[Texto: Julisandy Ferreira, Jornal O Estado de MS]
Essa é a primeira retração na Selic desde agosto de 2020
A queda na taxa de juros, mesmo que ainda seja “tímida”, já tem mexido com a confiança de, pelo menos, três setores da economia em Mato Grosso do Sul, que se demonstraram mais otimistas. Na quarta-feira (2), o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC (Banco Central) baixou a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, saindo de 13,75% ao ano para 13,25%.
Esse foi o primeiro corte desde agosto de 2020, quando os juros foram reduzidos de 2,25% para 2% ao ano.
O jornal O Estado conversou com representantes de três entidades voltadas ao comércio, banco e construção para saber a expectativa quanto ao novo cenário. Segundo o presidente da Acomasul (Associação dos Construtores de Mato Grosso do Sul), Diego Canzi, ainda com a baixa, o impacto econômico é pequeno. No entanto, a sinalização deixa o mercado mais otimista.
“Continuamos com uma taxa acima dos 13%, o que, por si só, deixa o custo do dinheiro e, consequentemente, os juros, a níveis insustentáveis, inviabilizando qualquer financiamento. Porém, a sinalização de baixa é um fator que deixa o mercado mais otimista diante da necessidade de se ter acesso ao crédito em patamares mais acessíveis. Isto só vai ocorrer quando tivermos uma taxa Selic na metade do que temos hoje”, observou.
Conforme a última pesquisa, divulgada em junho, o Icec (Índice de Confiança do Empresário do Comércio) registrou redução em Campo Grande. O índice alcançou 110,2 pontos, ante os 119,0 de
maio. De acordo com a pesquisa, 40% dos entrevistados afirmam que a expectativa para o comércio é “melhorar muito” e para outros 38,2, “melhorar um pouco”.
Acesso ao crédito
A presidente do SEEBCG-MS (Sindicato dos Bancários de Campo Grande-MS), Neide Rodrigues, afirma que está otimista pela categoria e pela população, pois a queda da taxa é importante para o setor. Ela acredita que a demanda por casa própria pode melhorar.
“Com certeza teremos uma grande demanda para financiamento da casa própria, um sonho do brasileiro. Financiamento de veículo, financiamento em geral, aquecimento do mercado e geração de empregos. É importante também associar a queda do desemprego, ocasionada pelas políticas econômicas do governo federal. Para melhorar, é essencial a queda dos juros, de modo que a sociedade em geral ganhe”, destaca a presidente.
O presidente da CDL-CG (Câmara de Dirigente Lojistas de Campo Grande), Adelaido Vila, explica que os juros altos e a ausência de crédito têm afugentado os consumidores. “Nos últimos meses,
temos visto aumentar as dificuldades dos consumidores em consumir. As decisões de compra têm sido pautadas por produtos do consumo básico. O consumidor está bastante cauteloso e isso provoca uma paralisia em todo o setor varejista. Sem a redução dos juros muitos setores do varejo tendem a não suportar”, lamentou o presidente.
Segundo Adelaido, no decorrer dos anos é possível perceber uma perda considerável no poder de compra, pois o consumidor da atualidade opta, na maioria das vezes, pelo parcelado ou para pagar depois, no mês subsequente. “Quando você tem uma restrição de crédito e juros muito altos, acaba não compensando. A pandemia trouxe uma conscientização para o consumidor, que deixou de comprar por impulso, ele não compra mais por impulso, ele compra dentro de um planejamento. Ele tem medo de não conseguir pagar ou ficar inadimplente, até porque o Brasil bate recorde de inadimplência”, finaliza Adelaido Vila.
Impacto
O economista Eduardo Matos explica que a Selic é uma taxa referencial e não a taxa realmente praticada. A queda muda, sobretudo, a referência como os tomadores de crédito se baseiam na hora de calcular os custos, o que gera diversos impactos para inúmeros setores.
“O setor produtivo, hoje, carece de grandes investimentos físicos. Com a queda da taxa, vai ser possível, novamente, realizar esses investimentos. A indústria está precisando trocar seu maquinário, e essa queda pode gerar ganho de produtividade para o setor industrial. Quanto a outros serviços, a agropecuária, por exemplo, a taxa referencial vai ajudar, mas o agro já consegue caminhar com as próprias pernas, então, não terá grande impacto. Já nos serviços será possível ampliar a capacidade e, indiretamente, impactar o mercado de trabalho”, explica Matos.
Ainda de acordo com o profissional, as mudanças não ocorrem de forma instantânea e, num primeiro momento, é possível esperar uma mudança nos custos de crédito, que ficarão mais baratos. Já para o próximo ano, é provável um cenário mais favorável. “Para 2024, podemos esperar investimentos e com isso gerar outros frutos, como aumento da renda ou do emprego. Também não é algo certo, mas o aumento da produtividade deve vir com isso”, pontua.
Na visão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a tendência é que a mudança oportunize melhores condições para 2024. “A taxa acima da inflação, projetada para o ano que vem, está em 10%. Então, nós temos um espaço importante para a queda da taxa básica e, quando cai a taxa básica de juros, o que certamente começará a acontecer hoje, haverá uma perspectiva de diminuição dos juros futuros, o que implica que as empresas vão começar a captar mais barato e, ao final, isso vai acabar chegando no consumidor”, destacou.
A taxa de juros é uma referência para o custo das linhas de crédito. Quando é elevada, a tendência é de que empréstimos e financiamentos fiquem mais caros. Já quando diminui, o crédito melhora.
Com isso, quando os empréstimos e financiamentos ficam mais caros, consequentemente, o nível de consumo tende a diminuir. Quando é o contrário, o consumo tende a aumentar.
O cenário também impacta nos investimentos. É o caso dos títulos públicos do governo federal, dos tradicionais CDBs emitidos pelos bancos, das letras de crédito, das debêntures, dentre outras opções. Acesse também: Volatilidade dos preços das commodities ameaça agricultura de MS