma epidemia da doença nos anos 60, em Campo Grande. Ao jornal O Estado, ele contou sobre sua trajetória, marcada por muito estudo e dedicação e, também sobre sua preocupação com a atual queda nos índices de vacinação, sobretudo da poliomielite que é contra a paralisia infantil.

De acordo com os dados atualizados fornecidos pela Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), a vacina contra a Poliomielite registrou em 2022, uma cobertura parcial de 67,11%, sendo que o recomendado pelo Ministério da Saúde é de 95%. Nos anos anteriores, a vacina que é chamada de VIP apresentava uma cobertura de 85,95% (2017), 85,7% (2018), 84,6% (2019), 82,7%(2020) e 78,27% (2021).

Diante disso, o médico destaca que o vírus da poliomielite é altamente contagioso, pode levar à morte ou deixar sequelas graves como a paralisia infantil, que é irreversível. “Essa doença foi responsável por gerações de pessoas com problemas de locomoção, que perderam os movimentos dos membros inferiores, das pernas, e que afetam por toda vida, pois prejudica o desenvolvimento e acarreta em outros problemas como o de coluna”, explica.

Dr. Hélio é enfático em defender o imunizante, que é o único modo de prevenção contra a doença. “Quando eu falo em paralisia infantil eu costumo dizer que toda casa sempre tem uma criança de 2 meses, 10 meses, 1 ano e quando ela começa a andar vai pra lá e pra cá, todo mundo fica admirado com a criança que está começando. Muito bem, sem vacinar, ela vai para a cadeira de rodas! Falo assim para ver se os pais entendem isso. Ou seja, vai lá e vacina!”.

Primeiro registro

No Brasil, o primeiro registro de surto de poliomielite foi em 1911 quando ainda não existia a vacina. As epidemias e surtos da doença continuaram por décadas no país e no mundo. A vacina injetável criada por Jonas Salk, chegou ao país em 1955 e a vacina em gotinha, criado por Albert Sabin, em 1961.

Dr. Hélio recorda como foi enfrentar os inúmeros casos que surgiram em Campo Grande. “Em outubro de 1964 teve um surto de paralisia infantil. Uma criança da cidade de Jardim veio à procura de um diagnóstico e foi hospitalizada. Era poliomielite e a partir dali nós tivemos um surto, porque a paralisia infantil se transmite pelas fezes, pelo contato, peças de roupa, lençol da cama etc. Nesse mesmo mês eu internei 116 crianças com paralisia infantil na Santa Casa. Nós éramos em quatro ortopedistas, trabalhando das 7h às 17h”, relembrou o médico.

Dr. Hélio Mandetta conta que quando optou pela especialidade em ortopedia foi estudar no Estados Unidos, no Instituto Franklin Roosevelt, onde em contato com crianças e jovens com paralisia infantil se deparou com um único desejo, o de voltar a andar. “Minha esposa foi comigo e ficou muito admirada de ver que a queixa das crianças era uma só, a de que queriam voltar a andar. Foi então que escrevi um trabalho para acabar com a paralisia infantil no Brasil. Coloquei assim: Vacina sim, vacina sempre! E expliquei o porquê da necessidade”, recordou destacou que atualmente “nós não devemos fazer campanha só no mês de outubro, que é o mês da paralisia infantil. Mas, ao longo do ano para que não se esqueça, de levar seu filho (a) para vacinar”.

Advogada revela marcas da doença

Uma das pacientes do Dr. Hélio Mandetta, a advogada campograndense, Gilcleide Maria dos Santos Alves, 73, foi diagnosticada com poliomielite ao 1 ano e dois meses de vida. Conforme o médico, ela teve uma forma considerada branda da doença, que só afetou a perna direita. “Nessa época ainda não existia a vacina. Eu não tive esse privilégio. Minha mãe não sabia o que era e após uma anamnese descobriu ser a pólio. Dr. Mandetta cuidou de mim, eu fazia massagens, banho de luz e tudo o que estava ao alcance”, contou.

Se movimentando com um pouco de dificuldade e atualmente com dores no joelho e na coluna, Dra. Gilcleide se emocionou ao lembrar que apesar das teve uma infância normal, pôde andar e brincar. O que infelizmente não ocorre com quem é acometido pela doença. “Ela é uma advogada ativa, dinâmica e que sempre superou todas as adversidades. Uma lutadora e tem que ser, as mulheres são importantes no mundo”, elogiou o médico e também amigo da advogada, Dr. Hélio. Por fim, Dra. Gilcleide reforça a importância das vacinas. “Se nós negarmos a ciência, vamos parar aonde? Que futuro teremos? Coloquem na cabeça que as vacinas são importantes. Só tenho a pólio porque não existia vacina. O brasileiro precisa ter noção de que é um problema que pode ser evitado”, finalizou.

Rotary Club de Campo Grande destaca que missão pela erradicação da pólio continua

Uma das sete principais iniciativas do Rotary Club, é o combate à poliomielite em todo o mundo. A erradicação da pólio é uma das mais longas e importantes ações na trajetória do clube de rotarianos.

O presidente do Rotary Club em Campo Grande, José Ricardo Zanin destacou ao O Estado que continuarão atuando para combater a queda na taxa de adesão à vacina. “Em determinada época temos o foco principal numa dessas áreas e quando veio a campanha da multivacinação, nós focamos muito forte na área da saúde atuando com a intensidade que o momento exige. O Rotary trabalha para erradicar a pólio há mais de 35 anos. Foram doados mais de U$2,5 bilhões de dólares e incontáveis horas de trabalho para ajudar a imunizar bilhões de crianças contra a paralisia infantil em 122 países. Representando uma redução de 95% no número de casos mundial”, elencou.

Diante da possível volta da doença ao Brasil, Zanin diz que este é um alerta para todos os rotarianos unirem forças na conscientização da população. “A pólio já voltou a manifestar nos Estados Unidos, em Israel e até o ano passado existiam poucos casos restrito ao Paquistão e Afeganistão, que são países resistentes à vacina. Nós do Rotary Club de Campo Grande estamos trabalhando fortemente com o objetivo da melhoria contínua da taxa de vacinação. Não só em Campo Grande, mas em todo o estado de Mato Grosso do Sul”, pontuou.

Por Suelen Morales – Jornal O Estado do MS.

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