Sem paz e insegurança jurídica: entidades contestam derrubada de marco temporal

marco temporal
Lohana Chaves/Funai

De acordo com a Funai, MS tem 26 territórios indígenas em processo de demarcação  

O STF (Supremo Tribunal Federal) julgou inconstitucional a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas, alcançando 9 votos contra 2. A medida contraria a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), que pontua um risco ao Brasil e, sobretudo, para aqueles que residem no campo. 

De acordo com dados da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), a medida afeta diretamente 26 territórios indígenas em processo de demarcação, em Mato Grosso do Sul.

O deputado federal Marcos Pollon (PL-MS), membro da FPA, se posicionou contra a medida.

“O que se busca é a segurança jurídica, inclusive para os povos originários e a possibilidade de produzirem riqueza. A pauta que vota contra o marco temporal quer inviabilizar a produção de maior parte do Brasil, frear o desenvolvimento do país e manter os povos originários como silvícolas, como se estivessem presos em 1500. A legislação do marco, além de dar segurança jurídica, possibilita, em lei, que todos os povos originários que detêm sua propriedade, possam explorar economicamente a mesma, gerando riqueza e desenvolvendo, protegendo a cultura, mas permitindo que as pessoas possam se desenvolver para um futuro melhor”, esclarece o deputado. 

Diante da decisão, a Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul) pontuou a preocupação, por meio de nota. “É uma injustiça com milhares de produtores rurais, que possuem justo título de propriedade há séculos e, mesmo assim, nenhuma garantia da posse do seu imóvel”. Com isso, o órgão avalia que o fim do marco temporal “trará consequências drásticas, não só para a atividade agropecuária de Mato Grosso do Sul e todo o Brasil, mas para milhares de famílias do campo”, esclarece.

O presidente da Famasul, Marcelo Bertoni, disse ao jornal O Estado que respeita a decisão, mas não concorda. “Nós não concordamos, mas respeitamos a decisão do STF e agora esperamos que o Senado aprove a PL 2903, trazendo realmente segurança jurídica a nossos produtores. Não podemos resolver uma injustiça criando outra. Precisamos de paz no campo”, argumentou o presidente.  

A coordenadora da Frente Parlamentar e deputada federal (PP-MS), Tereza Cristina, afirmou que o marco temporal para as terras indígenas traz grande insegurança jurídica. “Nós continuaremos a legislar no Congresso sobre o tema. Na próxima semana, vamos votar o projeto do marco temporal na CCJ do Senado Federal, o mesmo já aprovado na Comissão de Agricultura. E há, também, uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que deverá ser apresentada para definir, inclusive, a indenização prévia dos que ocupam, de boa-fé, com escrituras públicas lavradas há décadas ou mesmo há mais de século, áreas que possam estar ou venham a estar em litígio”, esclareceu. 

 

O projeto

O PL 2.903/2023 foi aprovado na CRA (Comissão de Agricultura e Reforma Agrária) no mês passado e agora espera votação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Em seguida, caberá ao Plenário votar a decisão final. A proposta, que ficou mais conhecida como PL 490/2007, foi aprovada pela Câmara dos Deputados no final de maio, após tramitar por mais de 15 anos. 

Na CRA, o projeto recebeu voto favorável da relatora, senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS). Thronicke afirmou estar “convicta de que a data da promulgação da Constituição Federal, de 5 de outubro de 1988, representa parâmetro apropriado de marco temporal para a verificação da existência da ocupação da terra pela comunidade indígena”.

De acordo com o texto, para que uma área seja considerada “terra indígena tradicionalmente ocupada”, será preciso comprovar que, na data de promulgação da Constituição Federal, ela vinha sendo habitada pela comunidade indígena em caráter permanente e utilizada para atividades produtivas. Também será preciso demonstrar queessas terras eram necessárias para a reprodução física e cultural dos indígenas e para a preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem- -estar.

Na audiência pública que precedeu a votação da proposta na CRA, lideranças indígenas condenaram o projeto, afirmando que os riscos vão além da demarcação de terras. Representantes do governo também se posicionaram contra a aprovação, sustentando que o texto avançou sem consulta aos povos indígenas e pode causar mais insegurança jurídica

 

Outro lado

Para a presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Joenia Wapichana, prevaleceram os direitos constitucionais dos povos originários.

“Hoje, o dia é de comemorar a vitória dos povos indígenas contra o marco temporal. Nós temos muitos desafios pela frente, como outros pontos que foram incluídos, mas é uma luta a cada dia. Uma vitória a cada dia. Nós acreditamos na Justiça, na Justiça do Supremo Tribunal Federal para dar segurança jurídica aos direitos constitucionais dos povos indígenas, cumprir o seu dever pela constitucionalidade e dar esperança a esse povo, que tem sofrido há muitos anos, com intimidações e pressões. Hoje, se enterra de vez o marco temporal”, celebrou a presidenta da Funai.

 

Por Julisandy Ferreira– Jornal O Estado de Mato Grosso do Sul

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