O Brasil, com pouco mais de 209 milhões de habitantes, é o segundo país em número de consumidores de cocaína, só atrás dos Estados Unidos, conforme diz um dos diretores da Polícia Federal. Com fronteiras permeáveis, baixos riscos e lucros milionários, a matemática é terrivelmente simples para alguns especialistas.
No Brasil, o consumo aumenta a cada ano: 1,46 milhão, ou 0,7% dos cidadãos, consomem cocaína. Levando em conta todos os derivados da droga, como o crack, a cifra chega a 5,6 milhões de usuários.
Em primeiro lugar, o país partilha uma fronteira de mais de 11 mil quilômetros com dez outros. Três deles, Bolívia, Peru e Colômbia, são os provedores de cocaína do mundo, com uma participação de 10%, 20% e 70%, respectivamente, segundo o último informe do Escritório das Nações Unidas contra Droga e Crime (UNODC).
A explicação dos funcionários da PF é que nos três países produtores um grama de cocaína-base tem um preço médio de venda de um dólar, e no Brasil, de cinco dólares – quase o mesmo que uma embalagem de cigarros.
Uma das razões é que o custo de transporte é muito menor entre os dois lados da porosa fronteira sul-americana, e a produção na zona aumentou vertiginosamente.
Em muitos países os usuários tendem a ser de classe média-alta, por conta do preço da cocaína. Já no Brasil todo mundo tem acesso econômico à droga e seus derivados.
Ampliar a visão da atividade do crime organizado em outras partes do mundo permite ver de outra perspectiva a problemática do que sucede no próprio país, e conectar pontos, já que nenhum desses fenômenos é realmente isolado.
A complexa situação do Brasil é um caso de estudo que mereceria interesse global, tem tanto impacto nos EUA, devido à quantidade de armas importadas desse país, quanto na Europa, pois organizações criminosas como a ‘Ndrangheta, da Itália, ou o Cartel de Juárez, do México, encontraram solo fértil para lavagem de dinheiro e para usá-lo como trampolim para o tráfico de cocaína na Europa.
Agora a Polícia Federal do Brasil parece ter um novo objetivo. Com base na experiência de outros países como México e Itália, sua meta é entender o funcionamento das três principais organizações criminosas do país: o Primeiro Comando Capital (PCC), o Comando Vermelho (CV) e as dezenas de milícias.
Elas representam o maior risco de segurança nacional, pela violência que geram, o tráfico e distribuição de drogas para consumo interno, e o controle territorial.
O investimento e o risco dos grupos criminosos no Brasil, para comprar e traficar cocaína, é mínimo, e um dos mais bem articulados nesse ponto é o PCC. Como observa o professor Gabriel Feltran, a matemática é assustadoramente simples.
É alto no Brasil o índice de roubo de veículos para financiar a compra de cocaína e armas. Em sua grande maioria os veículos são vendidos, completos ou em partes, no mercado negro do Paraguai, onde, até muito recentemente era fácil legalizá-los e em seguida traficá-los a outras partes do país ou do continente.
Segundo as autoridades, o comando soma mais de 20 mil integrantes, que têm uma visão “ideológica” e empresarial e faturam 200 milhões de dólares ao ano.
Há apenas algumas semanas a Polícia Federal deteve em São Paulo Nicola Assisi, um importante atravessador, através de quem a organização criminosa ‘Ndrangheta, da Calábria, traficava cocaína para a Europa. Seu fornecedor era o PCC, gerando-lhe lucros multimilionários. (João Fernandes com Deutsche Welle)