O jornalista Glenn Greenwald disse em entrevista a Juca Kfouri no programa Entre Vistas, da TVT, que o Jornal Nacional atuava, antes dos diálogos vazados pelo The Intercept Brasil, quase como parceiro da Lava Jato e de Sergio Moro.
“Obviamente, a grande mídia estava como uma aliada do Sergio Moro e da Lava Jato nos últimos anos, não só por ideologia, mas também porque o modelo do lucro da mídia brasileira era receber vazamentos da força-tarefa da Lava Jato sem gastar com nenhum recorte, sem fazer investigações”, analisou.
“Então o Jornal Nacional recebia vazamentos da força-tarefa da Lava Jato, o [apresentador William] Bonner anunciava que tinha uma notícia muito importante sobre corrupção, com uma audiência enorme, e a Globo lucrava muito sem fazer jornalismo. O papel da grande mídia no Brasil era quase como parceiro da Lava Jato e do Sergio Moro”, disse Glenn.
Para o jornalista, a situação só mudou quando o The Intercept Brasil procurou as mídias tradicionais, divulgando informações exclusivas, para informar o que o site estava descobrindo através das mensagens vazadas. “Nossa estratégia, então, foi convidar a grande mídia para ter acesso ao nosso jornalismo, para reportar junto com a gente. Acho que sem a nossa estratégia, sem envolver todos conosco, não seria assim.”
Moro e a imagem machucada
Glenn analisa que a imagem de Moro foi construída durante os últimos anos “sem desafio, como um herói”, mas as consequências dos diálogos vazados são graves para o atual Ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro.
“Muitos aliados deles na mídia disseram, depois de apenas uma semana, que as acusações eram muito graves e que ele deveria renunciar ao seu cargo público”, lembra o editor. “Uma aliada importante, a revista Veja, que ficou cinco anos o aplaudindo, quase pediu desculpas para o público pela imagem que eles construíram. E, agora, a Veja é nossa parceira jornalística.”
“Se alguém tivesse dito para mim há três meses que eu seria parceiro da Veja, denunciando Moro, eu acreditaria que essa pessoa era quase louca. Podemos ver que o tamanho de Moro é muito menor no Brasil e a opinião pública no trabalho da força-tarefa da Lava Jato mudou radicalmente após as reportagens.”
O jornalista acredita que seu trabalho vem mudando o pensamento dos brasileiros sobre o ministro, como aconteceu quando ele se juntou a Edward Snowden para revelar programas secretos de vigilância global dos Estados Unidos.
“Depois de dois meses, Moro ainda é o ministro da justiça. Mas ele é uma figura muito mais fraca, igual o Deltan Dallagnol [coordenador da Lava Jato]. Eu acho que essas mudanças são sutis, mas geralmente mudanças importantes acontecem com o tempo e de forma sutil”.
Reportagem sobre FHC
O norte-americano ainda analisa que, dentre as diversas reportagens divulgadas pela The Intercept, a que ele sentiu que não recebeu o valor devido foi relacionada a Fernando Henrique Cardoso.
“Conseguimos mostrar que o Moro mandou que o ex-presidente fosse protegido, porque ele é um aliado importante. Isso para mim é um crime, escolhendo que vai processar e quem vai ser protegido porque é o seu aliado.”
Glenn afirma que “ainda há muito mais para reportar” sobre este caso, e salienta que a situação do ex-presidente e do Lula são semelhantes.
“Já mostramos isso, que eles tinham uma obsessão condenando o Lula, mas ao mesmo tempo querendo proteger FHC, mesmo com integrantes da Lava Jato falando que acusações contra o instituto do FHC eram quase iguais às do Lula.” (Uol)