Presidente da CCJ do Senado concede entrevista exclusiva

Simone Tebet repercute sobre momento político da nação e das mulheres

Simone Tebet, senadora sul-mato-grossense, conduziu neste ano a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) – a primeira mulher a chefiar o mais importante colegiado do Senado, por onde transitam as ideias que viram lei depois. Ex-prefeita, ex-vice-governadora, ex-deputada estadual, ex-secretária estadual, ela, embora de modo discreto, em conversa com o jornal O Estado, em Brasília, na quarta-feira (11), apontou algumas dicas sobre seus planos políticos – um deles é concorrer ao governo estadual, em 2022, e ainda disputar o comando do Senado, um ano antes, em 2021.

Emedebista desde o início da carreira política, em 2003, ano em que ocupara o mandato de deputada estadual, Simone disse que, embora com gosto de “remédio amargo”, o Congresso Nacional fez certo em aprovar a reforma da Previdência. Do contrário, o Brasil já teria “afundado”, disse. Ela revela, ainda, que, no Senado, as senadoras, apesar dos avanços, sentem discriminação nas audiências que participam junto com os senadores. O Senado é composto por 69 senadores e 12 senadoras.

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O Estado – Senadora, a senhora foi a primeira prefeita de Três Lagoas, primeira vice-governadora de MS, primeira presidente da CCJ do Senado. Já foi convocada (em 2018) por seu partido a disputar e – se eleita fosse – seria a primeira governadora sul-mato-grossense. É desejo seu brigar pelo governo estadual?

Simone – Político, chegando a determinado momento de sua carreira, vai galgando certos espaços, e acaba não sendo dono de si mesmo. Primeiro, é preciso saber o que pensa o meu partido a respeito do meu trabalho, e mais do que isso, temos outros nomes tanto para a vaga do Senado como para o governo. E ainda mais: estamos a três anos [eleição estadual], significa que ainda tenho muito que trabalhar e, depois, por meio de uma pesquisa qualitativa, a gente entender como a sociedade está vendo o trabalho. Com que nível de satisfação estão vendo o meu trabalho, daí vemos se devo sair candidata à reeleição [Senado], se coloco meu nome à disposição do partido para o cargo do Executivo estadual ou mesmo se volto para casa. São essas as possibilidades, não me vejo saindo candidata a nenhum outro cargo que não sejam esses dois. É uma questão de aguardar; na política não somos donos de nós mesmos e a nossa vontade não necessariamente prevalece. Se prevalecesse talvez eu estaria em outros postos, outros cargos.

O Estado – Ainda na linha das ações futuras, é intenção sua concorrer à presidência do Senado, em 2021?

Simone – Acho que antes de tudo temos de se atentar que será apresentado um projeto de emenda à Constituição, ano que vem, que pode permitir a reeleição do presidente – hoje isso não é possível. Se a PEC for aprovada, basicamente, você estará ratificando, confirmando a reeleição do presidente do Senado [Davi Alcolumbre, do DEM-AP]. Se alcançados 49 votos para aprovar a PEC da reeleição, já é uma sinalização de que há um avanço no sentido de reeleger o atual presidente. Hoje, eu vejo com dificuldade essa PEC sendo aprovada – nem foi apresentada. Essa resposta depende obviamente da mudança ou não da Constituição. Se o atual presidente não for o candidato, obviamente que outros nomes serão lembrados, e meu nome, entre tantos que circulam. Muita água deve rolar por debaixo dessa ponte. Mas a única coisa que posso dizer é o seguinte: eu não fujo de responsabilidade, nem da luta.

O Estado – Um dos principais feitos do governo de Bolsonaro foi o de convencer o Congresso Nacional a aprovar a reforma da Previdência. O fato é que a proposta desagradou a milhões de brasileiros. A senhora, com algumas reservas, apoiou a ideia e contribuiu com a aprovação. Senadora, o Congresso acertou em concordar com a nova Previdência do Bolsonaro?

Simone – Acho que, acima de tudo, o Congresso Nacional percebeu (não por pesquisa, mas pela própria mídia, ouvindo as ruas, a sociedade) que, mesmo não gostando [do projeto], tinha de tomar esse remédio amargo. Nós, primeiro, tomamos, para termos a coragem de fazer o que precisava ser feito. Seria muito cômodo eu jogar para a galera, seria cômodo eu dizer isso agora: vai me tirar voto [aprovar a Previdência], não vai ter um bom resultado político, deixa o Brasil quebrar. A realidade era outra, nós fizemos o dever de casa. No caso do Senado, era mais complicado porque nós não tínhamos chances nem sequer de emendar a reforma. Tinha 30 por cento da reforma com que eu não concordava, mas era votar do jeito que estava ou mandar para a Câmara Federal e encerrar a reforma. O Brasil iria afundar. Hoje, em vez de 12,5 milhões teríamos 14 milhões de desempregados e por aí em diante. Tínhamos de fazer uma opção: tomar o remédio amargo e entregá-lo para a sociedade. Mas subtraímos muitas das injustiças que foram apresentadas pela reforma da Previdência.

O Estado – Senadora, prefeitos de MS viajaram e muito para Brasília neste ano. Eles querem a aprovação do chamado Pacto Federativo (plano Mais Brasil) que, se aprovado, modifica o modelo de repartição dos recursos financeiros aos estados. A senhora é favorável a esta proposta, e a medida tem chances de ser aprovada logo?

