JOÃO GABRIEL
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “A cada dia que abrimos uma gaveta, encontramos uma surpresa negativa”, definiu Ronaldo, nesta terça-feira (11), sobre a análise que ele e sua equipe têm realizado a respeito da situação do Cruzeiro.
Na primeira entrevista que concedeu após anunciar a intenção de investir R$ 400 milhões e adquirir 90% das ações da SAF (Sociedade Anônima do Futebol) do clube, o ex-jogador afirmou que a dívida da instituição é maior do que ele esperava –“bilionária até, eu diria”. E confirmou que está prevista no pré-contrato a possibilidade de desistência.
“Tecnicamente, sim. No contrato, há essa saída”, afirmou, antes de dizer que o plano agora não é esse. “Está longe da minha cabeça e do meu pensamento desistir do projeto. No momento, estamos no processo de análise do clube: entender o tamanho do buraco, da dívida, entender os credores, enfim, muita coisa por entender ainda. Meu desejo é continuar”. “Nós encontramos um cenário realmente trágico no clube, mas temos que estancar o sangramento”, continuou.
Ronaldo afirmou que a primeira prioridade de sua gestão é o retorno à Série A do Campeonato Brasileiro. Segundo ele, o clube vive um momento de “ações impopulares, mas necessárias”, e levará ao menos um ano para começar a equilibrar as contas.
O ex-jogador afirmou que várias receitas dos próximos dois anos, como acordos de televisão, já foram antecipadas. E é justamente nos próximos dois anos que o clube precisa pagar R$ 140 milhões que deve a outros times. Essas dívidas têm pequena margem para negociação e, se não pagas, tornam a equipe impedida pela Fifa de fazer novas contratações. “Diria que o Cruzeiro é um paciente em estado grave, na UTI, e nós estamos oferecendo o tratamento necessário para que saia dessa condição”, completou.
Ronaldo anunciou a compra do Cruzeiro, clube que o revelou para o futebol, no dia 18 de dezembro do ano passado. Foi o primeiro clube-empresa a utilizar o modelo SAF (Sociedade Anônima do Futebol), aprovado pelo Congresso Federal também no ano passado.
Atualmente, há um contrato de intenção de compra. Mas está em curso um processo de análise da situação do clube, ao fim do qual não há garantia de que o negócio será concretizado. De qualquer maneira, já o ex-jogador quem dá as cartas, e sua gestão vem promovendo mudanças – o que já gerou também as primeiras crises. Desde que chegou, o ex-atacante viu um noticiário bem mais conturbado do que, por exemplo, o do Botafogo, clube que deve ser comprado pelo empresário John Textor.
Primeiro, a nova gestão cruzeirense estipulou um teto salarial para o elenco e mexeu na comissão técnica. Demitiu o então diretor de futebol, Alexandre Mattos, que nem sequer havia assumido o cargo oficialmente, e o treinador, Vanderlei Luxemburgo – ambos eram nomes escolhidos pela antiga administração. No lugar do primeiro, escolheu Paulo André, nome que não agradou parte da torcida; para a vaga do segundo, contratou o uruguaio Paulo Pezzolano.
Nada que tenha levantado a ira da torcida cruzeirense como a não renovação do contrato do goleiro Fábio, ídolo do clube. Na ocasião, houve protesto de torcedores contra a saída. O arqueiro de 41 anos estava havia 17 no clube e, prestes a completar mil jogos pela agremiação celeste, chegou a comemorar a chegada de Ronaldo. Houve, então, uma tentativa de renegociação do acordo apalavrado para a renovação do contrato, sem sucesso.
“A atual diretoria foi clara. Eles me disseram que qualquer outro cenário estava inviabilizado e que eu não faço parte do planejamento desportivo para 2022. Na reunião estavam presentes o diretor executivo Pedro Martins e Gabriel Lima representando a nova gestão”, disse o goleiro.
Nesta terça, Ronaldo apresentou outra versão. Segundo ele, foi oferecido “um período para o ídolo se despedir da torcida”. “O Fábio foi e vai ser sempre um ídolo para o Cruzeiro e a torcida. Nós, diante do cenário atual, fizemos um esforço muito grande para oferecer uma proposta decente para ele, respeitando sua história no clube e sua trajetória. Infelizmente, durante a negociação, houve uma negativa por parte dele, o que também nos pegou de surpresa”, afirmou.
Abrindo as gavetas do Cruzeiro, Ronaldo não achou dinheiro. E, sem descartar completamente a possibilidade de desistir da tarefa, busca soluções para reerguer a agremiação de Belo Horizonte. Desde que fechou o pré-acordo para a compra, o ex-jogador esteve na terça pela primeira vez nas dependências do clube. Uma infecção pela COVID-19 atrasou a primeira ida à Toca da Raposa 2, o centro de treinamento da equipe profissional. Depois de falar com jornalistas, ele deu atenção a sócios-torcedores. A eles repetiu que a situação não é fácil.