Na periferia, escola pública ensina cuidado ambiental em laboratório a céu aberto

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Foto: Nilson Figueiredo

Área instalada dentro da unidade ajuda na conservação de nascentes que escoam no rio Anhanduí 

É a alguns metros da saída para o município de Sidrolândia, no extremo sul de Campo Grande-MS, que os muros da escola municipal Elízio Ramirez Vieira contrastam com um grande monte ao fundo da paisagem, formado pelo Aterro Sanitário. Dentro desses muros há uma área de 600 metros quadrados, de mata fechada, responsável pela manutenção de seis nascentes de água, vista como um verdadeiro tesouro para os quase mil alunos.

A escola Elízio foi fundada no início dos anos 2000, está próxima das margens do rio Anhanduí, que corta Campo Grande, de norte a sul. Essa unidade de ensino fica no Jardim Pênfigo e recebe crianças de bairros estigmatizados, que vivem à sombra do que antes era chamado de “Lixão”, mas modernizou as políticas de resíduos sólidos e é referência no Estado. Além do preconceito com quem trabalha com reciclagem, a região também sofreu com a onda de criminalidade, em que brigas de gangues chegaram a ser comuns anos atrás, que associavam à proximidade da Penitenciária Estadual Masculina de Segurança Máxima da Gameleira.

Nesse contexto sensível, os professores viram nascer, junto com as águas cristalinas que brotavam ao lado da quadra de esportes, a chance de apresentar uma realidade diferente aos pequenos. Seis nascentes de águas resistiram a um processo de assoreamento, uma mata fechada se formou e vem proporcionando um verdadeiro laboratório de pesquisa para todos, como explica a bióloga Franciela Leduino, que trabalha no Elízio há 10 anos.

“Antes, era uma área assoreada, mas conseguimos ver a água brotar bem límpida. Até peixes eram avistados, pois a vegetação estava baixa. Com a ajuda dos pássaros, as espécies de plantas foram aumentando, surgindo a mata e uma manta de musgo, que filtra as impurezas e ajuda na manutenção das nascentes. É um laboratório ao ar livre, onde você pode sentir a natureza profundamente e colabora na educação das crianças, que vão levar tudo que aprenderam para casa”, compartilha Franciela.

Talita da Silva Siqueira é coordenadora no Elízio, trabalha com educação na região há pelo menos 15 anos, e enxerga a área como uma oportunidade de apresentar técnicas de ensino diferentes e marcantes na vida das crianças. “O contexto da sala de aula é limitado, então isso aqui é uma extensão, uma aula prática. Acaba que quem dá aula para os pais são as crianças, que saem dessa experiência com embasamento sobre conservação da natureza e uso consciente da água”, acredita a coordenadora.

Para entrar na pequena reserva, é preciso calçar galochas e ter equilíbrio, pois a mata é fechada, o solo é instável e qualquer movimento brusco pode degradar as nascentes de água. Foi nessa aventura que o diretor Luciano Alves de Brito acabou afundando um dos pés no solo úmido, mas bem-humorado que é, valoriza as riquezas naturais que estão à disposição dos alunos e professores.

“Essa aqui é a menina dos olhos da escola, fazemos questão de ter muito cuidado com as nascentes e a vegetação nativa. Acho até que a gente peca um pouco, poderíamos cuidar mais, deveríamos debruçar mais o nosso fazer pedagógico aqui dentro da mata, mas temos receio por causa dos animais e insetos avistados. Tudo que fazemos aqui ainda é pouco, precisamos cuidar mais”, concluiu o diretor, com uma das pernas cheia de lama e gramas.

Pertencente ao Grupo de Ciências, João Lucas Macedo, de 12 anos e aluno do 7º ano, é o mais empolgado com as descobertas científicas vindas da mata. Tanto que agora, está focado em encontrar “casquinhas” de cigarras presas nas árvores da reserva, que eles estão juntando e catalogando, junto com todos os achados que guardam no laboratório.

“É muito legal conhecer várias coisas sobre meio ambiente, que envolvem biologia, química e física. Aqui também aprendemos sobre o meio ambiente mesmo, porque devemos cuidar dele, principalmente das nascentes de água, pois os recursos hídricos estão acabando. Temos que ter consciência e ajudar a preservar para as próximas gerações”, diz João, impactado.

Filha da professora Franciela, a aluna Helena Leduino, de 11 anos, está no 5º ano, e fica extremamente preocupada com os lixos jogados dentro dos muros da escola, que podem degradar a mata. “Eu entendi a importância de cuidar da natureza, da água, para que dure por toda a eternidade”, completou.

É esse impacto, profundo e eterno, que a bióloga Débora Borges, de 31 anos, quer que seus alunos tenham, pois é isso que fará a diferença no futuro. “Esse espaço é a oportunidade que o aluno tem de ver o que está aprendendo na sala de aula. Aqui, ele vê insetos com os próprios olhos, vêm as briófitas e pteridófitos que tanto falamos. Pego e apresento o que é uma gimnosperma e angiospermas, desenvolvem desenhos científicos. Acredito que essas atividades, ao sair da sala de aula, é uma experiência que o aluno nunca mais vai esquecer, pois aulas assim me impactaram na infância e lembro até hoje”, defende a professora.

Importância da educação ambiental para a conservação

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Foto: Nilson Figueiredo

Campo Grande consome a água retirada de basicamente duas fontes: do córrego Guariroba, que fica a 35 km da Capital, em uma área majoritariamente rural e de proteção ambiental, e também do córrego Lageado. No perímetro urbano são cerca de 35 rios e córregos, que ajudam na manutenção da vida, sendo abrigo e manutenção da biodiversidade tão valorizada do município. Apresentar a importância da conservação dos recursos é essencial para a continuidade dessa vida, é o que explica o engenheiro ambiental e gerente de Meio Ambiente da Águas Guariroba, Fernando Garayo.

“É tendo contato com o meio ambiente ainda na infância que teremos um adulto com práticas sustentáveis. Quando falamos desses alunos, que estão próximos ao Aterro Sanitário, conseguimos fazer um paralelo, pois eles conseguem visualizar a importância da conservação ambiental na prática. Outro ponto importante é que, quando falamos em meio ambiente, também estamos falando de saúde, de saneamento básico”, destaca Fernando.

Ele defende que, quando um indivíduo entende o que é poluente ou não, as chances de valorizar e priorizar o saneamento básico são maiores, o que vai auxiliar diretamente em seu próprio desenvolvimento. “Quero complementar que falar sobre meio ambiente é começar a elucidar melhor algumas práticas que normalmente afetam a saúde. A partir do momento que a gente começa a entender melhor sobre a água que a gente utiliza em casa, entendemos sobre tratamento de esgoto. A gente já começa também a mudar aquele ambiente”.

Atualmente, a concessionária Águas Guariroba realiza plantios de mudas, de restauração, de matas ciliares, que atuam na qualidade da água.

Por – Kamila Alcântara

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