Juíza não respeita prazo e exige presença de advogada com filho recém-nascido em audiência

Arquivo pessoal
Arquivo pessoal

Uma advogada de 36 anos do Jardim Veraneio (região leste da Capital) luta para que seu direito de aproveitar a maternidade seja mantido, conforme diz a legislação brasileira. Isso porque, exatos 30 dias após o nascimento de seu filho, uma juíza decidiu que ela tem de participar de uma audiência virtual de um de seus clientes, expondo uma interpretação errônea do que diz o CPC (Código do Processo Civil).

Era para ser um momento único para Juliana da Cruz Terra, mas as circunstânceas vão fazer ela relembrar para sempre do nascimento de Otto, seu único filho até aqui. Não necessariamente algo positivo.

Sem dormir direito e amamentando, Juliana foi informada pela magistrada de um caso da qual é responsável que deveria voltar ao trabalho hoje (1). Ou seja, exatos 30 dias após o parto – ocorrido em 30/4. Ela tentou adiar a audiência, mas teve o pedido recusado tanto pela juíza do caso, quanto pela defesa da outra parte envolvida.

“Não tem jeito, vou ter que partricipar da audiência remota com um bebê de colo, talvez até amamentar”, disse Juliana, ao O Estado. “Tenho escritório próprio, não tenho sócio ou alguém que possa me substituir.”

A instrução no processo foi clara: a juíza Patrícia Kelling Karloh respondeu o pedido da defensora explicando o artigo 313 do CPC. Mas o problema é que a lei mudou.

Segundo Ildália Aguiar, conselheira estadual da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil de Mato Grosso do Sul) e advogada atuante no direito das famílias, o CPC dá sim prazo de 30 dias para as advogadas mães, mas os chamados ‘dias processuais’, ou seja, os úteis apenas, sem contar finais de semana e feriados.

No caso de Juliana, como a criança nasceu em uma sexta-feira, o prazo começaria a contar no último dia 3 e ela poderia voltar às audiências somente no dia 14 de junho.

“Toda advogada, com o parto ou adoção, quando for a única patrona da causa, pode solicitar a suspensão de prazos processuais por 30 dias (contado como dias úteis – podendo requerer a suspensão, ou a devolução do prazo.

Contados a partir da data do parto ou da concessão da adoção, mediante apresentação de certidão de nascimento ou documento similar que comprove a realização do parto, ou de termo judicial que tenha concedido a adoção, desde que haja notificação ao cliente “, explicou.

O Plano de Valorização da Mulher Advogada, foi criado em 2015, instituiu como diretriz para o Sistema OAB a fixação de um valor diferenciado, para menor, ou isenção na cobrança da anuidade da mãe no ano do parto ou da adoção, ou no caso da gestação não levada a termo, a critério de cada seccional.

“Informe-se na sua Seccional ou na Caixa de Assistência da sua Seccional.

A Lei nº 13.363/2016 alterou o Estatuto da Advocacia e também trouxe avanços importantes, assegurando direitos às advogadas gestantes, lactantes e no período pós-parto ou adoção, visando justamente garantir às mulheres condições que lhe permitam conciliar a maternidade com o exercício da advocacia, dando efetividade à equidade de gênero”, completou Ildália.

“Eu poderia burlar isso com um laudo médico, que atestasse que eu estava deprimida, estafada, mas eu achei uma desonestidade. Ddcidi encarar a questão”, disse Juliana.

Por meio de Ildália, a OAB ajudará Juliana na questão. O Tribunal de Justiça do Estado não respondeu os questionamentos da reportagem até a conclusão desta edição.

“Falamos do Plano de valorização da mulher advogada (criado em 2015), instituído justamente por conta das dificuldades de conciliação de duplas para as mulheres advogadas que são mães. Principalmente nesse início quando se busca estabelecer uma rotina de cuidados em relação ao recém-nascido. É certo que o trabalho de defesa das prerrogativas da mulher advogada é ao mesmo tempo um instrumento de valorização da advocacia como também é uma ação afirmativa de enfrentamento à desigualdade de gênero no exercício profissional”, disse Ildália, que criou a Comissão do Direito das Famílias e Sucessões da OAB local em 2017.

