Elas no cinema: mostra de filmes debate protagonismo feminino

Crimes da Cruz  A equipe de “Crimes da Cruz”,  juntamente com Marcos Estevão Moura, psiquiatra forense, entrevistou a delegada do caso, Maria de Lourdes Cano; A família de uma  das vítimas - Gleice Kelly - Foto: Isabelle Silva/Divulgação
Crimes da Cruz A equipe de “Crimes da Cruz”, juntamente com Marcos Estevão Moura, psiquiatra forense, entrevistou a delegada do caso, Maria de Lourdes Cano; A família de uma das vítimas - Gleice Kelly - Foto: Isabelle Silva/Divulgação

Mostra no Grupo Casa reúne três produções sul-mato-grossenses e promove debate sobre o protagonismo feminino no audiovisual

O cinema sul-mato-grossense segue em festa após celebrar sua data oficial no último dia 19. No próximo domingo (23), às 19h, o Grupo Casa promove uma noite especial de exibições com os filmes Crimes da Cruz, Eleonora e O Assédio, seguida de um bate-papo com suas criadoras. A iniciativa destaca a força feminina no audiovisual e reforça a importância de ampliar sua presença no setor.

Após a sessão, a mediadora Gabriella Thais conduz a conversa com as diretoras Aniela Paes e Isabelle Silva, ao lado da diretora de fotografia Jessica Santos, discutindo processos de criação, desafios de produção e a relevância de fortalecer espaços para mulheres diante e atrás das câmeras.

Embora as mulheres representem mais da metade da população brasileira, elas permanecem sub-representadas no cinema nacional. Dados do Instituto Gemma (2014) revelam que apenas 13,7% dos filmes produzidos no país são dirigidos por mulheres, e menos de 1% por mulheres negras, um cenário que escancara desigualdades ainda estruturais no setor.

Diante desse panorama, a mostra promovida pelo Grupo Casa busca não só celebrar o cinema local, mas também fomentar debate sobre a presença e o protagonismo feminino na direção e em outras áreas técnicas, abrindo espaço para reflexões urgentes sobre diversidade e representatividade no audiovisual.

Foto: Isabelle Silva/Divulgação

Crimes da Cruz

Para o Jornal O Estado, a equipe, formada por Mileny Miyashiro de Sousa (21), Keilayne Pereira de Almeida(20), Caio Gomes da Cunha (21) e Isabelle Pereira da Silva (20) contou detalhes sobre uma série de crimes brutais que ocorreram na cidade de Rio Brilhante em 2008.Em entrevista ao Estado Online, uma das produtoras, Isabelle, compartilhou os motivos por trás da escolha do tema e os desafios enfrentados durante a produção do documentário “Crimes da Cruz”.

A ideia de fazer um documentário sobre o “Maníaco da Cruz” surgiu a partir do interesse da equipe pela linha investigativa de documentários. Na universidade, durante o curso de audiovisual, eles tiveram a oportunidade de estudar documentários teóricos e de produção.

A partir disso, Isabelle revelou que a equipe queria encontrar um tema que fosse relacionado a Mato Grosso do Sul. A lembrança de uma “lenda urbana” da infância, sobre o caso do “Maníaco da Cruz”, foi o ponto de partida para a pesquisa. À medida que a investigação avançava, o que era uma lenda se mostrou uma história verídica, despertando um senso de responsabilidade em compartilhar essa realidade com os moradores do Estado.

A mensagem que a equipe buscava transmitir através do documentário era a importância de preservar a memória das vítimas. Durante suas pesquisas, notaram a escassez de informações sobre as pessoas que perderam a vida nas mãos do “Maníaco da Cruz”. Isabelle destacou a falta de detalhes sobre suas histórias e a tendência em tratá-las apenas como corpos. Essa lacuna na narrativa motivou a equipe a mostrar que as vítimas tinham sonhos e toda uma vida pela frente, e que nada justifica o que lhes aconteceu.

