A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (20), um projeto de lei que flexibiliza o desmatamento da vegetação não florestal. Essa categoria, segundo a plataforma MapBiomas, representa uma área de 50,6 milhões de hectares no Brasil, ou cerca de 1,5 vez o território da Alemanha.
A proposta foi aprovada de forma conclusiva, ou seja, não precisa passar pelo plenário da Câmara para nova votação e, portanto, já pode ir ao Senado.
Ambientalistas criticam a proposta: entendem que ela ameaça o equilíbrio ambiental do país e que.o texto tem trechos vagos, que podem causar insegurança jurídica. “É a maior das boiadas contra os biomas brasileiros”, diz Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da ONG SOS Mata Atlântica.
A aprovação acontece na segunda semana da bolsonarista Caroline de Toni (PL-SC) como presidente da CCJ. O projeto começou a ser votado nesta terça-feira (19) e só acabou nesta quarta.
Antes, a Folha de S.Paulo já havia mostrado que a proposta poderia anistiar mais de uma década de desmatamento na mata atlântica e flexibilizar a exploração de áreas estratégicas para a sobrevivência do bioma.
O texto, no entanto, foi alterado antes dessa última votação. O novo relatório, do deputado Lucas Redecker (PSDB-RS), ampliou o escopo do projeto para não o restringir apenas à mata atlântica, mas alterar todo o Código Florestal.
A vegetação não florestal, de forma resumida, é aquela composta predominantemente por plantas com menos de 10 cm de diâmetro. Majoritariamente, são arbustos, flores e pequenas árvores.
Esse tipo de vegetação é abundante, por exemplo, no cerrado, no pantanal e nos pampas.
Esse tipo de vegetação também costuma ser encontrada à margem de rios ou em locais de nascente e, por isso, é de fundamental importância para garantir o fluxo das águas no país, inclusive a alimentação de reservatórios do Sul e do Sudeste.
Segundo dados do MapBiomas de 2022, 6% de todo o Brasil é composto de não florestas, ou o equivalente a mais do que o território da Alemanha.
De acordo com a mesma análise, esse tipo de vegetação está presente em 74,1% dos pampas, 61,1% do pantanal e 15,2% do cerrado.
A área, no entanto, pode ser ainda maior. Isso porque há não consolidação jurídica sobre o conceito de vegetação não florestal.
Por exemplo, as savanas, a depender do levantamento, podem ser consideradas não florestais, já que são predominantemente compostas de árvores com menos de 10 cm de diâmetro no tronco. O levantamento do MapBiomas, no entanto, não considerou esta vegetação como não florestal.
O texto da lei passa a encarar como “área rural consolidada” (ou seja, onde é permitida a intervenção humana) os imóveis rurais com vegetação nativa não florestal, mesmo que tal área não tenha sido derrubada até o ano de 2008 -marco temporal do Código Florestal para o desmatamento.
O texto ainda diz que tais disposições abrangem não só propriedades rurais consolidadas, mas também as APPs (Áreas de Preservação Permanente), reservas legais ou áreas de uso restrito -isto é, aquilo que não é Terra Indígena ou Unidade de Conservação.
Em nota, nomes da bancada ruralista defendem o projeto.
Alceu Moreira (MDB-RS), autor inicial da proposta, comemorou a aprovação, mesmo após o texto ter sofrido diversas alterações que ampliaram o seu escopo para além da mata atlântica.
“Essa alteração legislativa é fundamental para que a produção agrícola das regiões de campos de altitude não seja completamente anulada”, afirmou Alceu Moreira.
“Temos que deixar claro que o texto tem relação total com proteção ambiental. A matéria foi amplamente discutida e estamos dando um passo essencial para o desenvolvimento do meio ambiente e do nosso país”, defendeu o relator, Lucas Redecker.
Ambientalistas, no entanto, criticam duramente a proposta.
“É a implosão das regras relativas aos campos nativos e a um conjunto extenso de formações não florestais”, diz Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
Para Mauricio Guetta, consultor jurídico do ISA (Instituto Socioambiental), “trata-se de proposta que pretende revogar toda a proteção da vegetação nativa não florestal, em vigor no Brasil desde 1934, liberando-a para o desmatamento generalizado em todo o país”.
“O impacto é abissal em biomas predominantemente não florestais, como pantanal, cerrado, caatinga e pampa, mas também afeta enormes áreas não florestais presentes na amazônia e na mata atlântica”, completa.
Antonio Oviedo, pesquisador do mesmo instituto, destaca que as áreas de formação natural não florestal contribuem com importantes serviços ambientais. “Tais como áreas de recarga de aquíferos, áreas de amortecimento de enchentes ou áreas com alta riqueza biológica”, explica.
Com informações da Folhapress, por João Gabriel
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