Padre Júlio Lancelotti é alvo de CPI promovida pela direita cristã paulistana

Foto: Victor Angelo Caldini
Foto: Victor Angelo Caldini

No retorno das atividades legislativas após o período de férias, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal de São Paulo planeja iniciar investigações em fevereiro deste ano sobre organizações não governamentais atuantes na Cracolândia. O responsável por essa iniciativa é o vereador Rubinho Nunes, cujas motivações e ações têm gerado controvérsias.

Rubinho Nunes (União Brasil), figura polêmica na Câmara, busca instaurar uma CPI que investigue o trabalho do Padre Júlio Lancelotti na Cracolândia. Lancelotti, conhecido por seu engajamento humanitário e idealismo religioso, realiza um trabalho de auxílio as pessoas de extrema vulnerabilidade e dependentes químicos na região. O vereador, no entanto, parece questionar a eficácia e a legitimidade dessas ações, levantando suspeitas sobre uma suposta “máfia da miséria” que exploraria os vulneráveis no centro da capital paulista.

Padre Júlio, alvo principal da CPI, tem sido alvo de críticas constantes por parte de políticos e figuras de direita, especialmente por sua oposição a medidas como remoção forçada de sem-teto e internação compulsória de dependentes químicos. O religioso, por sua vez, rejeita as acusações de oportunismo e exploração do flagelo social, destacando que sua atuação é uma ação pastoral da arquidiocese de São Paulo, sem vínculos com organizações civis ou não governamentais que utilizem convênios com o poder público municipal.

Em suas redes sociais, Padre Júlio lançou uma nota afirmando nenhum vínculo com ONG’s do município de São Paulo:

Fotos: Redes Sociais

Rubinho Nunes aponta duas entidades como prioridade nas investigações: o Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto, conhecido como Bompar, e a Craco Resiste, esta última associada ao padre Júlio. A CPI parece se enraizar em uma disputa política, com Lancellotti sendo próximo de Guilherme Boulos (PSOL), pré-candidato à Prefeitura de São Paulo, enquanto Rubinho apoiará a reeleição de Ricardo Nunes (MDB), cujas bandeiras são voltadas para um “estado mínimo”.

O vereador, em suas redes sociais, justifica a CPI como uma necessidade de fiscalização, acusando algumas ONGs de explorarem a miséria para lucrar e manter uma agenda política. Rubinho, que liderou manifestações antes do impeachment de Dilma Rousseff (PT), busca reforçar seu posicionamento ideológico ao confrontar Padre Júlio Lancellotti.

“Eu não tenho o menor medo da esquerda. Eu não tenho o menor medo do Júlio Lancelotti! Eu ganhei a eleição para incomodar a esquerda. Eu fui eleito vereador para fiscalizar e se existe uma marcha da merenda atuando no centro de São Paulo que eu vou bater. Porque essa máfia que acaba com a vida de todo mundo que mora no centro de São Paulo.” – Afirma Rubinho em vídeo.

Em suas redes socias, o jornalista Messias da Gente e ex- morador de rua em São Paulo, comentou o caso afirmando já ter sido beneficiado pelas ações do Padre Julio.

“Quando eu morava na rua, quantas vezes recebi o cobertor em meu corpo frio, quando eu abria os olhos lá estava esse anjo de Deus, quando tremia de fome, ele me deu a comida quente. Perdi todos os meus amigos para as drogas e para o crime, mas hoje estou aqui vivo para agradecer a esse homem abençoado. Obrigado fio de esperança, padre Júlio!!”

 

Pobrefobia

Padre Júlio Lancellotti, figura central na iniciativa, é reconhecido não apenas por suas ações solidárias, mas também por enfrentar ameaças de morte decorrentes de sua postura incansável contra a exclusão e exploração daqueles que vivem à margem da sociedade. Sua atuação na Pastoral do Povo da Rua busca romper com o ciclo de invisibilidade que muitas vezes envolve essa população vulnerável.

As ações solidárias realizadas pelo Padre, foram objetos de inspiração para o projeto literário, intitulado “Pobrefobia – Vivências das Ruas“, surge como uma expressão artística e sensível das experiências compartilhadas por pessoas em situação de rua na Paróquia de São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca, em São Paulo. Idealizado por uma equipe de artistas composta por Rogério Faria, Laura Athayde, Lila Cruz, Luiza Lemos e Raphael Salimena, o quadrinho busca dar voz aos invisíveis, explorando as realidades cruas e complexas da vida nas ruas.

A inspiração para a obra surgiu das rodas de conversa conduzidas pelo Padre Júlio Lancellotti, pároco da Paróquia São Miguel Arcanjo na zona leste de São Paulo e vigário Episcopal da Arquidiocese de São Paulo para a Pastoral do Povo da Rua. O religioso, conhecido por seu trabalho incansável em prol da dignidade humana, tem como marca a distribuição de alimentos aos necessitados e o cuidado dedicado às populações em situação de rua, menores infratores e crianças com HIV.

Devido à alta população em situação de rua, especialmente na região central de São Paulo, em fevereiro, o número de moradores de rua estava em torno de 52 mil, aumentando para pouco mais de 53 mil em março de acordo com uma pesquisa realizada Pela Universidade Federal de Minas Gerais. Houve oscilações nos meses seguintes, destacando a complexidade da problemática que envolve a Cracolândia e exige ações coordenadas e eficazes para abordar suas raízes e consequências.

O quadrinho é composto por quatro narrativas originais, cada uma com 10 páginas, que mergulham nas experiências desses indivíduos marginalizados. A obra aborda de maneira intensa e comovente temas como preconceito, marginalização e as diversas formas de violência enfrentadas pelas pessoas em situação de rua, conhecidas como vítimas da chamada “pobrefobia”.

 

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