[Texto: Suzi Jarde, Jornal O Estado de MS]
Mudanças na legislação receberam o apoio de produtores rurais
O projeto de lei 343/2023, também conhecido como Lei do Pantanal, traz consigo algumas regras de proibições, como a implantação de lavouras de soja, cana-de-açúcar, plantio de eucaliptos, cultivo de florestas exóticas, além da atividade de confinamento bovino. Isso porque, segundo o texto proposto, as atividades econômicas no Pantanal trazem risco à preservação do bioma.
Conforme o artigo 26, capítulo das disposições transitórias, na Área de Uso Restrito da Planície Pantaneira, para o confinamento bovino terá exceção casos de concentração temporária de gado em períodos de cheia ou de emergência ambiental. Os cultivos já consolidados e já implantados até a publicação serão mantidos, sendo proibida a expansão, mas haverá exigência de licenciamento ambiental.
O integrante do SOS Pantanal, Leonardo Gomes, explica que o processo foi analisado da maneira correta, consultando quem realmente conhece o Pantanal e que, apesar de não agradar a todos, o projeto visa a proteção das áreas ambientais. “Entendemos que um projeto de lei como esse nunca vai ficar perfeito para todas as partes interessadas. O mais importante é que foi feito um projeto que garante a preservação do meio ambiente. Nossa expectativa é que seja aprovado já na assembleia e em 2024 comece a regulamentação”, defendeu o representante.
A Lei do Pantanal é um projeto proposto pelo Governo do Estado de Mato Grosso do Sul, que defende a conservação, proteção, restauração e exploração ecologicamente sustentável do bioma. As regras vêm para alinhar o comércio de produtos agrícolas, para resguardar o bioma pantaneiro. Prática que, de acordo com economista rural, Staney Barbosa Melo, já vem sendo desenvolvida a um certo tempo, mas que com a lei, ocorre a regulamentação dessas ações.
Essa regulamentação vem para tentar conciliar preservação com a prática de um agronegócio cada vez mais sustentável, em um bioma que naturalmente é voltado para a atividade rural. A pecuária, por exemplo, foi responsável pela ocupação do Pantanal. É um espaço onde a bovinocultura encontra tudo de que necessita para se desenvolver de forma natural. Esse agronegócio mais sustentável que o texto desenha já é a realidade do bioma há muitos anos. O texto vem apenas para formalizar o que já é a realidade do bioma”, finaliza o especialista.
Apresentação da Lei do Pantanal na ALEMS
O presidente da ABPO (Associação Pantaneira de Pecuária Orgânica e Sustentável), Eduardo Cruzetta, participou da audiência pública, que ocorreu na quarta-feira (29), na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul e destacou alguns pontos essenciais para a Lei do Pantanal. Além do Fundo Clima Pantanal, em que o Governo de MS deve inserir cerca de R$ 40 milhões a R$ 50 milhões, Cruzetta destacou como ponto alto o Pagamento por Serviços Ambientais, que reconhecerá os pantaneiros que preservam suas áreas.
“Esse ponto, o do Pagamento para o Serviço Ambiental ser reconhecido em lei e ser criado um fundo específico para isso, que o Governo do Estado fará os primeiros aportes, com valor definido e origem de recursos definidos, isso é uma grande inovação e demonstra um entendimento muito moderno dessa real necessidade de valorizar a biodiversidade”, explica Cruzetta.
“Muito se fala no valor da biodiversidade, da natureza, da conservação ambiental, mas se isso tem valor, onde está a remuneração para isso? Nesse projeto de lei, a gente começa a ter isso de forma concreta, de forma prática, é uma grande inovação e tenho certeza de que isso deve atrair outros recursos, para remunerar, de fato, esse produtor de biodiversidade, que é o pecuarista”, completa.
O diretor-executivo do Instituto Taquari Vivo, Renato Roscoe, avaliou o processo de criação da Lei do Pantanal e comentou que o processo precisa ser valorizado, apesar da possibilidade de aprimoramento em determinados itens, o processo foi maduro, principalmente pela finalidade de manter a pecuária como aliada à preservação.
