Ciência transforma vida no campo e faz do MS exportador de produtos agropecuários

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Embrapa é uma das empresas de pesquisa que mais contribuem para alimentar o mundo

Texto: Bruno Arce, Jornal O Estado de MS

A população mundial já ultrapassou 8 bilhões, conforme projeções da ONU (Organização das Nações Unidas). Estes bilhões de bocas para comer despertam na ciência uma corrida por inovações tecnológicas para aumentar a produção, em menos tempo, com mais qualidade, sustentabilidade, empatia e trabalho por saúde no campo e na cidade. A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) é uma das entidades de pesquisa que contribui em grande escala com a agropecuária brasileira, ao longo dos 50 anos de existência.

Em Campo Grande-MS, a Embrapa Gado de Corte tem papel de destaque em genética animal, sistemas de produção e pecuária digital. No que diz respeito ao pasto, a vanguarda é nas pesquisas de melhoramento de pastagens, como as cultivares de P. maximum Tanzânia-1 (1990), Mombaça (1993), Massai (2001) abrangem cobertura de 70% do território brasileiro e representam 90% das exportações de sementes para o mundo tropical (países da América do Sul). Quem revela é a pesquisadora da unidade, dra. Liana Jank. “O Mombaça é o mais utilizado. A gente faz uma estimativa que cerca de 20 a 30 milhões de hectares são cobertas com essa espécie”, diz.

Liana Jank desenvolve pesquisas em melhoramento de forrageiras, mais especificamente com a gramínea Panicum maximum na Embrapa, em conjunto com pesquisadores de diversas instituições. O trabalho resultou, ao longo de 40 anos da Embrapa Gado de Corte, no lançamento comercial das cultivares. Antes desta série de trabalho, não havia melhoramento destas variedades. Só havia capim Colonião, que é uma forrageira resistente que chegou ao Brasil com os escravizados africanos sendo, portanto, a primeira espécie cultivada no País.

Foto: Divulgação

A Embrapa recebeu em 1983, por meio de convênio, todo material de uma instituição francesa coletado em países do leste da África (Quênia e Tanzânia). “Eram mais de 426 coleções, que foram plantadas em MS para estudos, ao longo de 10 anos. A principal característica comparada do Mombaça com o Colonião, era 130 % mais produtivo e 20% mais folhas. Numa área que tinha de início o colonião, depois a Tanzânia e o Mombaça, você consegue engordar muito mais bois e o manejo fica bem mais fácil”, explica a pesquisadora Liana Jank.

Do colonial a um sucesso sem paralelo no mundo

E o que o melhoramento de forrageiras (gramíneas ou leguminosas) tem a ver com os milhões de bocas para alimentar no mundo? Muita coisa. A base da alimentação de bovinos é água e pasto. Antes do bife chegar ao prato, por exemplo, muita gente trabalhou na genética, no manejo e, sim, na semente do capim e do grão que vira ração. No período do Brasil colonial, o gado era criado à solta, em pastagens naturais que só eram renovadas na base do fogo para brotar mais macias. Os bovinos eram criados sem manejo. Só no século 20 iniciou a prática do plantio de capim exótico e de lá para cá a necessidade de aprimoramento de técnicas produtivas só aumentou porque a população humana cresceu em velocidade gritante.

Conforme a Embrapa, na década de 70 o brasileiro tinha um consumo médio de carne bovina de 18 quilos/ano e agora ultrapassa os 34 quilos por pessoa ao ano. Se as pesquisas não tivessem andamento e o produtor não entendesse esta necessidade de evolução, o País não seria exportador de alimentos.  O chefe-geral da Embrapa Gado de Corte, Antônio do Nascimento Ferreira Rosa, destaca que o balanço durante os 50 anos comemorados pela Embrapa é, simplesmente, sem paralelo no mundo. Estima-se que, no Brasil, cada real investido em pesquisa tenha trazido um retorno de R$ 12 a R$ 20.  “Claro que esta mudança não foi feita pela Embrapa, propriamente, e, sim, pelo produtor rural. Mas isso só foi possível graças aos conhecimentos e tecnologias geradas pela pesquisa e pela aplicação de políticas públicas adequadas”, pontua.

Pesquisas daqui que multiplicam por toda parte

Desde a implantação o da Embrapa Gado de Corte em Campo Grande, em agosto de 1975, no então estado de Mato Grosso, até dezembro do ano passado, a Embrapa Gado de Corte lançou 104 tecnologias e contribuiu, diretamente, para a criação de nove políticas públicas que muito contribuíram para a evolução da pecuária de corte no Brasil. Em 2002, a Embrapa Gado de Corte iniciou uma importante parceria com a Associação para o Fomento à Pesquisa de Melhoramento de Forrageiras (Unipasto), que atualmente tem 31 produtores e diversas categorias de associados. Estes produtores aportam recursos para a pesquisa e todo ano é apresentado plano de trabalho. Eles também opinam para atender o mercado com o lançamento de novas cultivares forrageiras e tecnologias que fortaleçam a agropecuária brasileira.

