Mato Grosso do Sul tem um índice alto de recuperados pela COVID-19, um total de 97,11%, até a última sexta-feira (24). De acordo com os dados da SES (Secretaria de Estado de Saúde), são mais de 372.268 pessoas que foram infectadas pelo novo coronavírus no Estado, desde o início da pandemia, mas 361.543 conseguiram vencer a doença. Só que, para muitas delas, a luta não acaba quando o vírus deixa o corpo, ou quando recebem alta da UTI (Unidade de Terapia Intensiva), o processo de recuperação exige esforço, dedicação e muita paciência.

Jhonny Florêncio Biancão Lopes, 40, tem vivido esse processo desde o dia que deixou o hospital em 1º de abril deste ano. Ele ficou quase 100 dias internados, sendo 70 deles no CTI (Centro de Terapia Intensiva), entre a vida e a morte por conta da COVID-19. Saiu da unidade hospitalar e precisou reaprender praticamente tudo, como andar e falar. A história é considerada um milagre, já que por diversas vezes os médicos afirmaram para a família que ele não sobreviveria, ou não seria a mesma pessoa e viveria com limitações, após a batalha que enfrentou.

“Foi muito difícil e ainda está sendo, porque a doença acabou com meu corpo. Eu tenho muitas dores ainda, tenho dores na cabeça. Têm dias que eu não sinto nada, graças a Deus, mas têm dias que eu não consigo levantar da cama, meus músculos e meus tendões ficam doloridos demais, minha pele também me queima”, relatou.

A história de Jhonny ficou conhecida em todo Mato Grosso do Sul. A família realizou campanhas de oração e várias pessoas se uniram para pedir pela recuperação dele. Quando saiu do hospital, ele estava, praticamente, irreconhecível, com a pele escura, por conta dos medicamentos, quase sem cabelo e magro.

“Quando acordei [do coma] senti meu corpo diferente, porque eu emagreci mais de 50 quilos, eu tinha 95 quilos de músculo e fui para 40. Fiquei negro, todo queimado, não tinha mais cabelo. Foi muito difícil para mim, porque pensa: você dormir de um jeito e acordar dessa forma”, desabafou.

Hoje, a fisionomia de Jhonny já mudou completamente. Com a ajuda de sessões de fisioterapia e fonoaudiologia, ele voltou a andar e até dirigir. Ele também já está conseguindo falar, só que ainda precisa fazer algumas pausas entre uma frase e outra para recuperar o fôlego e até mesmo o raciocínio. Mesmo assim, durante a entrevista, Jhonny não recuou em nenhum momento e conta a sua história para todos que quiserem ouvir.

“Eu tenho que falar o que aconteceu comigo, porque existem muitas pessoas que não estão acreditando ainda. É muito perigoso [o vírus], cada um tem um organismo diferente, pode não acontecer nada em você, mas você pode passar para o pai, mãe, filho ou irmão”, disse.

Os primeiros sintomas da COVID-19 surgiram em dezembro, Jhonny é médico e conta que foi infectado durante atendimento na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) em que trabalhava, em Campo Grande.

“Às vezes eu atendia entre 30 e 40 pacientes em uma noite. Eu tive um colega que começou tem dores musculares e fiquei preocupado com ele, tanto que ele faleceu. Logo, eu comecei a sentir muitas dores no corpo e no pé. Foi muito rápido, no outro dia eu não consegui mais andar. Minha esposa me levou ao hospital, fiz a tomografia e já estava tendo alguns problemas pulmonares. Começou muito rápido, após isso eu não lembro mais.”

Da cadeira de rodas para a liberdade

O Cer/Apae (Centro Especializado em Reabilitação da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) implantou há mais de 10 meses o ambulatório pós-COVID 100% SUS (Sistema Único de Saúde) e a primeira paciente a ser atendida no local, Solange Maria Cácere, 56, recebeu alta neste mês de agosto, mais de um ano após ser infectada pelo novo coronavírus.

A aposentada chegou ao local muito debilitada, de cadeira de rodas por conta da fraqueza muscular adquirida após a COVID-19 e com depressão. No local, recebeu o atendimento da equipe multiprofissional. Fez fisioterapia para fortalecer a musculatura pulmonar, comprometida pelo vírus e dos membros superiores e inferiores.

Também fez acompanhamento com nutricionista, psiquiatra, entre outros profissionais do Cer/Apae. “Eu fui me recuperando. Cheguei lá na Apae de cadeira de rodas e saí de bengala. Graças a Deus, eu estou bem melhor, praticamente, estou curada”, resumiu Solange.

Porém, o caminho dela até a recuperação não foi fácil. Solange teve COVID-19 no início do mês de julho de 2020. Sem comorbidades, ficou 25 dias internada na UTI (Unidade de Terapia Intensiva). Sem conseguir se lembrar o que aconteceu com ela durante o período em que esteve em coma, é a filha, Lislley Raquel Damazio, que relembra a luta quando descobriu que a mãe havia sido infectada. “Meu coração fica bem apertado de ver tudo o que eles passaram aqui, porque eu não senti nada, estava em coma, os meus dois filhos sofreram mais”, disse, emocionada. (Texto: Mariana Ostemberg)