Em entrevista, Rosana Leite diz que custos de medicamentos e insumos afetam diretamente o orçamento municipal
A sobrecarga de pacientes em Campo Grande e a crescente dependência das cidades do interior para tratamentos médicos especializados continuam sendo um problema crítico em Mato Grosso do Sul. Apesar dos avanços na regionalização da saúde, quase 30% dos atendimentos eletivos na capital ainda são realizados para pacientes do interior. Em algumas especialidades, como neurocirurgia e cardiologia, esse percentual chega a 100%, já que esses tratamentos são exclusivos de Campo Grande.
Em entrevista exclusiva ao jornal O Estado, a secretária municipal de Saúde de Campo Grande, Rosana Leite, analisou a situação da saúde na capital e os desafios impostos pela centralização dos atendimentos. Ela destacou a alta demanda por serviços de urgência e emergência e abordou como a telemedicina vem se tornando uma alternativa eficaz para reduzir a sobrecarga nos hospitais. Além disso, apontou as limitações do SUS (Sistema Único de Saúde), que frequentemente não cobre integralmente os custos dos atendimentos, pressionando ainda mais o sistema municipal.
Segundo Rosana, dados de 2024 mostram que o interior do Estado responde por aproximadamente 27,4% dos atendimentos eletivos, enquanto 72,3% são destinados a pacientes da Capital. “Isso reflete claramente a concentração da saúde em grandes centros. Em comparação com outros estados, observamos uma grande disparidade, com os municípios menores apresentando números significativamente inferiores em infraestrutura e atendimento”, afirmou.
A situação é ainda mais crítica em especialidades como neurocirurgia, onde Campo Grande se torna a única opção para pacientes do interior. “Na neurocirurgia, 100% dos atendimentos são de pacientes do interior. Isso representa um desafio enorme, pois os custos ultrapassam frequentemente o financiamento do SUS, exigindo esforços contínuos para garantir atendimento adequado”, explicou.
Rosana também ressaltou a importância do atendimento integral, que inclui o fornecimento de medicamentos nas farmácias públicas. Segundo ela, a atenção à saúde não se limita apenas à consulta, mas também ao acesso a tratamentos adequados.
“Muitas vezes, o paciente não precisa apenas de uma consulta, mas também de medicamentos que fazem parte do tratamento. O custo desses medicamentos pode ser significativo para o município, já que nem sempre estão cobertos integralmente pelo SUS”, explicou.
Ela destacou que o SUS possui um teto financeiro para os atendimentos, e que os recursos repassados nem sempre cobrem os custos reais. “Por exemplo, um atendimento pode gerar um valor de R$ 10 para o município, mas os custos com medicamentos e outros insumos podem ser muito maiores, aumentando a pressão sobre os cofres municipais”, detalhou.
Telemedicina pode ajudar
Diante da sobrecarga hospitalar, a secretária destacou a telemedicina como uma ferramenta essencial para melhorar o acesso à saúde. Campo Grande tem investido significativamente nesse modelo, principalmente em especialidades como nefrologia e cardiologia, que apresentam alta demanda.
“Estamos vendo bons resultados com a telemedicina. A tecnologia reduz a distância entre o paciente e o especialista, permitindo consultas remotas. Isso é fundamental para populações em áreas remotas, onde o deslocamento seria inviável”, ressaltou.
O programa estadual de telemedicina tem mostrado avanços na redução da sobrecarga em Campo Grande e na ampliação do acesso a cuidados especializados.
Regionalização da saúde
Sobre a descentralização dos serviços de saúde, Rosana Leite destacou os desafios na distribuição equilibrada dos atendimentos entre as regiões do estado. “O sistema deve se adaptar às condições de cada região. Não podemos esperar o mesmo nível de serviço em um município com 2.000 habitantes e em uma cidade com quase um milhão. A concentração de recursos em Campo Grande se deve à alta demanda”, explicou.
Ela também enfatizou a importância de ampliar a infraestrutura no interior e oferecer tratamentos de maior complexidade em municípios vizinhos. “A municipalização e a regionalização devem caminhar juntas, mas para isso é necessário investir em infraestrutura e aumentar os recursos nos municípios menores. Caso contrário, a sobrecarga continuará em Campo Grande”, alertou.
Financiamento e coparticipação
Outro ponto abordado foi o financiamento do SUS, que ainda enfrenta defasagens significativas. Apesar de ser um sistema tripartite, com recursos federais, estaduais e municipais, Rosana alertou para as dificuldades que os municípios enfrentam devido ao teto financeiro do SUS e aos custos adicionais assumidos pelas administrações locais.
“Há uma discrepância entre o valor pago pelo SUS por procedimento e o custo real do serviço. Muitas vezes, o município precisa complementar os recursos para garantir o atendimento adequado. Em Campo Grande, cerca de 20% a 30% dos atendimentos de urgência e emergência são de pacientes do interior, o que eleva significativamente os custos”, explicou.
Ela citou a neurocirurgia como exemplo crítico, em que 100% dos atendimentos são destinados a pacientes do interior. “Se o financiamento não for adequado, o sistema de saúde municipal fica comprometido”, acrescentou.
Por fim, Rosana Leite ressaltou a importância do apoio do governo estadual para equilibrar o financiamento e a distribuição dos serviços de saúde. Segundo ela, aumentar os incentivos financeiros para os municípios é essencial para uma gestão eficiente e equitativa da saúde pública.
“O Estado tem um papel fundamental em garantir que os municípios recebam o suporte necessário. Com um financiamento adequado, podemos oferecer mais serviços à população e aliviar a sobrecarga nas grandes cidades. Sem esse suporte, o sistema de saúde pública fica em risco”, concluiu.
Por Suelen Morales
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