“Quando uma pessoa mata outra, as pessoas sempre querem saber por que ela fez isso, se teve uma criação diferente, mas ninguém se pergunta sobre a vida das vítimas antes da morte. Elas simplesmente passam a ser um corpo, e poucos se importam com o que elas queriam ou com a sua memória”. Afirma Isabelle.

Foto: Isabelle Silva/Divulgação

A produção do documentário foi extremamente desafiadora, principalmente devido à natureza sensível e brutal do tema. Isabelle descreveu a dificuldade emocional de entrevistar a mãe de uma das vítimas, Vilma da Silva e o impacto pessoal que a história teve sobre a equipe. Mesmo diante das dificuldades, eles entenderam a importância de contar essa história e dar voz às vítimas.

“Não é apenas um corpo que apareceu em uma matéria jornalística; é a filha de alguém contando o quão incrível ela era e o quanto sente saudade dela. Eu e meus colegas ficamos profundamente comovidos, a ponto de querer parar. No entanto, sabíamos que era algo necessário a ser feito”, conta, Isabelle.

A busca pelas famílias das vítimas envolveu pesquisas em jornais, redes sociais e contato direto com policiais e autoridades relacionadas ao caso. A equipe teve de enfrentar a demora nas respostas e o desafio de conseguir as entrevistas com os familiares, mas, ao longo do processo, encontraram a compreensão e cooperação da mãe de uma das vítimas, Dona Vilma.

A decisão de dividir o documentário em episódios foi uma solução encontrada para abordar as várias camadas da história. O documentário é dividido em 5 episódios, apresentando tópicos específicos para cada um relacionado ao caso, como a família das vítimas, o sistema de justiça, o ambiente familiar do criminoso e os laudos psiquiátricos. Essa divisão permitiu uma abordagem mais aprofundada e detalhada do caso.

Eleonora

Ligia Tristão, artista de múltiplas linguagens, transita com autoridade entre a pesquisa em equidade de gênero, a criação cênica, a literatura, o cinema e o teatro. Reconhecida com o Prêmio Seu Agripino como Mestre do Saber em Teatro de Mato Grosso do Sul, ela também é a mente e o coração por trás do Grupo Casa – coletivo fundado em 2014 que reúne companhia teatral, produtora audiovisual, editora literária e uma escola de formação livre. No cinema, assina o longa Quando a gente se encontrar, o curta Eleonora e a série Cartas para o fim do mundo; na preparação de elenco, traz no currículo títulos como Beatriz Vira-Folhas e Entre Longes; e, como intérprete, soma uma carreira de espetáculos, filmes e documentários, incluindo sua participação no remake da novela Pantanal.

Foto: Isabelle Silva/Divulgação

Produzido pelo Coletivo Grupo Casa, Eleonora nasce como um gesto de delicadeza e coragem. Trata-se de uma narrativa sensível, que ilumina o amor e os recomeços possíveis depois dos 60 anos, um território ainda pouco explorado pelo audiovisual brasileiro. Lígia, que coordenou todo o processo, relembra que o projeto mobilizou uma equipe de 24 artistas, reunindo 16 pessoas no set durante as filmagens, em uma experiência tão intensa que acabou atraindo novos integrantes ao coletivo após o término da produção.

Gravado na região de Piraputanga, o filme escapa deliberadamente das imagens tradicionais associadas ao Pantanal. Em vez do cenário do gado e do campo, Eleonora revela um Pantanal íntimo, cotidiano, feito de afetos e paisagens que dialogam com a jornada de uma mulher que, após a viuvez, se permite reinventar a própria vida. “Tudo o que criamos nasce do nosso território”, afirma Lígia. “Usamos a ficção para convidar o público a valorizar nossa cultura e a beleza do Mato Grosso do Sul”, finaliza.

Serviço: A programação acontece no dia 23 de novembro, às 19 horas, no Grupo Casa, localizado na Rua Visconde de Taunay, 306, no bairro Amambai. A entrada é gratuita, com retirada de ingressos antecipados pelo Sympla.

 

Amanda Ferreira

 

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