“As lembranças da minha vó”

A cineasta Marineti
Pinheiro (à direita)
posa para foto com as
rezadeiras tradicionais
e Anarandá ao centro. A
gravação contou também
com jovens indígenas
e foi realizada na área
de retomada Yvu Verá,
localizada ao lado da
Aldeia Jaguapiru (Foto: Divulgação)
A cineasta Marineti Pinheiro (à direita) posa para foto com as rezadeiras tradicionais e Anarandá ao centro. A gravação contou também com jovens indígenas e foi realizada na área de retomada Yvu Verá, localizada ao lado da Aldeia Jaguapiru (Foto: Divulgação)

MC Anarandà lança videoclipe sobre memórias das florestas e desmatamento

Um dos nomes mais proeminentes da música contemporânea sul-mato-grossense vem das terras indígenas de MS. De etnia Guarani Kaiowá, a rapper MC Anarandà, lança no próximo sábado (25), em Dourados, o videoclipe da música ‘Che machu mandu´ákuemi’, ou ‘As lembranças da minha vó’, em português.

O clipe foi filmado com recursos do Governo Federal, por meio da Lei Paulo Gustavo e da Secretaria Municipal de Cultura de Dourados. Com direção da cineasta Marineti Pinheiro, o vídeo foi filmado na área de retomada Yvu Verá, localizado ao lado da Aldeia Jaguapiru, tendo como cenário uma casa de reza Guarani e conta com a participação de rezadeiras tradicionais e jovens indígenas.

“Eu trabalho com as mulheres indígenas Guarani Kaiowá desde 2019, e sempre foi um trabalho voluntário, de ensinar elas sobre a produção audiovisual, filmar, fazer alguns registros, colaborar de todas as formas possíveis. Em 2022, eu fui para Brasília, para a Marcha das Mulheres Indígenas, e foi no ônibus de viagem que conheci a Anarandà. Eu e minha filha éramos as únicas mulheres não indígenas no veículo, e no primeiro café da manhã da viagem, ali na beira da estrada, eu e a Anarandà começamos a conversar. Depois disso, eu trouxe ela para Campo Grande, para se apresentar na Feira da Música, e a gente começou uma relação de amizade” recordou a cineasta em entrevista ao jornal O Estado.

Nasce a parceria

Com a amizade firmada, a cineasta e a rapper iniciaram uma parceria na música e no audiovisual, com Pinheiro se dedicando no auxílio da carreira da indígena. Junto a produtora Orum, a cineasta mandou o projeto do videoclipe para a aprovação da Lei Paulo Gustavo de Dourados, que posteriormente foi aprovado. Com o auxílio em mãos, Pinheiro partiu para as gravações.

“A dona Roseli, que aparece como personagem principal, é uma pessoa que tenho um carinho enorme, frequento a casa de reza dela. A Claudiane, que é dona da casa de reza onde filmamos, conheci no Congresso Nacional. Foi um processo muito orgânico, o diálogo no começo foi construído depois, a música estava pronta, mas a Anarandà estava com o filho dela lá, com a Roseli, e aí tivemos a ideia de colocar essa conversa entre eles no vídeo, que esta na legenda.”,aponta Marineti.

“É lindo trabalhar com elas, esse é o primeiro trabalho que eu assino, apesar de estar muito tempo trabalhando com essas mulheres, fazendo um trabalho com elas, esse é o primeiro trabalho audiovisual que eu assino, como direção, porque eu sempre só contribuo. Agora, é isso que pretendo fazer, esses trabalhos mais autorais, ligados com essas mulheres que eu venho estabelecendo uma conexão já há algum tempo. E a Anarandà foi uma pessoa muito especial que aconteceu na minha vida”, disse Pinheiro.

Força do rap indígena

Na letra “As lembranças da minha avó” (título em português) uma anciã conta para o neto como eram as florestas antes do homem desmatar, antes de jogarem veneno e afugentarem os animais. Cantada em Guarani e português, tem ainda nos vocais a participação do filho da cantora, Fradraki Samuel de seis anos, que emociona com sua interpretação musical.

“A gravação foi dois dias de produção com muitas lutas conseguimos gravar a cada tomada. Como eu tenho filho pequeno, eu parava e amamentava e continuava. Os cineastas tiveram muita paciência de acompanhar e entender essa experiência de gravar um clipe, que é tão importante para mim, que sou artista indígena, porque é cheio de culturas, riquezas e curiosidades”, disse a rapper em entrevista.

Segundo Anarandà, o roteiro foi muito estudado pelos cineastas para exaltar a sua música e o local. Os personagens que aparecem no clipe foram convidados informalmente, mas a aceitação a impressionou. “Eu deixei muito a vontade para quem quiser participar, mas quando uma das rezadeiras disse que queria, porque se sentiu representada, eu fiquei impressionada. As meninas que aparecem representam a juventude, a continuação do nosso povo, para mostrar que a gente resiste dentro do território com muita luta, com a violência contra o nosso povo.”

“Através do clipe, eu quero mostrar que a nossa floresta já foi intocada um dia. Nossa floresta guarda o segredo em cada folha, é um mistério isso que as anciãs rezadoras falam. As crianças são futuros ancestrais, desde pequenas são ensinadas a serem fortes e resistentes, honrado a sua cultura e tradições com a força e união” esclarece a rapper.

Sobre a artista

Ana Lúcia Rossate, conhecida como Anarandá, nasceu na aldeia Guapoy Pandui em Amambaí, mora em Dourados onde faz faculdade, é cantora, Professora de Guarani, Digital Influencer e usa sua arte para falar do seu lugar, sua ancestralidade e suas origens. Canta somente músicas autorais e tem levado a mensagens das mulheres Guarani Kaiowá para o Brasil, tendo já a oportunidade de se apresentar com Nando Reis, Maria Gadú, ao lado da Ministra dos Povos Indígena Sônia Guajajara e da Deputada Federal Célia Xakriabá, além disso, tem feitos shows no estado e fora dele ecoando sua rima e trazendo consigo a luta de muitas mulheres que silenciam seu sofrimento por medo ou falta de conhecimento.

As músicas da rapper têm importante cunho social, retratando as violências sofridas pelas mulheres, principalmente dentro das aldeias indígenas. O primeiro videoclipe da cantora é da música “Feminicídio”, onde ela retrata na letra a violência contra a mulher, chamando a atenção das ouvintes.

Pinheiro considera que trabalhar com a rapper é muito gratificante, já que ela usa o poder da arte como uma manifestação das lutas das mulheres indígenas.
“Se você vê, por exemplo, a música Feminicídio, que foi o primeiro videoclipe que ela fez, que teve uma repercussão muito interessante para o trabalho dela. E ela relata que muitas mulheres acabaram quebrando o silêncio por conta dessa música. Eu me sinto muito, muito feliz de poder contribuir dessa forma, utilizando o que eu sei, o que aprendi, o que estudei, para transformar esse espaço de fala com essa arte, que é o cinema e a música, que são também duas artes, tem muito da questão do afetivo, do sentimento, da memória afetiva, do lugar de fala, da consciência, da transformação social”.

Serviço:

O lançamento, será realizado no próximo sábado (25), a partir das 19h, no Espaço Cultural Casulo, e tem entrada franca, haverá um show da cantora, acompanhada da multinstrumentista Kezia Miranda e ainda Sarau com outros artistas indígenas. O endereço é Rua Reinaldo Bianchi, 398 – Parque Alvorada,Dourados. O clipe ficará disponível no canal do YouTube da cantora.

 

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