Especialista aponta que o fim dos empregos formais é uma realidade

Foto: MARCOS MALUF
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Com crescimento da informalidade e baixa qualificação, economista alerta para novas exigências do mercado

O conceito de estabilidade profissional está cada vez mais distante do que outrora era um modelo de sucesso. Para o mestre em economia Eugênio Pavão, a carteira assinada deixou de ser a principal referência de segurança financeira, dando lugar a um mercado marcado pela flexibilidade e múltiplas habilidades. “Antigamente, o ideal era passar a vida na mesma empresa, mas hoje a busca é por empreender e se adaptar rapidamente”, afirma. Contudo, Pavão alerta que, sem qualificação e estudo contínuo, esse cenário pode se tornar uma armadilha, à medida que o empreendedorismo surge mais como necessidade do que como escolha.

A preocupação do especialista encontra respaldo nos dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Em 2022, o número de pessoas ocupadas no Brasil alcançou 96,9 milhões, um crescimento em comparação a 2021, que registrou mais de 89 milhões. No entanto, a diferença entre trabalhadores com carteira assinada e empregados informais se estreitou consideravelmente, evidenciando a fragilidade do modelo CLT. Em 2014, a distância entre esses grupos era de 10 pontos percentuais; hoje, praticamente se equiparam.
A vulnerabilidade é mais acentuada entre os jovens de 14 a 17 anos e para a população acima de 60 anos, que apresentam os menores índices de ocupação, segundo o estudo. Durante a pandemia, o número de jovens de 15 a 29 anos que não estudava nem trabalhava chegou ao ápice de 28% do total, com um impacto ainda mais profundo para as mulheres, que representam 28,9% desse grupo, quase o dobro do percentual entre os homens (15,9%). Questões como cuidado com os filhos e afazeres domésticos continuam a afastar as mulheres do mercado de trabalho.

Segundo Pavão, essa inversão de valores também afeta a percepção sobre o ensino tradicional. “O valor de um diploma caiu. Hoje, é preciso se especializar constantemente para sobreviver profissionalmente. Muitos alunos, no entanto, estão mais preocupados em buscar informações prontas e rápidas, o que cria um problema de ‘desestudamento'”, explica. No ambiente de trabalho, essa falta de atualização e qualificação tem um impacto direto na empregabilidade.

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Iniciativas locais

Em Mato Grosso do Sul, a SEE (Secretaria de Estado de Educação) vem tentando reverter esse quadro por meio de programas que estimulam a formação técnica e a inserção no mercado de trabalho. Entre eles, o PAP (Programa de Aprendizagem Profissional), voltado para a qualificação de jovens entre 14 e 24 anos. A iniciativa, que começou como um projeto piloto em Três Lagoas, foi expandida para mais cidades e, atualmente, conecta estudantes de Campo Grande, Ribas do Rio Pardo, Chapadão do Sul e outras regiões do Estado a empresas interessadas em contratar jovens aprendizes. “O objetivo é preparar esses estudantes para o mercado de trabalho com todos os direitos previstos na CLT”, destacou a secretaria em nota.
Mas a educação sozinha não é suficiente para resolver o problema da empregabilidade, segundo a Funtrab (Fundação do Trabalho de Mato Grosso do Sul).

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A entidade aponta que, apesar do aumento de vagas em setores como bioenergia e celulose, a falta de profissionais qualificados é um obstáculo. “Quando novas empresas se instalam, como vimos recentemente em Ribas do Rio Pardo, há um desafio enorme para encontrar mão de obra apta para preencher as posições. Sem formação adequada, o desenvolvimento econômico dessas regiões pode ser comprometido”, afirma Luiz Eduardo Ferreira Rocha, diretor de relações de emprego da Funtrab.

Na tentativa de diminuir esse descompasso, a Funtrab lançou o programa MS Qualifica, que já capacitou mais de 13 mil pessoas em cursos específicos para atender às demandas locais. “A ideia é garantir que os trabalhadores estejam preparados para ocupar cargos que ofereçam salários mais elevados e promovam o desenvolvimento do Estado”, explica Marina Dobashi, diretora-presidente da fundação.

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Enquanto setores como o jurídico e o médico mantêm um controle de oferta para evitar uma desvalorização das remunerações, áreas como o comércio e a indústria enfrentam dificuldade para atrair talentos. “Isso gera um cenário contraditório: há vagas, mas faltam profissionais dispostos a ocupá-las, seja pela desvalorização dos salários, seja pela falta de perspectiva de crescimento. A expectativa de estabilidade, que era uma meta de vida, hoje já não se sustenta”, afirma Pavão.

Apesar desses esforços, o economista Eugênio Pavão acredita que o problema é mais profundo e exige mudanças estruturais na forma como se pensa o mercado de trabalho no Brasil. “Sem políticas públicas que incentivem o estudo e promovam uma requalificação contínua, muitos profissionais continuarão a se arriscar em empregos instáveis. Precisamos entender que o fim dos empregos formais não é uma fase temporária, mas uma nova realidade”, conclui o especialista.

Por Djeneffer Cordoba

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