Tradicional, o evento é um ponto de encontro e manifestação cultural há mais de duas décadas
O “Sarau do Zé Geral” celebra hoje (31), em comemoração especial, sua milésima edição. O evento, que completa mil encontros à base de muita resistência, enfrentou, ao longo de sua história, inúmeras interrupções que ocorreram por diversos motivos e marcam suas memórias. Diante dos impasses, de portas abertas para toda a comunidade, os encontros recomeçavam em outros endereços. Desde então, o sarau se hospedou em um total de 14 residências, ao longo desses anos. Em março de 2010, encontrou, na Vila Piratininga, um espaço onde até hoje são realizadas as apresentações, agora aos sábados.
O multiartista Zé Geral é mineiro de nascença e em celebração aos seus feitos, possui o título outorgado de Cidadão de Campo Grande, além de ser o idealizador desse marco cultural na Capital. Músicos e artistas de renome que frequentam e frequentaram as edições, também homenageiam, em entrevista ao jornal O Estado, o espaço onde formaram amizades e fortaleceram a construção de suas carreiras. O evento é realizado hoje (31), na rua Pasteur, 937, Vila Piratininga. Para celebrar o sarau, a entrada é gratuita e tem início previsto para as 17 horas.
Zé Geral é referência quando se trata em fomentar a arte independente local. O compositor e músico, Geraldo Espíndola, relembra o início da amizade e as memórias afetuosas que possui do sarau. “Eu comecei a ir ao sarau por amizade com o Zé, isso aconteceu quando ele estava construindo ainda o sarau, na rua 13 de Maio. Foi muito bacana toda aquela fase, isso há quase 30 anos. E até hoje nós somos amigos, nos falamos. Como estou com a agenda lotada, não vou poder estar com vocês aí, na quinta-feira, mas meu coração vai estar pensando em vocês. Eu toquei muito lá, encontrava os músicos pra gente tocar e se divertir. Além disso, vi vários talentos e banda se formarem, no evento. Por isso, eu acho que o sarau é um ponto de cultura muito importante. Não importa onde o Zé vai, ele leva o carinho dele, leva o bom atendimento, bom gosto para música e isso é bacana demais”, destaca Geraldo.
Sua amizade com artistas como Miska, Margarida Neder e diversos outros artistas também fortaleceram sua relação com a cidade e a formação do sarau. “Eu conheço o Zé desde que chegou em Campo Grande e acompanhei o sarau desde o começo. É muito legal a resiliência dele, em manter esse espaço cultural que dá oportunidade a tantos jovens artistas que estão começando e, ao mesmo tempo, consegue reunir tantos nomes importantes da cultura sul- -mato-grossense”, relembra Miska.
Para Celito Espíndola, músico regional, o sarau é um evento de suma importância para os artistas da Capital e merece, além de ser homenageado, ser reconhecido. “O Zé sempre foi carismático, recebendo a gente com muito carinho, muito respeito, e o Sarau do Zé Geral é um espaço cultural importantíssimo para a cidade. São tantos e tantos anos que ele vem nessa batalha, de ter um espaço cultural na cidade de Campo Grande. Uma cidade que carece e sempre careceu de espaços onde a nossa produção cultural possa ser mostrada, possa ser levada ao público. E assim é a iniciativa de uma pessoa, em levar, por tanto tempo, um espaço como o Sarau do Zé Geral, merece todo o respeito. Além disso, merecia apoio institucional, né? Acho que seria muito importante”, pontua.
O Sarau
“Quando eu convidava as pessoas pelas ruas, antigamente, muitos questionavam: ‘Sarau? O que é isso?’ Hoje, eventos semelhantes em outras cidades são chamados de sarau. Fico feliz em afirmar que minha abordagem é única e autêntica. A maneira como proporciono música, poesia, encontro e acontecimento é exclusiva. Ao longo dessa trajetória enriquecedora, com a participação de cerca de 2.500 músicos e artistas de diversas áreas, muitos iniciantes também deixaram sua marca e contribuição”, compartilha, com orgulho, Zé Geral.
O multiartista, José Geraldo Ferreira, chegou a Campo Grande em 1989 e imediatamente se interessou pela movimentação artística local. Amizades com músicos da cidade foram laços formados espontaneamente, além de ser um dos alicerces para o músico para se estabelecer na Capital. “A primeira artista que tive contato e que me dei muito bem, foi a Miska. Foi com a parceria dela que consegui vender todas as telas que pintava e tinha na bagagem. Margarida Neder, tia do Paulinho Simões, também foi muito afetuosa comigo. Tivemos uma amizade muito boa, que corroborou para que eu me apresentasse na Penha, um antigo movimento cultural, por um grande período. Lá, conheci muitos artistas.”
O encontro com o músico Geraldo Espíndola foi uma grata surpresa para Zé Geral, já que ainda não tinha encontrado músicos cujo trabalho gostasse com tanto apreço e uma amizade que o levasse a realizar diversas colaborações musicais. “Eu o conheci em um show, na Praça do Rádio, o meu grande e querido amigo Geraldo Espíndola. Foi uma grande surpresa, pois eu não tinha ideia o quão rica era a música daqui. O Geraldo foi o primeiro a frequentar minha casa. Com ele lá, brotaram muitas ideias, músicas e shows, inclusive, pelas noites da Capital”, revela Zé Geral.
A ideia do “Sarau do Zé Geral” nasceu em 1997, após uma amiga pedir o quintal de Zé emprestado para uma festa. Zé Geral decidiu não cobrar aluguel, mas solicitou 10% das vendas para cobrir os gastos com comida e bebida. Os eventos, desde então, foram crescendo em popularidade, atraindo cada vez mais público, a cada edição, conforme afirma o idealizador sobre as edições e programação. “As edições possuem caráter espontâneo, então nenhuma delas teve nada programado ou planejado. Como sempre, não sei o que está por vir e é exatamente isto que diferencia meu sarau de todos os outros”, destaca Zé.
Devido à sua proposta singular, o sarau atraiu músicos e artistas notáveis, incluindo nomes como Geraldo Espíndola, Paulo Simões, Paulo Gê, Miska, Caxingue, Lúcio Val, Toniquinho, Bibi do Cavaco e Jorapimo, entre outros. Mesmo diante de interrupções ocasionais, decorrentes das adversidades enfrentadas pelo cenário artístico na cidade e no Estado, o espírito acolhedor e festivo do sarau permaneceu intacto, abrindo as portas para artistas e membros da comunidade em busca de expressão cultural, juntamente com pratos deliciosos servidos aos amigos.
“Acho que o sarau é o espaço cultural que mais tem resistido ao tempo e a todas as dificuldades. E isso é muito importante para a nossa cultura”, afirma a multiartista e amiga de longa data, Miska Thomé. Em seguida, a artista ainda revela um fato especial, dentre as suas memórias, no sarau. “Essa foto foi de quando o sarau era na AABB e foi o dia em que conhecemos o Júnior, que toca comigo há 18 anos. Ele tocava baixo com o Zé e tudo continua firme até hoje, há 18 anos tocando”, relembra Miska.
Por – Ana Cavalcante
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