O mundo se despediu, nesta segunda-feira (21), de uma das figuras mais marcantes da Igreja Católica no século XXI. Jorge Mario Bergoglio, o papa Francisco, morreu aos 88 anos, às 2h35 pelo horário de Brasília (7h35 no horário local), segundo confirmação oficial do Vaticano. O argentino liderou a Igreja por quase 12 anos, desde sua eleição em março de 2013, e foi o primeiro pontífice latino-americano da história.
O comunicado do Vaticano expressou profunda reverência ao pontífice: “O Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e de Sua Igreja (…). Com imensa gratidão por seu exemplo como verdadeiro discípulo do Senhor Jesus, recomendamos a alma do Papa Francisco ao infinito amor misericordioso do Deus Trino”.
Francisco foi pioneiro em diversos sentidos: primeiro papa vindo das Américas, primeiro jesuíta a ocupar o cargo e o primeiro, em mais de seis séculos, a assumir o papado após a renúncia de seu antecessor, Bento XVI. Nascido em Buenos Aires, em 17 de dezembro de 1936, filho de imigrantes italianos, Bergoglio iniciou sua vida profissional como técnico químico antes de seguir a vocação religiosa. Em 1969, foi ordenado sacerdote e, anos depois, tornou-se uma das principais figuras da Igreja na Argentina, até ser nomeado cardeal por João Paulo II, em 2001.
Uma liderança em tempos desafiadores; uma trajetória marcada por reformas e inclusão
Sua eleição em 13 de março de 2013 ocorreu em um momento crítico para a Igreja Católica, que enfrentava uma crise de credibilidade e escândalos de abusos sexuais ao redor do mundo. Francisco assumiu como o 266º papa, com a missão de restaurar a confiança dos fiéis e modernizar estruturas internas da Igreja.
Apesar de afirmar ter sido eleito contra a própria vontade, o pontífice rapidamente mostrou uma liderança firme, simples e profundamente comprometida com os valores evangélicos. Escolheu o nome Francisco em homenagem a São Francisco de Assis, símbolo de humildade e defensor dos pobres.
Durante seu papado, Francisco promoveu mudanças significativas. Ele permitiu que mulheres votassem no Sínodo dos Bispos, nomeou mulheres para cargos de liderança no Vaticano e autorizou a bênção de casais do mesmo sexo, num gesto visto como avanço no diálogo da Igreja com a comunidade LGBTQIA+.
No entanto, sua recusa em ordenar mulheres como sacerdotes e sua firme oposição ao aborto o mantiveram em posição conservadora em certos aspectos da doutrina. “Em termos de doutrina, ele não mudou nada”, apontou o especialista italiano Marco Politi. “Nunca fez parte dos progressistas, mas buscava uma Igreja mais próxima dos fiéis.”
Voz política e apelo à solidariedade
Francisco também ficou conhecido por não se furtar a declarações políticas. Criticou líderes de nações em guerra, como Vladimir Putin e Benjamin Netanyahu, e cobrou ações da União Europeia diante da crise migratória. Seu momento mais simbólico ocorreu durante a pandemia da Covid-19, quando rezou sozinho sob chuva na Praça São Pedro — um gesto de fé e esperança transmitido ao mundo inteiro.
Mas seu principal foco sempre foi o combate à pobreza. Ao longo de todo o seu pontificado, defendeu os marginalizados e clamou por justiça social, com o lema “Miserando atque eligendo” — “Olhou-o com misericórdia e o escolheu”.
Saúde fragilizada e últimos dias
Nos últimos meses, a saúde do papa já preocupava o Vaticano. Em fevereiro deste ano, ele foi internado após ser diagnosticado com bronquite. Na sequência, desenvolveu uma infecção polimicrobiana e, em seguida, pneumonia bilateral — condição que agravou sua capacidade respiratória. Mesmo debilitado, manteve parte das atividades religiosas até ser hospitalizado por cerca de 40 dias. No mês passado, recebeu alta, mas permaneceu sob cuidados médicos constantes até sua morte.
O legado de um papa acessível
Francisco será lembrado como um papa do diálogo, da compaixão e da simplicidade. Fez questão de viver com humildade — recusou os luxos do Palácio Apostólico, optando por morar em uma residência modesta no Vaticano. Costumava se referir a si mesmo como “pecador” e era frequentemente visto interagindo com fiéis, abraçando crianças e idosos, e pregando com bom humor.
Suas raízes argentinas e paixão pelo tango e pelo time San Lorenzo o tornaram ainda mais próximo das pessoas. Ele conseguiu atrair não apenas os católicos praticantes, mas também agnósticos e não-crentes, graças ao seu discurso humanista e acolhedor.
O futuro da Igreja
Até o momento, o Vaticano não anunciou detalhes sobre o funeral do papa Francisco. A expectativa é de que cardeais de todo o mundo se reúnam nas próximas semanas para iniciar o processo de escolha do novo pontífice.
O desafio será grande: suceder um papa que, mesmo sem romper com a tradição doutrinária, conseguiu aproximar a Igreja das pessoas, reformar estruturas internas e colocar os pobres e excluídos no centro da missão cristã.
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