É preciso enxergar o Pantanal como um todo, de tal forma que a gente possa ter a pecuária, que é a atividade econômica mais relevante em termos de uso do território, como uma aliada da preservação ambiental. (…) Também é necessária uma forma de remunerar o pantaneiro por manter essas florestas em pé, manter esse bioma funcional para toda a sociedade”, completa o executivo. “E aí vem o princípio do pagamento por serviços ambientais, então a lei contempla toda uma forma de viabilizar a utilização econômica do Pantanal”, pontua.
Fundo Pantanal
Entre as novidades da proposta está a criação do Fundo Estadual de Desenvolvimento Sustentável do Bioma Pantanal, denominado Fundo Clima Pantanal, que prevê financiamento de Programas de Pagamentos por Serviços Ambientais. “Esse fundo já nasce com o compromisso do Governo do Estado de aporte inicial entre 40 milhões e 50 milhões de reais por meio da reorganização de outros incentivos fiscais”, informou o secretário- -executivo de Meio Ambiente do Estado, Artur Falcette, durante a apresentação do projeto, em audiência pública.
Segundo Artur Falcette, o Fundo Clima Pantanal também receberá recursos das multas aplicadas pelo Estado a infratores no Pantanal, sendo 50% dessas multas destinadas ao fundo, que, entre outras, terá a finalidade de receber recursos para promover os pagamentos por serviços ambientais aos pantaneiros que preservam suas áreas.
Vedações
O projeto veda o plantio de soja, cana-de-açúcar, eucalipto e quaisquer outras culturas exóticas ao meio, excetuando apenas àquelas áreas em que já está consolidado o plantio, que não poderão ser ampliadas nem rotacionadas e dependerão de licenciamento ambiental para o replantio. Falcette afirmou que, dos 9 milhões de hectares que compõem a planície pantaneira, cerca de 2,8 mil estão, atualmente, ocupados com soja, o que representa um percentual muito pequeno. Também estão fora da proibição o cultivo de gêneros alimentícios por agricultores familiares e de culturas não destinadas ao comércio, como forrageiras para o gado.
O licenciamento ambiental fica mais rigoroso com a exigência do EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental) para áreas a partir de 500 hectares. O projeto veda, também, a instalação de PCHs
(pequenas centrais hidrelétricas) e de novas carvoarias, sendo que as já existentes funcionarão apenas até o fim da vigência da licença ambiental atual. Da mesma forma, está proibido construir diques, barragens e drenos na Área de Uso Restrito do Pantanal.
Pantanal
O Pantanal ocupa um terço do território de Mato Grosso do Sul. Dos 15,1 milhões de hectares da área total do bioma, 9,7 milhões de hectares ou 64% estão em terras sul-mato-grossenses, conforme dados do Instituto SOS Pantanal. É a maior área úmida do planeta, reconhecida pela Unesco como Patrimônio Natural da Humanidade e Reserva da Biosfera.
Abrange cinco biomas: Cerrado, Chaco, Amazônia, Mata Atlântica e Bosque Seco Chiquitano. E abriga pelo menos 4.700 espécies, sendo 3.500 espécies de plantas, 650 de aves, 124 de mamíferos, 80 de répteis, 60 de anfíbios e 260 espécies de peixes de água doce.
Ao detalhar a proposta com a Lei do Pantanal, o governador do Estado, Eduardo Riedel, relembrou que atualmente 84% do Pantanal existente está preservado, muito pelo empenho do homem pantaneiro, que alia a pecuária sustentável ao bioma há mais de 300 anos, mas que a nova lei vai regulamentar o que e onde poderá ter produção, tanto da pecuária quanto da agricultura.
“Muito da preservação se deve às comunidades que moram lá, mas a expectativa é regulamentar, com base em dados da ciência, para deixar bem definido o que pode e o que não pode. A lei traz esse mecanismo. O Pantanal tem
mais de 9 milhões de hectares e só 2.800 hectares de plantio de soja. Então vamos regulamentar as culturas possíveis, não mexendo com o passado, mas olhando para o futuro, de forma a manter e valorizar as comunidades já instaladas por lá”, destacou.