CPI da COVID vê afronta em ida de Pazuello, sem máscara, a ato

André Borges - AFP
André Borges - AFP

Ex-ministro da Saúde divide palanque com Bolsonaro no Rio de Janeiro

Os senadores que integram o grupo majoritário da CPI da COVID enxergaram a participação do ex-ministro Eduardo Pazuello (Saúde), sem máscara, em ato político com o presidente Jair Bolsonaro, no domingo (23), como uma afronta à comissão.

Os parlamentares desse grupo, formado por independentes e oposicionistas, trabalham em estratégias alternativas para romper a blindagem que entendem ter sido criada para dificultar o avanço das investigações relativas ao Ministério da Saúde, em particular da gestão Pazuello. Há intenção, por exemplo, de aprovar repetidamente convocações de alvos.

No domingo, Bolsonaro promoveu nova aglomeração ao participar de um ato com motociclistas no Rio de Janeiro. Pazuello esteve em um caminhão de som ao lado do presidente, ambos sem máscara.

A atitude foi encarada como um desafio e uma afronta à CPI da COVID, após o ex-ministro ter declarado em depoimento que apoiava o uso de máscaras como medida para prevenir a infecção pelo coronavírus e ter pedido desculpas por ter entrado em um shopping de Manaus sem o item de proteção.

Além disso, integrantes da cúpula do Exército avaliaram como descabida a participação de Pazuello no ato e esperam punição, conforme afirmaram reservadamente à “Folha” generais do Alto Comando da Força.

Mesmo antes do evento desse domingo, o grupo majoritário da CPI já havia definido pela reconvocação do general, por causa da série de mentiras que foram ditas durante sua oitiva, na quarta-feira (19) e quinta-feira (20). O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), disse durante o fim de semana que o requerimento de convocação será votado amanhã (26).

“Eu gostaria que estivesse com a mesma coragem de hoje na CPI. O general Eduardo Pazuello fez hoje uma escolha de ser o primeiro personagem declaradamente indiciado da CPI”, afirmou o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede- -AP). “Se essa CPI não pedir o indiciamento do ex-ministro, ela não terá razão de existir. Componha o depoimento dele com os fatos de hoje e você terá aí os movimentos para isso. Pazuello foi incluído no rol dos indiciados, não por mim, não pelo Renan [Calheiros, relator da comissão], mas pelos atos dele”, completou.

Opinião semelhante tem o senador Humberto Costa (PT-PE), também membro da CPI, que classificou como um “deboche” à população e um ato para tentar desmoralizar a CPI a aglomeração realizada no Rio de Janeiro.

“Eu acho que está debochando da população, tentando desmoralizar a CPI, cometendo reiteradamente crime contra a saúde pública. Parlamento, Judiciário e Ministério Público têm que se posicionar sobre isso”, afirmou. Os membros da comissão afirmam que existe uma blindagem do governo para impedir o avanço das investigações nas ações e omissões do Ministério da Saúde.

Pazuello compareceu em dois dias na comissão, munido de um habeas corpus que garantiu o direito ao silêncio para evitar incriminá-lo. Senadores consideram que o militar usou o instrumento jurídico para mentir abertamente, numa tentativa de obstruir a apuração.

O mesmo expediente, afirmam, deve ser usado pela secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, que vai prestar depoimento hoje (25). A secretária, conhecida como “Capitã Cloroquina”, também obteve um habeas corpus.

Como acreditam que ela não responderá questões sobre sua participação na difusão da hidroxicloroquina para o tratamento da COVID e tampouco no desenvolvimento da plataforma TrateCov, os senadores buscam contornar essas limitações.

A intenção é questioná-la sobre a existência do “ministério paralelo”, um grupo de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro fora da estrutura do Ministério da Saúde.

No que consideram outra tentativa de obstruir as investigações, o ex-secretário-executivo do ministério, atualmente na Casa Civil, Élcio Franco, apresentou um exame que atestou infecção pelo coronavírus no dia 3 deste mês e pediu para adiar seu depoimento, que seria na próxima quinta-feira (27).

Os senadores da comissão pretendem driblar essa tentativa de obstrução, em especial com habeas corpus, por meio de repetidas convocações dos personagens envolvidos.

Acreditam que a exposição das mentiras durante os depoimentos podem ser usadas em recursos para que o STF (Supremo Tribunal Federal) evite conceder novos habeas corpus para esses personagens.

O primeiro teste nesse sentido será com o próprio Pazuello, que deve ser reconvocado e muito possivelmente solicitará novo habeas corpus.

“Vamos esperar para ver a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, que até agora tem sido um grande adversário da CPI”, afirma o senador Otto Alencar (PSD-BA), que acredita que Mayra vai repetir o papel de Pazuello na comissão.

“Ela pode mentir à vontade, pode ficar calada, pode dar risada, como fez o Pazuello. Pode fazer tudo que está garantida pelo STF”, completou. (Folhapress)

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