Um dia depois de a Polônia anunciar que irá enviar caças soviéticos MiG-29 para a Ucrânia usar contra os russos, um segundo membro da Otan (aliança militar ocidental), a Eslováquia, fez o mesmo nesta sexta (17). É uma mudança de patamar no auxílio de países alinhados aos Estados Unidos ao esforço de guerra de Kiev, atacada pelas forças de Vladimir Putin em fevereiro do ano passado.
“O processo de entrega desses caças será coordenado com o lado polonês”, afirmou o premiê eslovaco, Eduard Heger.
Ele disse que um total de 13 aeronaves seriam doadas, algumas sem condição de voo para servirem de fonte de peças sobressalentes.
Segundo o inventário anual Balanço Militar, referência publicada pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (Londres), Bratislava tinha em 2022 11 MiG-29 em ação. Seu uso, contudo, foi descontinuado ao longo do segundo semestre. O país encomendou em 2018 uma frota de caças americanos F-16 para substituí-los, e conta com a cobertura aérea de seus vizinhos da Otan, assim como ocorre nos três Estados Bálticos à sombra da Rússia, que nem Aeronáutica própria têm.
A Polônia, por sua vez, havia dito que entregaria imediatamente 4 dos seus 28 caças. Ela encomendou 32 modelos de quinta geração americanos F-35 e 48 modernos FA-50 sul-coreanos, mas nenhum avião chegará nos próximos anos, o que explica sua cautela.
O Kremlin, previsivelmente, repetiu nesta sexta o que havia dito quando países da Otan anunciaram que iriam enviar tanques de fabricação alemã para Kiev no começo do ano. “É claro que, no curso da operação militar especial [eufemismo russo para a guerra], todo esse equipamento estará sujeito à destruição”, disse o porta-voz Dmitir Peskov.
Ele disse que os aviões não mudarão o rumo da guerra e que “parece que esses países estão engajados em se livrar de equipamento velho e desnecessário”, o que é uma verdade na prática. Mas, a depender do número de caças a serem entregues, isso muda.
O venerando bimotor Mikoian-Gurevitch MiG-29 foi introduzido em serviço na União Soviética em 1983, e amplamente exportado: é usado em 24 países ainda, inclusive em versões modernizadas na Rússia –na América Latina, apenas o Peru o opera.
A Ucrânia voa o MiG-29, poupando seus pilotos de treinamento que seria mais demorado com caças ocidentais. Antes da guerra, ela tinha 37 aviões do modelo, segundo o Balanço Militar. Ao menos 16 deles foram abatidos, segundo observação georreferenciada de imagens pelo site holandês Oryx. Os ucranianos também operavam 34 Su-27, mais modernos, 8 dos quais derrubados, mas todos esses números podem ser bem maiores.
Apoio aéreo é vital para as planejadas contraofensivas do meio do ano planejadas por Kiev. Até aqui, o Ocidente considerava o envio de caças um tabu, dado que pode ser considerado uma arma ofensiva contra o território russo e implica um envolvimento quase direto da Otan na guerra.
Estados Unidos e Alemanha, por exemplo, disseram na quinta (17) que não iriam mudar sua posição de não enviar os aviões -até porque empregam modelos mais sofisticados e caros, além da questão do demorado treinamento.
O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, elogiou os poloneses por continuarem a “bater acima de seu peso”. Varsóvia é a terceira maior doadora de material militar a Kiev, com US$ 2,4 bilhões enviados até janeiro, e também a terceira maior em porcentagem de seu PIB (0,9% empregados na guerra).
Como no ano passado Washington vetou a ideia polonesa de transferir todos seus MiG-29 para Kiev, a mudança agora e o anúncio eslovaco sugere que está sendo testada uma escalada gradual: primeiramente, serão dados aviões soviéticos mais antigos, restando saber como será feita a cobertura aérea dos doadores.
Além de Polônia e Eslováquia, na Otan a Bulgária tem 14 MiG-29 ativos. A Hungria, um membro ambíguo do bloco de 30 nações dada a boa relação com Putin, tem estocados 28 aviões sem condição de uso, mas que poderiam servir para serem canibalizados. E comum, todos esses países faziam parte do Pacto de Varsóvia, a Otan dos comunistas.
Um próximo passo pode ser o envio de caças menos avançados da Otan, como os modelos F-16 americanos operados por países como a Holanda e a Dinamarca, que já se disseram abertos a discutir isso enquanto modelos modernos encomendados não chegam. Novamente, tudo passa pela ideia de ter seus céus patrulhados por aviões de aliados, o que será lido em Moscou como mais um rompimento de linha vermelha.
Também nesta sexta, o Ministério da Defesa da Rússia disse que irá condecorar os pilotos dos dois caças Su-27 que interceptaram um drone americano MQ-9 Reaper sobre o mar Negro na terça (14) por “defender o espaço aéreo restrito da operação militar”. Vídeo captado pelo aparelho ocidental mostra que sua hélice foi danificada após um choque, quando os aviões russos passaram próximos aparentemente despejando combustível sobre eles.
No campo diplomático, o Kremlin disse estar disposto a finalizar as negociações para estender por 60 dias o acordo que permite a exportação de grãos ucranianos e russos pelo mar Negro, que vence amanhã. A negociação é mediada pela Turquia e pela ONU.
Por Igor Gielow, Folhapress
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