No último especial das escolas de samba, o jornal O Estado traz para as páginas um pouco do vermelho, branco, prateado e dourado do Grêmio Recreativo Escola de Samba Igrejinha. Detentora de 24 títulos na estante, a escola este ano homenageia a comunidade quilombola Furnas de Dionísio, com o enredo ‘Furnas de Dionisio – Liberdade e Conquista de um Quilombo’, sendo a terceira escola a desfilar na segunda-feira (3).
Fundada em 12 de maio de 1975, a Igrejinha faz parte da história da cidade. A escola surge por meio de cinco amigos ferroviários, José Carlos Guedes, Walfrido de Almeida, Edgard de Almeida, Fábio Figueiredo e Sebastião Rogado, em época que o trem ainda passava pela Cidade Morena.
A igreja do nome se refere a proximidade da escola com a Igreja São Francisco de Assis, e pela devoção dos fundadores para com o santo. Atualmente, a escola também está fortemente ligada a Igreja São Benedito, erguida na Comunidade Quilombola Tia Eva, que já foi homenageada pela escola, em 2015, sob a presidência de Mariza Ocampos.
Força e heroísmo
Em 2025, o enredo volta a homenagear uma comunidade quilombola de Mato Grosso do Sul: Furnas do Dionísio. Com tradições descendentes da velha Angola, Guiné e Benin, a comunidade foi fundada no final do século XIX, por volta de 1890, por Dionísio Antônio Vieira, sua esposa Joana Luiza de Jesus e seus filhos, que vieram para Mato Grosso do Sul de Minas Gerais, em carros de boi, em buscas de terras férteis para plantações.
De pau-a-pique, sapê, argila e esterco, ele e sua família construíram as primeiras casas de Furnas. Todos os moradores da comunidade são descendentes diretos de Dionísio, e Furnas é uma das mais antigas e populosas comunidades do Estado.
Outro ponto de destaque, que será trazido pela escola, é o turismo ligado a gastronomia da região, com a cultura da rapadura e da farinha ainda praticada. A devoção a Santo Antônio e Nossa Senhora Aparecida também marcam a comunidade.
Em publicação oficial nas redes sociais, a escola quer trazer para a avenida toda a força e heroísmo da comunidade.
“A ideia é levar o nome do quilombo para mais longe, criando uma veia que é o próprio coração de Furnas: história, cultura e tradição desse povo. Que rufem os tambores, a luta e o nome de Dionísio Antônio Vieira serão lembrados no axé das baianas, na pulsação da bateria, e na voz de todos os componentes. Hoje, no quilombo do samba que é a Igrejinha, celebramos resistência e liberdade”.
Ainda como presidente da escola, Mariza contou que os preparativos foram iniciados em abril do ano passado, logo após o Carnaval, onde a Igrejinha se consagrou como segunda colocada. “O ritmo dos ensaios nesse momento é muito grande, com muitos compromissos com a comunidade e com a Liga. Além de toda a dedicação e animação por parte de todos”.
Sempre em busca de novidades e inovações, a escola busca crescer mais a cada desfile, e esse ano, com o tema ‘Furnas de Dionisio – Liberdade e Conquista de um Quilombo’ não será diferente. “O principal objetivo é mostrar um pouco da beleza da Comunidade de Furnas do Dionísio, que é tão maravilhosa quanto os esforços que tiveram para estabelecer-se como comunidade quilombola”, disse a presidente.
Com uma tradição enraizada na participação popular, a Igrejinha se destaca no Carnaval não apenas pelo brilho e criatividade de seus desfiles, mas também pela forte ligação com a comunidade. “A Igrejinha tem como diferencial e sempre teve a presença da comunidade e da população em geral em seus desfiles”, destaca Mariza. Esse envolvimento, que vai além da avenida, faz com que cada espetáculo seja um reflexo do carinho e da cultura compartilhada entre os membros e os foliões que acompanham a trajetória da agremiação.
Mais do que uma disputa pelo título, o desfile da Igrejinha é um momento de celebração coletiva e reconhecimento mútuo. “A mensagem sempre é de dever cumprido, de boa sorte a todos e de reconhecimento pelo esforço de cada um”, reforça. A escola busca emocionar o público e reafirmar seu papel no Carnaval, impulsionado pelo amor de seus integrantes e admiradores. “Procuramos fazer um desfile bonito, tranquilo e com o diferencial que é o amor que a população tem pela Igrejinha, esse sentimento que impulsiona todos para um grande Carnaval!”, conclui.
De família
Para Anatash Guimarães Damazio, 39, o amor pelo samba e pelo Carnaval ultrapassa gerações. No Carnaval de 2016 ela conheceu o esposo, e por coincidência, ambos tinham amigos em comum dentro da agremiação Igrejinha. Já com a mãe e irmãs presentes na bateria, ela e o esposo seguem presentes e agora, acompanhados das filhas.
“Sempre gostei de ir prestigiar, acompanhava a confecção das fantasias e toda a movimentação que acontecia na casa do Sr. Nugga, um dos ex-presidentes, que já falaceu. Isso a uns 20 anos atrás. Mas, depois que conheci o meu esposo, começamos a frequentar a quadra da bateria com mais frequência, me interessei em aprender um instrumento e a me dedicar a ir nos ensaios, até hoje”, relembra.
Com os ensaios técnicos realizados essa semana, na Praça do Papa, a expectativa é de fazer um bom desfile, e claro, o título, por meio da organização, dedicação e samba enredo.
“Todo ano trazemos novidades. Sempre a agremiação trará para a avenida um desfile totalmente diferente do último. Esse ano o enredo menciona desde o tempo que o Sr. Dionísio partiu em seu carro de boi, deixando Minas Gerais, até os dias atuais, como a festa da rapadura que essa comunidade quilombola realiza, as belezas naturais daquela região, a fé daquele povo e por aí vai”, destaca.
A ritmista ainda destaca um importante quesito na escola: a inclusão. “Temos uma componente autista conosco. Ela é muito participativa e presente na escola e a família relata uma evolução nela muito importante, após começar a frequentar a igrejinha”, pontua. “E sem a comunidade você não coloca a escola na avenida”, finaliza.
Por Por Carolina Rampi