Capital ganha mural de mais de 100 metros com tinta feita de cinzas de queimadas

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Obra faz parte do festival Nacional Parede Viva, e é uma homenagem aos brigadistas

Mais de 200 famílias, moradoras de um residencial do bairro Aero Rancho, ganharão uma nova paisagem neste fim de semana. Por meio do projeto ‘Parede Viva’, o artista Victor Macaulin realiza uma pintura de empena no condomínio, utilizando como matéria-prima um tipo de tinta criada com cinzas de queimadas de florestas brasileiras.

A obra será dividida em duas empenas (superfícies laterais dos prédios, sem janelas ou aberturas, que são frequentemente utilizadas para grandes murais e exposição de obras), cada uma com 57,2 m², num residencial popular do terceiro bairro mais populoso de Campo Grande. Além das pinturas, em todas as cidades em que o projeto participa, são realizadas oficinas, com atividades de arte e educação para alunos de escolas públicas.

O mural nascimento do mural não surgiu do nada. Nas últimas semana, a devastação de florestas alcançou números históricos, com maior registro de incêndios registrados, desde 1988, quando o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) iniciou o monitoramento. Até o último dia 23 de junho, 480 mil hectares foram queimados no estado, o que levou o governo do Mato Grosso do Sul decretar situação de emergência por 180 dias. E os dados alarmantes corroboram a última Coleção MapBiomas Fogo, que aponta que um em cada quatro hectares do Brasil pegou fogo nas últimas quatro décadas. Somente em 2023, a área queimada no país foi equivalente à metade do território da Bélgica, segundo a última edição do relatório, lançado em 18 de junho.

O mural da Capital é a primeira obra da nova edição do Festival Parede Viva, iniciativa cultural e educativa cujo objetivo é incentivar a conscientização socioambiental, tendo a arte urbana como principal ferramenta, a partir da pintura de empenas de prédios em cidades do Brasil. As obras são uma homenagem aos brigadistas florestais, que realizam um trabalho fundamental contra o fogo e pela preservação ambiental. O Festival Parede Viva – Edição Cinzas da Floresta é uma iniciativa da Parede Viva, com apoio da Rede Nacional de Brigadas Voluntárias (RNBV) e Mina Cultura. O patrocínio é da Yelum Seguradora, por meio da Lei de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura.

Com trabalhos desde 2018 relacionados a preservação ambiental, Victor Macaulin, participa pela segunda vez do projeto. “Desde 2018 eu venho realizando algumas pesquisas e produzindo alguns trabalhos artísticos em papel, tecido e murais, utilizando técnicas da tinta de terra, as tintas minerais, utilizando também do carvão, das cinzas, e das tintas vegetais, dos pigmentos de açafrão, hibisco, repolho roxo. Então já vinha produzindo trabalhos de preservação no sentido de conscientização da natureza, com questionamentos sobre o papel da arte nesse proposito de conscientizar e questionar. Em 2021, participei da 1ª edição do projeto ‘Cinzas da Floresta’, onde enviei dois trabalhos para São Paulo”, contou em entrevista ao Jornal O Estado.

Durante os meses de maio a julho de 2024 foram coletadas cinzas de queimadas de todo o Brasil para transformar em pigmento. Para isso, foi realizada uma articulação com brigadas florestais, com apoio da Rede Nacional de Brigadas Voluntárias (RNBV). As cinzas foram coletadas em seus biomas e enviadas para a equipe do projeto. Depois da coleta, para chegar às tintas, são peneiradas em um processo que cria tonalidades como uma grande aquarela, com graus de diluição variados para contornos e cheios, e a posterior aplicação de um verniz solúvel em água.

Uma das homenageadas no mural é Dona Maria, brigadista indígena, de etnia terena, da aldeia Mãe Terra, em Miranda. “A proposta do projeto é uma homenagem a esses brigadistas, representando esse combate deles aos incêndios. Também represento a destruição, a morte dos animais e da nossa flora, com um jacaré morto e algumas ossadas, de lobo-guará e de boi, trazendo essa questão do avanço da bovinocultura nas matas nativas”, explicou o artista.

Realiza em um dos bairros mais populosos da Capital, segundo Macaulin, o objetivo é trazer a arte para um lugar de grande visibilidade, para conscientizar e promover uma maior inclusão cultural.

“Eu acredito que a arte transforma, então a presença do mural no residencial vai gerar várias reflexões, diálogos, um sentimento de pertencimento, onde o espaço ira conter uma arte, esta que tem um tema, uma mensagem tão forte e importante, já que todo mundo sabe o que esta acontecendo, e que nosso bioma está sendo destruído. A arte vai impactar, tanto nesse sentido, quanto do acesso à arte, feita em uma região periférica, é a desburocratização da arte, que proporciona essa experiencia”.
Ainda segundo o artista, a altura foi uma grande adversidade. “Posso dizer que um dos desafios foi a altura, por ser meu primeiro trabalho nesse porte. Estar utilizando a EPI, com um peso a mais, além do desgaste físico. A gente tem que entregar até o domínio, então estamos dando o melhor para entregar a tempo, e com qualidade. Ver as pessoas da comunidade, do prédio, ir la e olhar, falar que está bonito, é muito gratificante”, finalizou.

Oficina

Na última semana, alunos da Escola Municipal Licurgo de Oliveira Bastos participaram de oficina com a artista Alice Hellmann, natural de Bonito (MS), que também será responsável pela pintura do mural na escola, e com a arte-educadora e oficineira Erika Pedraza.

“A oficina começou com o documentário, que é uma reflexão sobre os impactos das queimadas no país, onde passam pelo Brasil inteiro recolhendo as cinzas. Esse documentário já dá uma margem de conscientização para os alunos. Em seguida foi feito uma oficina com as cinzas, que eles viram ser recolhidas no documentário; eles ficaram bastante surpresos. Também realizaram cartazes sobre a natureza, meio-ambiente e conservação, eles se dedicaram bastante”, relatou Pedraza ao Jornal O Estado. Na segunda-feira (8), os alunos deverão visitar o mural no bairro Aero Rancho.

Parede Viva

Parede Viva é uma iniciativa sociocultural que acredita na arte urbana como uma poderosa ferramenta para abrir paredes que dividem pessoas e espaços. Desde 2010 desenvolvem projetos sob encomenda para diferentes clientes e demandas, sempre buscando a valorização e remuneração justa dos artistas brasileiros, valorizando as diversidades culturais e com foco na qualidade da entrega dos serviços.

 

Por Amanda Ferreira e Carolina Rampi

 

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