Nova lei endurece punição por crimes sexuais contra pessoas vulneráveis

Foto: Marcello Casal Jr./Arquivo/Agência Brasil
Foto: Marcello Casal Jr./Arquivo/Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou uma lei que promove a mais ampla mudança dos últimos anos na legislação penal voltada a crimes contra a dignidade sexual. A norma altera o Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei de Execução Penal, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e o EPD (Estatuto da Pessoa com Deficiência), ampliando penas, reforçando medidas protetivas, criando mecanismos de investigação mais robustos, como banco de DNA, e estabelecendo atendimento especializado às vítimas.

A medida praticamente dobra a pena prevista para os principais crimes sexuais contra vulneráveis. O estupro de vulnerável, por exemplo, passa a ter pena de 10 a 40 anos, a depender das circunstâncias, além de multa. O artigo 217-A do CP, que trata desse crime, passa a prever reclusão de 10 a 18 anos, podendo chegar a 24 anos em circunstâncias qualificadas e até 40 anos quando houver resultado morte.

O artigo 218 também foi alterado. O artigo abrange condutas de aliciamento, exploração ou corrupção de menores. A pena passa a ser de 6 a 14 anos, além de multa. O artigo 218-A trata de situações em que o autor pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso explorando a vulnerabilidade da vítima em contexto de exploração sexual previamente existente, com punição fixada entre 5 e 12 anos de reclusão, além de multa.

Além disso, todos os investigados ou condenados por crimes sexuais deverão ter perfil genético colhido obrigatoriamente para alimentação do banco nacional de DNA. A medida permite formar ou ampliar o banco de perfis genéticos, instrumento utilizado na investigação criminal.

O texto também determina monitoração eletrônica obrigatória para condenados que deixarem o presídio em saídas temporárias, estabelece restrições de convivência e aproximação, amplia medidas protetivas e cria obrigações específicas para juízes, como a análise de risco imediato e a possibilidade de suspensão do porte de arma, afastamento do lar e proibição de contato com vítimas e testemunhas.

Para a presidente da Comissão de Defesa da Criança e do Adolescente da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil), Maria Isabela Saldanha, a lei traz um avanço histórico ao obrigar o Judiciário a aplicar medidas protetivas já previstas, mas muitas vezes negligenciadas.

Ela explica que ainda existe resistência cultural na Justiça em reconhecer a criança como sujeito de direitos. “Há um disparate em relação à lei de proteção à mulher e à lei de proteção à criança. Isso é cultural. Nosso Judiciário não consegue ver a criança como um ser em desenvolvimento, ele vê a criança como um mini-adulto e não considera os reflexos que um crime sexual causa na formação dessa criança”, afirma.

A Dra. pontua que o avanço legislativo também representa um choque necessário na cultura jurídica brasileira. “Essa lei fortalece uma nova cultura no Judiciário. A proteção à criança não pode ser relativizada. O Brasil é o segundo país do mundo em violência sexual contra crianças. Só perdemos para a Tailândia. É urgente virar essa chave”, afirma.

Segundo a Dra. Maria Isabela, essa visão distorcida também é consequência direta do machismo estrutural. “O machismo contra a mulher é enorme, mas contra a criança é ainda mais forte. Parece que fazer a criança sofrer faz parte da vida, é arcaico. E por isso precisamos de leis que obriguem o Judiciário a proteger”, diz.

A advogada explica que medidas protetivas para crianças já existiam na Lei Henry Borel, que trata da violência doméstica contra menores. O problema, segundo ela, era a falta de aplicação.

“A Henry Borel já previa tudo isso, mas o Judiciário não levava a sério. Agora, a nova lei reforça expressamente essas medidas, ampliando para todos os crimes sexuais, não apenas os domésticos”, detalha.

Casos reais mostram falhas na proteção

A presidente da comissão cita decisões recentes em que medidas protetivas foram flexibilizadas mesmo diante de indícios claros de risco. Ela relembra um caso envolvendo uma menina de nove anos vítima de abuso intrafamiliar.

“A mãe permitia que o padrasto abusasse da criança. O pai pediu medida protetiva e conseguiu. Mas depois a mãe foi chorar para o juiz, dizendo que estava sofrendo. O juiz quase revogou a protetiva. Ele levou mais em conta o sofrimento da mãe do que o abuso do padrasto”, relata.

Para a presidente da Comissão de Defesa da Criança e do Adolescente da OAB/MS, esse tipo de decisão deve diminuir com a nova legislação. “Agora, com a nova lei, a proibição de aproximação fica mais ampla. E o juiz não poderá flexibilizar em nome da presunção de inocência. É isso que a Constituição manda no artigo 227: criança tem prioridade absoluta”, afirma.

 

Por Inez Nazira

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