As duas entidades também atuam para combate à pirataria de sementes e comercialização de sementes protegidas. Esta proteção começou em 2004 e garante a qualidade na produção. No caso de comercialização, fica a cargo da Unipasto multiplicar e vender essas sementes. “Se alguém abre empresa de sementes e não é associado não vai poder comercializar”, informou o chefe-geral da Embrapa Gado de Corte, Antônio Rosa.

No passado tinha que coletar amostra grande da folha, moer, e toda a parte de qualidade fazia quimicamente. Proteína era um processo, digestibilidade era outro processo, fibra outro processo. Demorava muito tempo. Hoje, os pesquisadores da Embrapa utilizam um aparelho chamado NIR (uma tecnologia rápida e de alta precisão que utiliza do princípio natural da emissão de radiação eletromagnética para realizar análises de determinação da composição química de alimentos e outras amostras orgânicas). Com ele só se pega uma amostrinha, lê pela luz e tem todo resultado. “Não só melhorou a rapidez, mas a eficiência. Então, hoje em dia, tem naquela primeira fase de avaliação diversos híbridos, extrai o DNA, consegue avaliar muitos mais materiais que podem virar cultivar”, diz a pesquisadora Liana, que revela ainda que em três ou quatro anos, serão apresentados novos lançamentos. Por enquanto, o processo é de multiplicação de sementes.

Sobre fazer pesquisas há 40 anos, Liana respira como se passasse um filme na mente. “Certo dia vi uma reportagem de um produtor no Rio de Janeiro, que estava feliz quando a cultivar Tanzânia-1 melhorou a sua vida. É este sentimento que eu carrego: que bom nosso trabalho fez melhorar a vida das pessoas. Se alguém usa porque é bom. É o sentimento de gratidão”, resume.

O presidente do SRCG (Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho), Alessandro Coelho, que é pecuarista e agricultor, destaca que o trabalho técnico e científico, como os desenvolvidos pela Embrapa, são de suma importância para o agro. “A Embrapa é uma instituição fundamental para o desenvolvimento da agropecuária brasileira, e justamente por isso tem o reconhecimento de todos os produtores rurais. Um exemplo disso, foi o desenvolvimento das forrageiras tão importantes para a alimentação e nutrição do gado. A Embrapa tem investido em pesquisa e desenvolvimento de novas variedades que se adaptem às diferentes condições climáticas e de solo do país, visando aumentar a produtividade e a rentabilidade da pecuária brasileira”, frisa.

Os Kichel, a Embrapa e os ganhos no campo  

Falecido Armindo Kichel foi engenheiro agrônomo e pesquisador da Embrapa Gado de Corte. Nas lembranças do filho, Andrei Kichel, as idas aos campos de pesquisas e consultorias.  Andrei formou-se agrônomo e em 2005 adquiriu a Fazenda Vitória, em Aquidauana-MS. É nela que põe em prática seus conhecimentos e o legado do pai. E não está sozinho: o neto de Armindo, Arthur Bossay Kichel, de 16 anos, caminha pelos mesmos passos.

Andrei trabalha com cria, recria e engorda. Para alimentar o gado tem 630 hectares de pastagem formada. Utiliza o sistema de manejo rotacionado das pastagens, com 9 módulos de aproximadamente 70 hectares cada, que é dividido em quatro piquetes de 18 hectares, totalizando 36 divisões. Investe em pastagem em torno de R$ 250 mil por ano, entre reforma e adubação. As espécies forrageiras foram escolhidas conforme a fertilidade do solo.

O criador trabalha na propriedade com três espécies de forrageira (P. Maximum cv Mombaca, B.brizantha cv Marandu e B.brizantha cv MG-5). A lotação da fazenda e de 1,7 mil cabeças de gado entre bezerras e novilhas. Hoje, para se ter lucro na pecuária é preciso fornecer alimentação de qualidade o ano todo para o gado. “O alimento mais barato é a pastagem, por isso numa propriedade é preciso saber formar e manejar bem as pastagens, com bom preparo de solo, semente de qualidade e adubação. Fornecendo pastagem de boa qualidade vai fazer com que custo produzido seja baixo, assim obtendo lucratividade e rentabilidade na propriedade”, explica Andrei.

Kichel é cliente da empresa Germipasto, que tem unidade de beneficiamento de sementes em Camapuã-MS. É de lá que vem as três variedades de sementes para formar pastagem da fazenda, que tem 1700 cabeças, entre bezerras e novilhas. Daniel Di Raimo, engenheiro agrônomo e gerente comercial da Germipasto, destaca que entre as brachárias, o Marandú lançado na década de 80 ainda é a principal cultivar comercializada. “Atualmente a empresa está entre as maiores comercializadoras de sementes de pastagem do Brasil. Atuamos também com exportação de sementes. Os principais destinos são países da América Latina e em segundo plano alguns países do continente Africano”, explica.

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