Inventário estadual analisou cinco eixos para planejar ações rumo ao carbono zero em 2030
O Brasil, como país em desenvolvimento, tem o desafio de reduzir a emissão de gases de efeito estufa, ao mesmo tempo em que atividades econômicas e a população estão em expansão. É um compromisso internacional frear mudanças climáticas, pois elas interferem nos padrões de temperatura e clima, na saúde, produção de alimentos, água e biodiversidade terrestre.
Não há receita mágica, mas vontade, mudanças comportamentais pessoais e prover assistência técnica e transferência de tecnologia para descarbonização são entendimentos mundiais defendidos como solução.
Mato Grosso do Sul tem a meta audaciosa de zerar as emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2030, isso significa 20 anos antes do compromisso assumido no Acordo de Paris, que é até 2050.
Para isto, existe toda uma trajetória de descarbonização. Uma das primeiras ações foi publicar, em 2014, o Plano Estadual MS Carbono Neutro – Proclima, instituído pelo decreto que regulamentou a lei estadual n° 4.555, de 15 de julho de 2014. Ela trata da Política Estadual de Mudanças Climáticas.
O governo do Estado, por meio da Semadesc (Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação), anteriormente denominada Semagro, fez o primeiro inventário de gases de efeito estufa, com informações dos anos de 2017 e 2018.
Foram inventariados cinco setores: Energia, Processos Industriais e Uso de Produtos, Agropecuária, Mudança do Uso da Terra e Florestas, e Resíduos.
O estudo, que foi apresentado ano passado, no Egito, durante a COP27 (Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima), aponta que entre os cinco setores inventariados, o de processos industriais é o que menos emite gases de efeito estufa, com 0,31% do total.
Pela ordem decrescente, o levantamento apontou a Agropecuária com 55,75%, o setor de Mudança do Uso da Terra com 24,22%, o de Resíduos 13,07% e o de Energia com 6,65%. “Mato Grosso do Sul é um dos Estados que saíram na frente. Todo este processo de inventário, que nós fizemos, vem sendo aperfeiçoado, monitorado junto às empresas.
A Federação das Indústrias de MS tem uma ação muito forte nisto, para que a gente atinja este objeto (carbono neutro). Nosso objetivo está sendo traçado de maneira muito firme, para que possamos chegar em 2030 com todas as instituições envolvidas”, destaca o governador Eduardo Riedel (PSDB).
O professor doutor do curso de física da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Vinícius Capistrano, esclarece que o efeito estufa é um fenômeno natural e não é 100% maléfico para a Terra, pois é ele que mantém o calor no planeta.
Sem este efeito, a Terra teria uma temperatura em torno de -18ºC, inviável para a manutenção da vida.
O que acontece é que, depois da Revolução Industrial, as emissões de gases de efeito estufa aumentaram e a concentração de gases dificulta que o calor solar seja devolvido ao espaço. Com isto, aumentam problemas de alterações climáticas
É exemplo a seguir
Sobre as políticas adotadas no Mato Grosso do Sul, Capistrano destaca que o exemplo de medidas em prol de menos emissão de gases de efeito estufa deveria ser seguido por todos os Estados brasileiros.
“Hoje, estamos discutindo sobre emissão, formas de diminuir, de mitigar. Mas já temos que pensar nas tecnologias para retirar estes gases da atmosfera. Todos precisam se envolver porque as ações aqui são uma parcela do que o mundo inteiro precisa fazer”, alerta o físico Vinícius Capistrano.
Indústria limpa
Conforme o inventário do Governo do Estado, no setor de Processos Industriais e Uso de Produtos são contabilizadas as emissões provenientes de transformações físicas ou químicas de materiais, na indústria.
“Quando olhamos a emissão da indústria, poderíamos até falar que este setor sul-mato- -grossense já se aproxima de uma indústria limpa, exatamente porque usa energia renovável como a solar e de biomassa, que são dois principais fatores de geração de energia elétrica no MS. Quando se fala em transição energética, já somos um Estado emissor zero de carbono, em função desta produção limpa”, pontua o secretário titular da Semadesc, Jaime Verruck.
