Opções no transporte acirra competitividade e extingue antigos no ramo
Com a expansão dos aplicativos de viagens, os pontos de táxi espalhados por Campo Grande estão ficando no esquecimento. Enquanto uns estão vazios, outros estão depredados e com más condições de uso.
O jornal O Estado foi em dez locais e alguns dos problemas encontrados foram: pichação, vazamento, falta de energia e até fios expostos.
Foi possível perceber que, além da frota reduzida ou zerada, em decorrência da chegada dos aplicativos, o trabalhador se sente “abandonado” pelo poder público. Além de pagar uma série de impostos, as manutenções mensais dos pontos são retiradas do bolso do próprio trabalhador que, ao mesmo tempo, afirma não ter autonomia para fazer mudanças no local e precisa da aprovação do poder público.
De acordo com os dados disponibilizados pela Agetran (Agência Nacional de Transporte e Trânsito), atualmente, a Capital opera com uma frota de 491 mototáxi, sendo um total de 70 pontos fixos distribuídos pela Agetran em toda a cidade. Já os pontos de táxi totalizam 495 motoristas, em pelo menos 75 pontos espalhados pela Capital.
Dentre as exigências para se tornar um taxista e mototaxista, estão a apresentação documentos pessoais, contrato de adesão após ser aprovado no processo licitatório, certificado do curso de formação ministrado por órgãos autorizados pela Agetran, nada consta de antecedentes criminais, alvará, além de especificações de como deve ser o veículo conduzido, a exemplo, a cor, que deve ser branca em ambos os casos – carro ou moto, deve haver equipamento de segurança, além do veículo, que deve ter sido fabricado há pelo menos 5 anos.
Para os motoristas e mototaxistas, as exigências geram uma sensação de injustiça com a chegada dos aplicativos. Pois, ao passo que necessitam cumprir uma série de exigências em prol de manter o ganha-pão, visualizam os profissionais de aplicativos transitar pela cidade sem cumprir com as obrigações fiscais as quais os profissionais mais antigos são submetidos.
O presidente da Applic/MS (Associação de Parceiros de Aplicativos de Transporte de Passageiros e Motorista Autônomos de Mato Grosso do Sul), Paulo Pinheiro, explica que o trabalho exercido pelos taxistas é importante e fundamental. “São pioneiros e estão há décadas em Mato Grosso do Sul.”
No entanto, ao passo que afirma a importância dos profissionais, traz um olhar crítico à questão, ao justificar que é preciso ter lealdade nos preços. “Antes da concorrência, os mototaxistas e também taxistas cobravam valores absurdos da população e com as chegada dos aplicativos e outras plataformas, teve uma melhora, tanto que eles implantaram o mototaxímetro, onde o passageiro sabe quanto ele vai pagar verdadeiramente naquele percurso. O pessoal ganhava muito dinheiro explorando a população com tarifas caríssimas, corridas assim, sem condições, valores bem acima do que deveriam cobrar. Já com a concorrência, não, eles têm que cobrar o valor justo, porque se não eles vão ficar sem atender a população, sem fazer corridas”, avalia o presidente.
Impacto no dia a dia
Carlos Timóteo, 51 anos, mototaxista há 25, explica que iniciou na profissão por não se adaptar ao salário de empregado, então achou na profissão como autônomo uma alternativa. Na época, o profissional conseguia tirar de dois a três salários acima do que era obtido no comércio. Hoje, ele explica que não é assim e tem que se readaptar e trabalhar com os instrumentos que tem.
“Se você ficar só no mototáxi, hoje, você não consegue mais sobreviver. Eu faço entrega [particular] e faço Uber mesmo. Eu aderi ao Uber porque se eu ficasse só no mototáxi, eu não consigo sobreviver. A gente perdeu aquele contato de telefone, não tem mais. Hoje é tudo internet, acabou aquele contato de a pessoa te ligar e você ir buscar”, explica o profissional, que avalia uma queda no movimento de pelo menos 90%, com uma primeira quebra após a pandemia e a segunda com a expansão dos aplicativos.
Localizada no Ponto de Mototáxi da Praça Ary Coelho, na avenida Afonso Pena, Neide de Freitas, 58 anos, que é mototaxista há 22 anos, explica que o movimento caiu, inclusive pela migração dos profissionais, que desistem do táxi e partem para outras alternativas, como os aplicativos. “Em vez de a gente se unir, foi ao contrário, diminuiu. Os mototaxistas estão deixando o ofício para trabalhar em aplicativo”, argumenta ela.
O mototaxista Adalberto Citobal de Lima, 56 anos, na área há pelo menos 26 anos, explica que o movimento caiu pela metade com a chegada dos aplicativos. “A gente não fala aplicativo, chamamos eles de clandestinos. Porque quem não recolhe impostos para a prefeitura, como nós recolhemos, é clandestino. Eles estão à vontade. Nós temos três tipos de impostos que pagamos todo mês, fora cursos, aperfeiçoamento, primeiros socorros, direção defensiva, tudo isso nós fazemos”, pontua.
Um tour por cada ponto
No ponto de mototáxi localizado próximo ao shopping Norte Sul Plaza, no canteiro da rua Cubatão, as condições são as mais favoráveis dentre as estruturas encontradas pela reportagem. Feita em cimento, a casa que abriga as motos, estava vazia, sem nenhum profissional presente. O cuidador de carros e motos, Junir Cardoso Pereira, de 71 anos, que está há 10 anos no local, explica que depois da chegada dos aplicativos, o mototáxi ficou mais fraco.
“O Uber parece que é mais barato. Quando eu cheguei aqui, tinha uns quatro mototáxi, daí saíram e ficou somente dois e faz tempo que eles estão aí”, pontuou.
No ponto de mototáxi localizado entre a rua 15 de Novembro e a avenida Calógeras, o cenário era de total abandono, nenhum mototaxista se encontrava no local e havia pichação nas estruturas. Em outro ponto, na rua Doutor Anibal de Toledo, também não havia a presença de táxis e a pichação tomava conta.
No ponto de mototáxi do shopping Campo Grande, o descaso com o local é tamanho que além das pichações, a placa, na qual sinaliza o ponto, estava jogada no chão. Ainda no local, no próprio ponto, era possível perceber uma lona em três lados do toldo, possivelmente a fim de evitar a chuva dentro do ponto.
Nos dois pontos localizados na Praça Ary Coelho, as condições, embora se apresentem boas, no geral, possuem algumas problemáticas, como a presença de fios elétricos expostos e desordenados, o que pode apresentar um risco, caso ocorra algum problema no circuito elétrico. Um pouco mais à frente, na avenida Afonso Pena com a rua Rui Barbosa, no ponto de mototáxi há cadeados por todas as partes, até mesmo no televisor instalado. O cenário denuncia a situação cotidiana dos pilotos que, para proteger seus equipamentos de trabalho, precisam se precaver e recorrer a uma segurança improvisada por eles mesmos.
Por fim, no ponto de moto entregadores desativado, localizado ao lado do Atacadão da Costa e Silva, o cenário, além de não ser de preservação, com pichações e depredação, ainda apresentou sinais de arrombamento, onde uma caixa de metal foi aberta e dentro havia uma televisão em tubo preta.
Por – Julisandy Ferreira
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