Os casos de racismo no esporte e, em grande maioria, no futebol têm sido uma realidade preocupante e persistente em todo o mundo, e, em especial, na América do Sul e Europa, conforme aponta o Relatório Anual da Discriminação no Futebol, do Observatório da Discriminação Racial no Futebol. No entanto, as entidades esportivas responsáveis por regular e promover o esporte, como a CONMEBOL e a FIFA, têm sido criticadas por sua omissão e falta de ação eficaz para combater esse problema, que teve, nos últimos anos, um aumento significativo nos números de atos, atos e ocorrências.
Já a CBF, por sua vez, tem se movimento no enfrentamento e combate ao racismo no futebol brasileiro. O presidente da confederação, Ednaldo Rodrigues, vale ressaltar, primeira pessoa negra a assumir a presidência da instituição, tem buscado, por meio de ações como a integração com os Ministérios do Esporte, dos Direitos Humanos e Cidadania e da Igualdade Racial, e campanhas de sensibilização e educação, como “Com o Racismo não tem Jogo”. A CBF tem se destacado e lidera uma campanha mundial antirracista no futebol, inclusive já endossada pela FIFA. Campanha essa vitoriosa no ano passado (2024) do Prêmio FIFA The Best.
Na prática, ressaltamos um exemplo emblemático, o caso recente do jovem jogador brasileiro Luighi, da Sociedade Esportiva Palmeiras – sub-20, que foi alvo de ofensas racistas por um torcedor do Cerro Porteño, do Paraguai, durante jogo entre os dois times, no dia 6 de março de 2025, no Paraguai, pela Taça CONMEBOL Libertadores sub-20.
Em resposta a esse ato de repercussão nacional e internacional, a CONMEBOL, seguindo a sua linha de punição mínima para casos de racismo, determinou uma multa de 50 mil dólares e portões fechados para o já então eliminado, sem chances de classificação, Club Cerro Porteño. E ainda, o presidente da CONMEBOL, Alejandro Domíngues, deu uma declaração de cunho racista, após especulações de que as equipes brasileiras poderiam deixar de disputar a Taça Libertadores da América: “Isso é inimaginável, como o Tarzan sem a Chita”, e riu ironicamente.
Tal atitude do presidente da entidade tem sido vista pelo Movimento Negro brasileiro como um ato grave de racismo recreativo e exige sanções severas proporcionais à gravidade do fato. Essa fala é ainda mais grave se considerado que Alejandro Domíngues é vice-presidente da FIFA para a América do Sul e reincidente em declarações racistas, o que compromete a credibilidade da CONMEBOL, que, por sua vez, é o órgão responsável por promover o futebol na América do Sul, onde a diversidade racial é uma característica marcante.
Desse modo, a FIFA tem sido criticada por sua falta de ação eficaz para combater o racismo no futebol. Só nesses três meses do ano de 2025, o jogador brasileiro Vini Jr., já foi hostilizado, ao menos, duas vezes com notoriedade midiática: na primeira, recebeu “cânticos” de torcedores da equipe rival “olé, olé, Vinícius chipanzé”; e, na segunda vez, um torcedor fez gesto racista, imitando um macaco.
A omissão das entidades esportivas em relação ao racismo no futebol é ainda mais preocupante quando se considera o impacto que isso tem sobre a vida dos jogadores, nas comunidades afetadas e em toda sociedade de modo geral, pois o racismo no futebol pode levar a consequências graves, como a perda de autoestima, a ansiedade, a depressão, e o “desaparecimento” do atleta, mesmos sintomas identificados na pesquisa de Laurentino Gomes, em seu livro sobre a “Escravidão”.
Segundo relatos do pesquisador, esses sintomas são os mesmos apresentados pelos negros cativos quando capturados e vendidos, que ao passar pelo “Portal do Não Retorno”, muitos eram acometidos do chamado “Banzo”, termo originário da língua Quimbundo, falada em Angola, e que serve para expressar sentimentos de “dor profunda, sofrimento da alma, saudade, perda do brilho nos olhos, falta de apetite e apatia total”. Além disso, o racismo no futebol também pode perpetuar estereótipos e preconceitos racistas, cunhados pela colonialidade, na sociedade em geral.
A omissão das entidades esportivas em relação ao racismo no futebol não é apenas um problema moral, mas também um problema legal, pois o racismo é crime. A Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, adotada pela ONU em 1965, e reafirmada na 3ª Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlatas, realizada no ano de 2001, em Durban – África do Sul, estabeleceu que os Estados partes devem tomar medidas para eliminar a discriminação racial em todos os campos, incluindo o esporte.
Diante disso, é fundamental que as entidades esportivas, como a CONMEBOL, LaLiga, UEFA e a FIFA, tomem medidas eficazes para combater o racismo no futebol. Isso inclui a implementação de políticas e procedimentos eficazes para lidar com casos de racismo, a promoção de campanhas de conscientização e educação, a aplicação de sanções severas contra os responsáveis pelos atos e o aprimoramento de protocolo de intervenção para prevenir e enfrentar os casos de racismo no futebol. Desse modo, também é fundamental que os governos e as organizações da sociedade civil trabalhem juntos para pressionar as entidades esportivas a tomar medidas eficazes para combater o racismo no futebol. Isso inclui a promoção de leis e políticas públicas que protejam as diversidades, os direitos dos atletas e das comunidades afetadas pelo racismo no futebol.
Nesse ponto é crucial o trabalho conjunto no enfrentamento e combate ao racismo no futebol, para que seja possível um esporte mais justo, inclusivo, democrático e livre do “Banzo” para todos os sujeitos envolvidos.
Leandro de Souza – Mestre em Educação – PPGEdu/UFGD (em doutoramento) e Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa GEPETIC/UFGD. E-mail: leandro.silva025@academico.ufgd.edu.br.
Confira as redes sociais do O Estado Online no Facebook e Instagram
Leia mais
Afinal, de onde vem a felicidade? Pensando em companhia de Agostinho