Simone – As três PECs [que integram o Mais Brasil], a PEC dos Fundos, Emergencial e do Pacto Federativo, entre fevereiro e março nós entregamos para o plenário [do Senado, onde as ideias serão votadas]; agora, não sai do jeito que entrou. A PEC, principalmente a Emergencial, tem muitas “maldades”. É preciso reequilibrar essa balança, um olhar atento ao servidor público, ao trabalhador, temos ali algumas injustiças. Estive com o ministro Guedes e perguntei a ele: “O senhor quer travar um embate de seis meses no Senado e aprovar 100 % do seu pacote, não necessariamente com meu voto, porque algumas coisas eu não voto, ou 60 ou 70 % de forma mais rápida”; e ele respondeu: “De 60 a 70%”. Dá para trabalhar o projeto e tirar os excessos.

Crédito: Jefferson Rudy/Agência Senado

O Estado – Senadora, sempre que comenta alguns planos em curso no Congresso, tidos como polêmicos, usa certa cautela ao comentar – exemplo: aborto, descriminalização das drogas, uso da maconha como recurso medicinal –, é contra essas iniciativas?

Simone – Como presidente da CCJ, as matérias caem lá, então procuro sempre agir como uma juíza, mas tenho posicionamentos muito claros. Não vejo problema nenhum de se utilizar a maconha com fins medicinais. Se isso for aliviar a dor das pessoas de quem precisa, quem sou eu que tem saúde 100% para dizer a uma mãe que vê o filho convulsionar constantemente e que precisa de medicamento, que eu discordo? Agora, em relação à descriminalização das drogas, eu acho que não é um avanço neste momento, acho que o Brasil precisa amadurecer muito mais. Diferente de quem está portando a maconha, aquele jovenzinho com até 5 gramas, não é isso. Estamos falando do uso das drogas e descriminalizar de forma a comprar em cada esquina. Hoje, sou radicalmente contra. Pode ser que no futuro alguém me convença do contrário, em audiências públicas. Em relação ao aborto, acho que a legislação está de bom tamanho. Temos de estender [a regra] para os fetos anencéfalos, ou seja, que já sabemos que não há chance de nascer vivo. Fora isso, aborto hoje é crime, precisaríamos muitas audiências públicas, talvez anos para evoluir, em alguma coisa além disso.

O Estado – Simone Tebet, o Senado é integrado por 81 mandatários e apenas 12 são mulheres. No dia a dia, sente dificuldade ao desenvolver seu trabalho de congressista, sente alguma discriminação por ser mulher num ambiente frequentado em sua maioria por homens?

Simone – É velada, silenciosa, escondida, mas existe. Desde uma reunião de líderes, quando uma mulher vai falar, o burburinho começa, a falta de respeito numa fala, até no fato dos erros, erro pequeno de uma parlamentar acaba virando coisa grande, coisa que não ocorreria se fosse um homem falando. Ainda há discriminação, evoluímos muito, no Senado um pouco menos. Mas isso é uma constante na vida da mulher, não só na política. A discriminação contra a mulher já existe quando ela ocupa a mesma função e ganha quase 40 por cento menos.

O Estado – Por algumas vezes, a senhora criticou atitudes do presidente Bolsonaro, principalmente quando ele se envolvera em polêmicas por meio das redes sociais. Acha que o presidente, no comando do Planalto, erra somente com isso, no caso, tentar presidir o país pela internet, ou a gestão dele tem outras falhas?

Simone – Numa nota de zero a dez, eu daria no mínimo sete ao presidente, ele passou de ano. Não fosse pelo excesso – eu critico para ajudar –, até porque ele tem um posicionamento ideológico muito extremado. E esse posicionamento atrapalha o próprio governo dele. O meu papel a meu ver é apontar o dedo e se manifestar: olha, aqui tem aplausos, mas aqui está se excedendo. Acho que ele melhorou muito de uns tempos para cá. Parece que ele está começando a perceber que tem um país para tocar, que é preciso cautela naquilo que fala. Hoje, o que ele fala reverbera no mundo inteiro e isso pode atrapalhar o Brasil. Na pauta econômica eu daria no mínimo 8 para o presidente. Só não dou nota maior porque ele fala em privatizar Petrobras, por exemplo. Mas tenho um posicionamento muito diferente do presidente no que se refere à pauta dos costumes. É preciso respeitar as diferenças, minorias, credo religioso, orientação sexual, temos posicionamentos diferentes – ela citou ser contra, por exemplo, o porte de arma “muito aberto”, uma das promessas de campanha do presidente.

O Estado – Já que deu nota ao presidente, poderia, senadora, avaliar em sua opinião dois políticos de MS que viraram ministros de Bolsonaro, no início do ano, o da Saúde (Luiz Henrique Mandetta) e a da Agricultura (Tereza Cristina)?

Simone – Tereza, nota dez sempre, extremamente preparada. Ela é ministra, deve obediência ao presidente, às vezes o presidente fala alguma coisa que atrapalha o agronegócio, lá vai a Tereza com a malinha na mão percorrer o mundo para poder explicar que não é bem isso. Já o Mandetta, com todo o mérito e a capacidade dele, não dá para dar dez. Porque a saúde no Brasil… não por ele e, sim, pela pasta. Eu daria nota 9. O ministro tem capacidade, mas a pasta não tem dinheiro suficiente.

(Texto: Celso Bejarano)

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