Ele explica ainda que toda vez que um novo empreendimento é lançado ou pede renovação de licença de operação, é obrigado a apresentar o balanço de carbono para as suas atividades. Com isto, já no licenciamento ambiental, é possível saber se a indústria é carbono neutro ou se precisa fazer algum tipo de adaptação tecnológica ou mitigação ou tem que fazer a aquisição de carbono neutro no mercado.
A obtenção do certificado de carbono zero é por meio de metodologias internacionais e certificadas pelo painel de mudanças climáticas da ONU (Organização das Nações Unidas). As empresas certificadoras, que são muito poucas em todo o mundo, se habilitam no referido painel.
Senai-MS pede habilitação na ONU para fazer certificações
Um reforço para ajudar Mato Grosso do Sul a conquistar o estágio de Estado Carbono Neutro está a caminho. Isto porque, no fim do ano de 2022, o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), que é ligado ao Sistema Fiems (Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul), pediu credenciamento junto à ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer, além de inventários, certificação de atividades para obtenção do reconhecimento de carbono neutro. A solicitação foi aceita e a ONU tem entre um e um ano e meio para bater o martelo. O Senai é conhecido nacionalmente por eficiência energética, principalmente por projetos de energia solar, inclusive entre 60 e 65% dos projetos no MS são do Senai, que faz e vende projetos mais baratos que os praticados no mercado, entre 10 e 20% mais em conta
Conforme o diretor regional do Senai Mato Grosso do Sul (Senai-MS), Rodolpho Mangialardo, o Estado tem, aproximadamente, 300 mil CNPJ (agro, comércio e indústria), que é o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica. Deste montante, menos de 5% é reconhecido como carbono neutro. “Tem muito o que se fazer, ainda, para chegar à meta estadual, mas não é impossível, porque há um trabalho intenso em andamento”, frisa.
Pantanal e o valioso crédito
O bioma Pantanal tem, aproximadamente, 150.355 km², sendo que 65% desta área está em território sul-mato-grossense e os 35% restantes no Mato Grosso. O local desperta olhares de diversos setores e moradores de muitos países. É também fonte para a neutralização de carbono e o Senai sabe disso e tem trabalhado com programas específicos, junto aos produtores e comunidades.
Rodolpho Mangialardo explica que o Senai promove a educação profissional e tecnológica, além de trabalhar inovação e transferência de tecnologias industriais, como forma de subsídio para a indústria e isto também inclui um movimento ecológico grandioso
Ele exemplifica a região do Pantanal Sul-Mato-Grossense, que tem forte apelo nacional e internacional de riqueza em biodiversidade e necessidade de conservação, porém há caminhos econômicos diferenciados que podem ser explorados.
O Serviço de Aprendizagem tem o Programa Senai de Carbono Neutro, que consegue fazer toda a certificação do inventário da emissão de toda uma indústria, por exemplo. Como não consegue chancelar, porque ainda está em processo de credenciamento com a ONU, atua com parceiros que contratou, que certificam e credenciam todo este movimento. “Paralelo a isso, tem o Pantanal como um grande mercado, que pode emitir crédito de carbono. Isto dá liga, conexão: eu tenho a indústria, que emite gás de efeito estufa e tem a ‘indústria do Pantanal’, que pode neutralizar este carbono.”
“Hoje, custa R$ 50 uma tonelada para eu neutralizar carbono na Amazônia e no Pantanal. Queremos acima de R$ 100. Isto é para valorizar toda a estrutura do Pantanal, para que o pessoal pare de pensar em produzir lá. Queremos que o Pantanal tenha o crédito de carbono mais caro do mundo. Vamos reflorestar o Pantanal e vender crédito de carbono, que vale muito mais”, planeja.
O entusiasmo para o comércio de crédito de carbono ganhou fôlego em 16 de agosto deste ano, quando o Brasil lançou a primeira bolsa de crédito de carbono do mundo. A bolsa de ações climáticas brasileira, B4, tem como objetivo estimular a transição energética e oferecer oportunidade para aqueles que querem compensar suas emissões.
Por – Michelly Perez
Confira mais notícias na edição impressa do Jornal O Estado do MS.
Acesse as redes sociais do O Estado Online no Facebook e Instagram.