Há 80 anos atrás, nascia o “síndico” mais amado do Brasil

Foto: Reprodução/Folhapress
Foto: Reprodução/Folhapress

Se estivesse vivo, Sebastião “Tim” Rodrigues Maia completaria 80 anos de idade, nesta quarta-feira (28). Tim Maia, como era popularmente chamado, foi um dos responsáveis pela introdução dos gêneros soul e funk na MPB (Música Popular Brasileira).

Conhecido por sua simpatia, o cantor também foi conhecido como o “Síndico do Brasil”. O apelido surgiu foi dado por Jorge Ben Jor, graças à canção W/Brasil. Na música, o colega de Tim Maia fala que se o Brasil fosse um prédio, o soulman brasileiro seria o síndico.

Com o intuito de homenagear o “aniversário” de 80 anos, a nova série documental do Globoplay, “Vale Tudo com Tim Maia”, estreia nesta quarta-feira, com detalhes inéditos da vida pessoal e artística do compositor carioca.

Dividida em três episódios, a série traz o próprio Tim narrando sua trajetória, quase sempre num tom bem-humorado, cheio de piadas a contar sobre suas dores e conquistas. Com direção de Nelson Motta e Renato Terra, a série mostra ainda como Tim Maia se tornou o pai do soul brasileiro e traz detalhes da composição de alguns dos seus maiores hits, que explodiram na década de 1970, com misturas de R&B, funk, soul e MPB.

Primeiros passos e influências musicais

Rua Afonso Pena, 24, coração da Tijuca, bairro da zona norte do Rio de Janeiro. Esse foi o endereço de infância de Tim Maia, que em tenra idade já demonstrava aptidão musical. Por volta dos sete anos, o menino compunha suas primeiras músicas.

Em 1956, formou o seu primeiro conjunto musical, Os Tijucanos do Ritmo, no qual assumiu o papel de baterista. O grupo tinha fortes influências de artistas como Trio Los Pancho, Sonora Matancera e Perez Prado. O conjunto não durou por muito tempo após uma discussão e quebra de um violão.

Em 1957 forma o grupo Sputniks, com Roberto Carlos e Erasmos Carlos. O nome da banda foi inspirado no recém-lançado satélite artificial Sputnik – invenção soviética, que inaugurou a corrida espacial contra os estadunidenses.

No início, o grupo tocava em salões paroquiais da região, mas logo conseguiram se apresentar no programa Clube do Rock, de Carlos Imperial, exibido na extinta TV Tupi. O repertório era composto por músicas clássicas do rock ‘n’ roll, como “Tutti Frutti”, “Long Tall Sally” e “Little Darlin’”.

Entretanto, o que os três meninos da Tijuca – Erasmo, Tim e Roberto – queriam muito, era fazer parte da turma da bossa nova, que estava em ascensão. O sonho era poder cantar em português, canções novas, sem copiar cantores americanos, com músicas de três acordes.

Naquele contexto, a Bossa Nova crescia no Rio de Janeiro. Mas o grupo, liderado por João Gilberto e Ronaldo Bôscoli, era restrito e elitizado. Composto por garotos brancos de classe média, da Zona Sul, que se achavam donos da bossa e desprezavam tudo que se passava longe da praia de Copacabana. Para eles, naquele momento, só restaria a Tijuca e os três acordes do rock.

Sonho americano, sucesso e Cultura Racional

Com a morte de seu pai e a dissolução do trio Sputnik, o tijucano vislumbrou uma oportunidade de se mudar para os Estados Unidos. Em 1959, com 16 anos de idade, ele partiu em busca do sonho americano.

Lá, era conhecido por “Jim”. Conseguiu aprender inglês e entrou em contato com a soul music, chegando a participar de um grupo vocal, o The Ideals. No grupo, Tim Maia co-escreveu com o líder Roger Bruno a canção “New Love”, que gravariam em um compacto com a participação do percussionista Milton Banana e do contrabaixista de jazz Don Payne.

Quatro anos mais tarde, com 21 anos de idade, o cantor foi deportado de volta para o Brasil, preso por roubo e posse de drogas.

