O Papa recentemente eleito e empossado, no seu primeiro discurso após a eleição em 08 de maio de 2025, utilizou uma frase de Santo Agostinho (Sermão 340) que nos ajuda a compreender a visão da Igreja Católica sobre o poder de ensinar e a circulação do conhecimento ilustrado pela fé. Ele afirmou: “Com vocês sou cristão; para vocês, sou bispo” (Vobiscum Christianus sum, pro vobis episcopus). Essa declaração encapsula a dualidade do magistério católico, que se funda na reivindicação de verdade derivada da compreensão de eventos religiosos e históricos vistos, lidos e interpretados como sendo a revelação de Deus. O magistério se desdobra em dois pontos essenciais.
Primeiramente, ao se identificar como um cristão dentre os fiéis, o Papa, na posição de Bispo de Roma, reconhece que deve obediência à dinâmica da experiência de fé comum à vida de todos os cristãos, um conjunto conhecido como Tesouro Apostólico. Essa perspectiva destaca a dimensão comunitária da fé, onde o líder da Igreja se alinha aos fiéis em sua busca por compreensão e significado espiritual.
Em segundo lugar, na sua função como Bispo, que dá continuidade à linha sucessória de Pedro, considerado o Apóstolo de maior autoridade entre os seguidores de Jesus, o Papa detém uma voz privilegiada na interpretação e atualização dos fundamentos que regem o pensamento, a vida e a prática dos católicos. Suas declarações não são apenas orientações normativas para os fiéis, mas também se estendem a instituições, religiosas e não religiosas, devido ao peso histórico e à autoridade moral que possui como Chefe de um Estado singular, o Vaticano.
O Papa escolheu o nome de Leão XIV. Esse nome evoca duas faces de leão: a da autoridade forte, lembrando o precursor, Leão XIII, que chamou a atenção da Europa para os direitos dos trabalhadores, e a do afeto que desarma, lembrando o Irmão Leão, amigo de peito e confidente de Francisco de Assis. Essa escolha cria um paralelo entre o programa do pontificado do falecido Papa Francisco e o seu, enfatizando a importância da justiça social e da fraternidade entre os povos. Iniciando seu pontificado com uma clara intenção de manter a unidade dentro da Igreja Católica, ao mesmo tempo em que reafirmou seu compromisso com a paz e o desarmamento em suas discussões, o Papa Leão XIV estabelece um caminho que busca conciliar firmeza e compaixão.
A escolha do Papa Leão XIV reflete uma continuidade com a tradição, mas também um convite à reflexão e ao diálogo crítico. Sua liderança pode tornar-se uma voz relevante em um mundo que demanda compaixão, justiça e entendimento mútuo. Assim, além de líder espiritual trata-se de uma espécie de farol que pode apontar caminhos para católicos e para a sociedade em geral em tempos de incerteza. Com isso, a expectativa para seu pontificado é a de um diálogo que promova a compreensão mais profunda da fé, mas reconhecendo as complexidades do mundo moderno. Esse desafio exige um entendimento complexo, onde a fé e a razão, a tradição e a inovação, podem e devem coabitar.
A maior expectativa é a da urgência de diálogos construtivos sobre os desafios atuais que a sociedade enfrenta, incluindo questões éticas, ambientais e sociais. O Papa, ao se colocar na posição de interlocutor, não apenas na esfera religiosa, mas também nas dinâmicas sociais e políticas, consolida o papel da Igreja na sociedade contemporânea, fazendo dela um dos agentes de transformação do mundo.
Josemar de Campos Maciel é Doutor em Psicologia (PUC-Campinas) e professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Local da UCDB. E-mail: [email protected]
Este artigo é resultado da parceria entre o Jornal O Estado de Mato Grosso do Sul e o FEFICH – Fórum Estadual de Filosofia e Ciências Humanas de MS.
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