Sem alternativas, famílias do ‘Carandirú’ vivem às margens dos programas habitacionais

condominio carandiru
Foto: Marcos Maluf

Invadido há quase 20 anos, condomínio entrou no foco de autoridades, após a megaoperação policial 

Após a Polícia Civil de Mato Grosso do Sul realizar a operação “Abre-te Sésamo” contra a criminalidade, no condomínio “Carandirú”, na manhã de terça- -feira (6), em Campo Grande, o residencial invadido, no bairro Mata do Jacinto, passou a ser foco das competências governamentais, além da população. No condomínio e nas redondezas, os moradores seguem com medo, por isso se recusaram a falar com a imprensa. “Nós não sabemos o que mais pode acontecer, então preferimos não falar”, disse um senhor.

Construído em 1994 pela Degrau Ltda., que faliu e acabou não concluindo a obra, o verdadeiro nome do residencial é Athenas e contaria com três quartos, sala, cozinha e dois banheiros. Mas, logo depois, ficou conhecido como “Carandirú” devido às suas características. Com três blocos sem pintura, muros ou calçada, as pichações colorem diversos pontos do condomínio, que abriga 46 famílias de forma irregular. 

Muitos dos residentes, que vivem há quase 20 anos no local, estão em situação de vulnerabilidade econômica, sem emprego ou renda fixa. À época, apenas uma parte do residencial havia sido invadida, tendo em vista que outro bloco já estava concluído e vendido. Para o fornecimento de água e energia, foi preciso entrar em uma briga judicial. Ao entrarem na Defensoria Pública, os moradores ganharam o direito de uso. 

Com o passar dos anos, o condomínio se tornou palco de tráfico de drogas, furtos e roubos, preocupando quem reside no entorno. Alvo de ação policial na última terça-feira (7), o “Carandirú” também possui reintegração de posse pendente na Justiça. 

Na ação, em que foram cumpridos 46 mandados de busca e apreensão, equipes do Corpo de Bombeiros, Defesa Civil, Energisa e assistência social do município averiguaram as condições dos imóveis e das famílias que ali residem. 

Procurada pela reportagem, a SAS (Secretaria Municipal de Assistência Social) afirmou ter sido acionada pela 3ª Delegacia de Polícia, com o propósito de garantir direitos às 46 famílias residentes no condomínio Carandirú, em meio à ação policial. “Durante a ação, houve prisões e, posterior a isso, nossas equipes, sendo o Cras Nossa Senhora Aparecida, Creas Norte, Uaifa 1 e Seas (Serviço Especializado em Abordagem Social) estiveram no local, também. As proteções sociais básica e especial atenderam às famílias por meio de orientações e encaminhamentos, acionaram a Amhasf (Agência Municipal de Habitação e Assuntos Fundiários) e listaram as famílias presentes, a fim de verificar regularidade no CADÚnico, acesso a benefícios socioassistenciais, cadastro na habitação, entre outros.”

Como medida emergencial, foi ofertado acolhimento às famílias que desejassem se retirar, porém, não houve aceite. “De acordo com o Corpo de Bombeiros, foi realizado auto de interdição, aguardando parecer da Defesa Civil e Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), para que as famílias sejam despejadas”, detalhou. 

De acordo com a Amhasf, “a prefeitura não tem a prerrogativa de fazer fiscalização ou cadastro no local, já que o mesmo é particular”. Em nota, a agência também afirmou que “será realizado um estudo sobre a situação do condomínio invadido”, mas que, no momento, ainda não há dados específicos sobre as famílias e o local que habitam. 

A prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes, comentou a ação realizada pela Segurança Pública do Estado. “A Secretaria Municipal de Assistência Social se posicionou, tendo em vista, se houvesse a necessidade, as nossas equipes estariam a postos, cadastrando as famílias que não possuíam cadastros e entendendo qual a necessidade das pessoas.”

“Eles ainda não desocuparam o prédio, então, ainda não fomos acionados sobre a necessidade de realocá-los em outras residências”, acrescentou, à reportagem. 

Do outro lado, há queixas como “vou sair pra onde? Como vamos pagar aluguel?”. Alguns dos moradores relataram sua situação. Os questionamentos  expõem a realidade de dezenas de famílias, que agora não têm para onde ir. No residencial, não há sindico, mas o aluguel é cobrado todos os meses e varia de R$ 150 a R$ 400. De acordo com os moradores, ninguém conhece o “dono” ou o “comandante” do negócio, no entanto, com um salário reduzido, o baixo custo da moradia acaba compensando.

Incertezas no condomínio Carandirú

Desde a ação policial realizada nesta semana, os serviços de energia no “Carandirú” foram suspensos, a pedido do Corpo de Bombeiros, por questões de segurança da comunidade local, conforme informou, em nota, a concessionária. “A Energisa foi notificada pelo Corpo de Bombeiros, por meio de auto de interdição sobre as inconformidades estruturais e de segurança do condomínio e, portanto, a necessidade de suspensão do serviço na região por questões de segurança da comunidade local. A distribuidora segue em contato com a Defensoria Pública, Corpo de Bombeiros e Polícia para resolver a situação dos moradores que lá residem”, informou. 

De acordo com o defensor público Carlos Eduardo Oliveira de Souza, a situação é crítica. “Sabemos que têm famílias no local, com pessoas de condições de doença, que precisam de tratamento, crianças, e a suspensão de um serviço essencial afeta diretamente a condição de vida dessas famílias. Então, precisamos resguardar esses direitos, que foram alcançados. Em relação à decisão da saída, existe, hoje, um procedimento, que está sendo avaliado judicialmente. Já foi determinada uma intimação das partes, em fevereiro deste ano, para que haja uma audiência, uma tentativa de reconciliação, incluindo o município, para que, se for o caso, sejam realocadas essas famílias. Mas, de qualquer maneira, nós não temos, hoje, uma destinação específica”, disse ele. Conforme apurado, o Corpo de Bombeiros elaborou um auto de interdição do condomínio, mas ainda estaria faltando um parecer das autoridades cabíveis. 

Segundo a advogada da construtora, Hilda Priscila Correia, a empresa tenta a desocupação desde 2004. “Na época que se deu a invasão, a obra estava paralisada e os blocos invadidos não possuem condição nenhuma de habitabilidade. Essa situação precária, de risco, já tinha sido levada ao conhecimento do poder Judiciário e a empresa tem uma ação, há anos, em trâmite, na qual ela busca a reintegração de posse dos blocos inacabados, sabendo do risco que as famílias correm.

Por Brenda Leitte – Jornal O Estado do MS.

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