Sua produção artística só alcançou o auge em repercussão, na década de 1970. Naquele ano, gravou seu primeiro álbum, “Tim Maia, na Polydor”, por indicação da banda Os Mutantes. Nesse disco, obteve sucesso com as faixas “Azul da Cor do Mar”, “Coroné Antônio Bento” (Luís Wanderley e João do Vale), e “Primavera” e “Eu Amo Você” (ambas de Cassiano e Silvio Rochael).

Nos três anos seguintes, com a mesma gravadora, lançou os discos Tim Maia Volume II, tornando-se cada vez mais famoso com canções como a dançante “Não Quero Dinheiro (Só Quero amar)”, na era disco; Tim Maia volume III e Tim Maia volume IV, no qual se destacaram “Gostava Tanto de Você” (Edson Trindade) e “Réu Confesso”, ambas misturando a soul music com o samba.

Entre julho de 1974 e setembro de 1975, foi adepto da doutrina filosófico-religiosa conhecida como Cultura Racional. Nesse período, sua cosmovisão era refletida na composição dos seus dois discos lançados, com músicas como “Que Beleza” e “O Caminho do Bem”. No entanto, mais tarde, desiludiu-se com a doutrina e voltou ao seu estilo de música anterior, lançando sucessos como “Descobridor dos Sete Mares” e “Me Dê Motivo”.

Foi um dos primeiros artistas independentes do Brasil, com músicas foram gravadas sob a editora Seroma e a gravadora Vitória Régia Discos. Na década de 1990, diversos problemas assolaram a vida do cantor: problemas com as Organizações Globo e a saúde precária, devido ao uso constante de drogas ilícitas e ao agravamento de seu grau de obesidade. Sem condições de realizar uma apresentação no Teatro Municipal de Niterói, saiu em uma ambulância e, após duas paradas cardiorrespiratórias, morreu em 15 de março de 1998.

A série “Vale Tudo com Tim Maia”

De acordo com os produtores de “Vale Tudo com Tim Maia”, a série traz trechos de entrevistas antigas e vídeos inéditos do cantor trazem relatos dele sobre a efêmera banda Sputniks, os furtos de comida que cometeu nos Estados Unidos, a vez em que foi deportado de lá, sua vida sexual e seu dom para a “cornologia”, termo que usava para falar das vezes em que foi traído.

Nessa toada, há também comentários de Tim sobre o preconceito que teria sofrido por ir na contramão da bossa nova, numa estética agitada e suingada, passando longe dos violões de calmaria e vocais suaves do movimento. “Eu fui mais discriminado pela rapaziada jovem do que pelos ‘bossanoveiros’. Eles aceitavam”, diz ele, numa entrevista que deu a Branco Mello, dos Titãs.

Outros episódios de preconceito que Tim teria sofrido também são mencionados na série. Segundo o cantor, por ser negro e gordo, ele pouco atraía a atenção das mulheres, história bem diferente da vivida pelos seus amigos brancos e magros como Roberto Carlos e Erasmo Carlos, conta ele em entrevistas.

Um dos temas mais explorados pelos episódios é a fama do cantor de não comparecer a shows e programas de TV – e várias vezes, sem aviso prévio. Ora ele argumentava cansaço, ora que não estava sendo bem pago por isso, mas sempre era criticado, chegando até mesmo a ser punido pela TV Globo, que retirou o músico da trilha de uma novela após ele dar bolo em Faustão.

Parte sutil da relação de Tim com drogas também surge na série. Facetas mais controversas do cantor, no entanto, ganham pouco destaque e algumas ficam de fora. Há somente um curto trecho sobre os muitos processos trabalhistas que recebeu durante a carreira.

A acusação de ter agredido Janaína, mulher que namorou, nem sequer é mencionada. “O Tim não sai da série com uma imagem heroica. Ele é o herói da série”, diz Motta, que é jornalista, produtor musical e autor da biografia “Vale Tudo – O Som e a Fúria de Tim Maia”. O jornalista também argumenta que o intuito da obra não é explorar fatos já comentados pela mídia. “Quem quiser saber mais da vida dele, das complicações judiciais e das brigas tem outros meios. Não teria graça ver ele falando de 105 processos”, complementa.

Acesse também as redes sociais do O Estado Online no Facebook Instagram.

Leia também:

Campão Cultural terá hip hop para crianças e dança sul-africana

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *