Valor da arroba caiu mais de 10% desde as suspensões do produto à China
A queda da arroba do boi de mais de 10% nos preços ainda não refletiu em açougues e supermercados da Capital. O consumidor enfrenta os custos atuais do corte bovino e não vê diferença significativa proporcional à diminuição do preço pago aos pecuaristas. Segundo representantes do setor, a defasagem do valor da carne bovina pode estar relacionada a estratégias do varejo em segurar os preços.
De acordo com analistas, o produtor ainda está tratando do gado e precisa vendê-lo para compensar as despesas com o animal. Além disso, os eventos climáticos atuais não permitiriam a retenção do boi no campo, pois o volume de chuva não está sendo suficiente para o crescimento ideal do capim.
“Não tem como segurar o preço porque o boi está sendo tratado. E esse tempo de trato tem de render. Quando você põe um boi para tratar, ele tem data marcada para sair. Ou seja, o fazendeiro não está segurando os preços. Se fosse no primeiro semestre deste ano, que tem capim sobrando, aí sim daria”, explica Sérgio Capuci, presidente da Assocarnes (Associação de Matadouros, Frigoríficos e Distribuidores de Carnes de Mato Grosso do Sul).
Ele afirma que quem deve estar retendo o valor da carne são os estabelecimentos do varejo. “Quem está segurando os preços são os açougues e supermercados. O fazendeiro já baixou em R$ 50 o preço para vender o boi. Começou a chover agora, então, até o capim estar pronto para segurar o boi vai ser fim de dezembro. Só então seria possível reter o boi”, acrescentou.
Já os açougues rebatem essa retórica e atribuem a ausência de repasse da queda na arroba do boi aos frigoríficos e pecuaristas. “Eu acredito que os fazendeiros estão segurando o boi no pasto. Eles não estão passando o valor real da diminuição para os frigoríficos”, disse Vanderlei Delino, proprietário da Casa de Carne Delino.
Para o empresário, até houve redução dos preços, mas esta foi irrisória ante a constatada no mercado. “Houve uns 5% de redução do frigorífico para nós, ou até menos. O produto está muito alto e você não consegue repassar. E esses 5% não refletem em nada. Antes, a gente estava pagando R$ 20,20 na vaca casada [preço por quilo], agora o cobrado é de R$ 19,80.”
Em outro estabelecimento da Capital, a realidade para os responsáveis do local é parecida com a de Vanderlei. A ex- -proprietária do açougue Brito Carnes e Mercearia, Márcia Martins, comenta que não percebeu nenhuma diminuição dos valores nos frigoríficos e revelou que, ao contrário disso, ocorreu aumento.
“Na verdade, o preço está subindo cada vez mais. Creio que pode ser um pouco de briga de gente grande, entre o produtor e o frigorífico. Os dois estão querendo ganhar, eles diminuem uma coisa aqui, outra ali, mas nem chega até nós. No açougue, as pessoas procuram mais pé de frango, salsicha, porco, o próprio frango”, detalhou Martins.
De acordo com a Assocarnes, os frigoríficos estão registrando prejuízos desde o início do mês passado, quando das medidas do protocolo sanitário entre Brasil e China para fiscalização dos casos de “vaca louca” confirmados, em território brasileiro. A associação esclarece que, como alternativa, os abatedouros estão dando férias coletivas, reduzindo os abates e redirecionando para outros mercados importadores, como Chile e Uruguai.
Boi mais barato
Desde as suspensões das exportações de carne bovina para a China, em 4 de setembro, o preço da arroba do boi só acumula quedas. A interrupção dos envios da mercadoria ao país asiático, principal comprador do produto brasileiro, fez com que o valor da arroba do boi gordo saísse de R$ 317,17, na data das suspensões, para R$ 275,68, em 20 de outubro, uma redução de 13%. Para o consumidor final, essa diminuição não foi vista.
Barganha chinesa
Segundo especialistas do segmento, existe ainda uma estratégia da China em causar o embargo ao Brasil. Para os analistas, o país asiático aproveita de seu poderio econômico e status de maior comprador para negociar os preços da carne, já que a proteína está cara em vários países.
“Historicamente, a China tem uma visão supercomercial de tudo. Negociam em qualquer oportunidade e sabem o poder que têm como comprador. Afinal, são os maiores importadores não só de carne, mas de soja, e vão ser de milho, algodão, celulose, etc.”, avaliou Marcos Jank, professor de agronegócio no Insper, à CNN Brasil. (Felipe Ribeiro)