Em âmbito nacional, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) avaliou somente no ano passado 132 pedidos de advogados reclamando do agendamendo de audiências durante o período pós-nascimento de seus filhos ou de adoção. O STF (Supremo Tribunal Federal) tem em pauta 13 decisões sobre o assunto. Não há dados regionalizados por estado dessa questão.

“Os direitos que a lei visa proteger são legítimos; contudo, a lei, tal como editada, tem a marca da irracionalidade. Não há dúvida de que os advogados e principalmente as advogadas que se tornam mãe merecem toda a proteção do Estado-legislador e juízo. A lei, como está posta, no mínimo compromete o direito das partes e de seus advogados a uma duração razoável do processo. Cabe a nós juristas sugerirmos os pingos que os julgadores devem colocar nos “is”; o tempero que deve ser ministrado à literalidade da lei”, disse Elpídio Donizetti, mestre em Direito Processual Civil pela PUC/MG, jurista, professor e advogado e membro da Comissão de Juristas do Senado Federal responsável pela elaboração do anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. (texto: Rafael Ribeiro)

OS DIREITOS DA ADVOGADAS MÃES

1. Isenção total ou parcial da anuidade no ano do parto ou adoção
O Plano de Valorização da Mulher Advogada, foi criado em 2015, instituiu como diretriz para o Sistema OAB a fixação de um valor diferenciado, para menor, ou isenção na cobrança da anuidade da mãe no ano do parto ou da adoção, ou no caso da gestação não levada a termo, a critério de cada Seccional.

Informe-se na sua Seccional ou na Caixa de Assistência da sua Seccional.

A Lei nº 13.363/2016 alterou o Estatuto da Advocacia e também trouxe avanços importantes, assegurando direitos às advogadas gestantes, lactantes e no período pós-parto ou adoção, visando justamente garantir às mulheres condições que lhe permitam conciliar a maternidade com o exercício da advocacia, dando efetividade à equidade de gênero.

2. Não passar pelo Raio X

Toda advogada gestante tem o direito de ter sua entrada permitida em tribunais sem ser submetida a detectores de metais e aparelhos de Raios X. (art. 7º-A, I, a, EAOAB)

3. Vaga especial de estacionamento

Toda advogada gestante tem direito à vaga especial de estacionamento gratuita nos fóruns dos tribunais. ( art. 7º-A, I, b, EAOAB)

*Equiparada à portadora de necessidade especial, de mobilidade reduzida e temporária, pela Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a mulher gestante deve requerer o cartão para estacionamento em vaga especial junto à Secretaria de Mobilidade Urbana de sua cidade.

4. Suspensão de prazos processuais a partir do parto ou adoção

Toda advogada, com o parto ou adoção, quando for a única patrona da causa, pode solicitar a suspensão de prazos processuais por 30 dias (contado como dias úteis – podendo requerer a suspensão, ou a devolução do prazo.

Contados a partir da data do parto ou da concessão da adoção, mediante apresentação de certidão de nascimento ou documento similar que Comprove a realização do parto, ou de termo judicial que tenha concedido a adoção, desde que haja notificação ao cliente. (art. 7º-A, IV, EAOAB)

*O mesmo direito de suspensão assiste o pai, pelo prazo de 8 (oito) dias nos mesmos termos.

5. Preferência em sustentações orais e audiências

Toda advogada gestante, lactante, adotante ou que deu à luz tem preferência na ordem das sustentações orais e das audiências, mediante comprovação de sua condição. *Durante o período de amamentação até 120 dias. (Art. 7º-A, III, EAOAB)

6. Direito à creche Toda advogada gestante, lactante, adotante ou que deu à luz tem direito à creche, quando disponível, ou a local adequado para as necessidades do bebê pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias. (Art. 7º-A, II, EAOAB).

Fonte: Ildália Aguiar

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