Trupe pernambucana leva espetáculo e oficinas de circo à capital sul-mato-grossense

Circo Science – do Mangue ao Picadeiro, da Trupe Circus - Foto:  Reitter Costa/Divulgação
Circo Science – do Mangue ao Picadeiro, da Trupe Circus - Foto: Reitter Costa/Divulgação

Circo Science apresenta sessões gratuitas e promove intercâmbio cultural em Campo Grande nos dias 17 e 18 de junho

“Da lama ao caos, do caos à lama. Um homem roubado nunca se engana.” A frase, eternizada por Chico Science & Nação Zumbi, resume com força poética a tensão entre a miséria social e a resistência cultural, essência no espetáculo Circo Science, do Mangue ao Picadeiro. Em cena, essa ideia se traduz em malabares, acrobacias, contorcionismo e coreografias que ecoam as batidas da periferia do Recife, misturando circo contemporâneo, dança e manifesto social. O espetáculo leva ao palco não apenas uma homenagem à trajetória de Chico Science, mas também uma convocação à reflexão sobre desigualdades, identidade e a potência criativa que emerge das margens.

Com apresentações gratuitas que começaram ontem (16) a 18 de junho no anfiteatro da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), o projeto propõe uma travessia artística do mangue ao cerrado, conectando públicos distintos por meio da estética manguebeat. A escolha de Chico Science como inspiração não é apenas musical: é política, social e profundamente simbólica. Assim como o mangue se alimenta da lama para gerar vida, o espetáculo se alimenta das narrativas periféricas para gerar arte e transformar o picadeiro em palco de resistência e beleza. A obra reafirma a ideia de que, mesmo em contextos de caos, a cultura é caminho de reconstrução e pertencimento.

A programação inclui ainda oficinas formativas no Circo do Mato, ampliando o alcance do projeto para além da plateia. Com incentivo da Lei Rouanet e apoio do Ministério da Cultura e da Transpetro, a circulação nacional da Trupe Circus chega ao Centro-Oeste com a proposta de diálogo e troca cultural. O público sul-mato-grossense será convidado a sentir o ritmo do mangue, que segue vivo e atual, agora também sob o céu do cerrado. A entrada é gratuita, com distribuição de ingressos uma hora antes de cada sessão.

Arte para todos os lugares

A montagem do espetáculo é resultado de um processo criativo coletivo com jovens artistas formados na Escola Pernambucana de Circo. No palco, Ítalo Feitosa, Maria Karolyna, Gabriel Marques, Bruno Luna, João Fernando e João Vítor encarnam a alma mangue, com coreografias, figurinos e trilha remixada que reverenciam a estética e sonoridade de Chico Science e da Nação Zumbi.

“Essa circulação é um marco para nós. Estamos passando por dois grandes territórios do Brasil, levando o nosso som, a nossa arte e nossa história. O público de Mato Grosso do Sul pode esperar um espetáculo provocador, cheio de energia, que mistura circo, música e identidade. Vai ser bonito ver as semelhanças entre a cultura de Recife e as expressões locais do Centro-Oeste”, afirma o diretor do espetáculo, Ítalo Feitosa.

Para a reportagem, a coordenadora executiva da Escola Pernambucana de Circo, Fátima Pontes, explica que a equipe que circula com o espetáculo é composta por dez pessoas, seis artistas no elenco e o restante entre equipe técnica e produção. Segundo ela, o espetáculo estreou em novembro de 2023, em comemoração aos 30 anos do álbum Da Lama ao Caos, de Chico Science.

“Essa montagem é uma homenagem ao legado de Chico e a tudo que o movimento Manguebeat representa. Foi uma revolução cultural tão forte quanto a Tropicália nos anos 1970, não só em Recife, mas em todo o Brasil. É uma fusão entre nossas tradições, como o maracatu, coco e ciranda, com referências urbanas como o rock, o rap e o hip hop”, ressalta.

Fátima também destaca que, nesta nova montagem, a Trupe atualiza o espírito do Manguebeat com elementos das periferias atuais. Para ela, levar essa proposta ao Centro-Oeste é especialmente significativo.

“A gente traz o passinho, o brega funk, o vogue, tudo isso que pulsa nas juventudes hoje, e que provavelmente Chico também estaria fazendo se estivesse vivo.Em regiões como o Sudeste, onde a Nação Zumbi circulou bastante, o movimento já é mais conhecido. Mas no Centro-Oeste, talvez nem tanto. Por isso, é muito importante estarmos aqui em Campo Grande, não só apresentando um espetáculo de circo de qualidade, mas cumprindo nossa missão institucional de compartilhar a diversidade cultural brasileira, valorizando juventudes, periferias e culturas tradicionais”, afirma a coordenadora.

Recepção calorosa

Segundo Fátima Pontes, Em Campo Grande, a recepção tem sido calorosa, e a cidade já conquistou o grupo, tanto pela cultura quanto pela rede de apoio. Além da UEMS, a Trupe conta com o apoio direto do Circo do Mato, especialmente dos artistas Laila e Mau. Fátima também pontua que um dos objetivos da circulação é justamente fomentar parcerias locais, gerar intercâmbio artístico e movimentar a economia das cidades por onde passam.

“Estamos encantados com a cidade, com as pessoas, com a história do lugar. Nunca tínhamos vindo ao Centro-Oeste, e essa troca está sendo muito rica. Queremos que as pessoas conheçam nosso trabalho, feito por jovens das periferias de Recife, dentro de uma escola com quase 30 anos de história, reconhecida nacional e internacionalmente pela pedagogia do circo social”, completa.

Para a artista circense Maria Karolyna, o público de Campo Grande pode esperar uma experiência intensa, que ultrapassa o entretenimento. “O público pode esperar uma experiência encantadora com números circenses de malabarismo, contorcionismo, acrobacias aéreas e de solo, coreografias, e os sons que saíram da periferia de Recife proporcionando ao público uma mistura de encantamento e reflexão. Acredito que o espetáculo vai além do entretenimento: ele reafirma nossas origens, potencializa as periferias do Recife, dá voz e vez ao protagonismo das mulheres, conecta ciência, cultura popular e arte de um jeito vivo e cheio de identidade”.

Importância

O público de Campo Grande pode esperar muito mais do que um espetáculo de circo: será uma vivência profunda e transformadora. Ainda conforme Maria Karolyna, o espetáculo terá diversos números de malabarismo, contorcionismo, acrobacias aéreas e de solo, além de coreografias que se entrelaçam aos sons que ecoam das periferias de Recife

“É uma mistura de encantamento e reflexão. Mais do que entreter, o espetáculo reafirma nossas raízes, valoriza as vozes periféricas, exalta o protagonismo feminino e cria conexões entre ciência, cultura popular e arte, tudo com muita identidade e intensidade”, afirma a artista.

Fátima finaliza explicando que Circo Science vai além do espetáculo: é um manifesto cultural e social. Com estética própria e raízes na diversidade, a montagem homenageia Chico Science e o movimento Manguebeat, denunciando desigualdades, preconceitos e a devastação ambiental. “Temos os pés na lama do mangue e a cabeça ligada ao mundo”, afirma, destacando que o trabalho reafirma o papel da juventude periférica, negra e criativa como força de transformação.

Além do espetáculo, a Trupe Circus promove oficinas e intercâmbios culturais com artistas locais, como o Circo do Mato. Em Campo Grande, haverá vivências formativas e debates sobre a Lei Rouanet. “Queremos trocar saberes e aprender com a cultura local”, diz Ítalo Feitosa. Com 29 anos de atuação, a Escola Pernambucana de Circo reafirma o circo como linguagem crítica e transformadora, em um espetáculo com dramaturgia de Fátima Pontes e estética inspirada no Manguebeat.

Serviço: Na terça-feira (17), às 9h da manhã, a Trupe Circus realiza uma sessão especial no anfiteatro da UEMS (Av. Dom Antônio Barbosa, 4155 – Santo Amaro), voltada para estudantes de escolas públicas, ONGs e projetos sociais. A entrada é gratuita e haverá intérprete de Libras.

Já na quarta-feira (18), o grupo promove oficinas formativas no espaço Circo do Mato (Rua 263, Bairro Amambaí). Pela manhã, das 9h às 12h, será realizada uma oficina sobre elaboração de projetos via Lei Rouanet. À tarde, das 14h às 17h, o público poderá participar de uma vivência circense com os artistas da Escola Pernambucana de Circo. As atividades são gratuitas, com vagas limitadas. As reservas podem ser feitas pelo WhatsApp: (67) 99912-1420.

 

Por Amanda Ferreira

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