Damares diz que “é pouco” culpar álcool por problemas em aldeias

Aldeias

Ministra também prometeu rigor no trabalho contra crimes de violência contra mulheres indígenas

A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, afirmou que “é pouco” culpar o vício de alguns indígenas em bebidas alcoólicas pelos problemas apresentados nas aldeias, durante audiência pública realizada ao lado de autoridades federais, estaduais e do próprio município na tarde de ontem (26), em Dourados (a 233 km de Campo Grande).

Para a ministra, é preciso combater a questão do alcoolismo em toda a sociedade. “A gente tem de começar combatendo álcool na área urbana também. Por que que a gente não tem de fazer uma campanha grande? Sobre o consumo excessivo de álcool? Os jovens estão tendo acesso cada vez mais cedo a álcool, cada vez mais cedo a outras drogas, ao tabaco. E tem até gente que quer liberar maconha no Brasil. Olha a cabeça. Vamos ter de fazer um enfrentamento a uso abusivo de álcool não só em aldeias, então a gente tem de começar a colocar a culpa em tudo, porque só no índio que está bebendo é muito pouco pra mim. A gente vai ter de fazer o enfrentamento aqui em cima, fazer o enfrentamento de verdade, o álcool chegou lá, mas a culpa foi dele (do indígena)? Vamos ver onde é que nós erramos pra permitir que o álcool chegasse”, disse.

Inicialmente, conforme a sua própria assessoria informou, a ministra faria uma visita às aldeias Bororó e Jaguapiru. Mas o evento acabou realizado no teatro municipal local, sob a alegação de que a chuva inviabilizaria a presença de Damares onde nasceu, cresceu e morreu Raíssa da Silva Cabreira, 11 anos, jogada de uma altura de 20 metros após sofrer um estupro coletivo, no último dia 9.

Cinco acusados pelo crime foram detidos pela polícia. Três deles são adolescentes. Um dos adultos, Elinho Arevalo, 34, era tio da vítima e a estuprava desde que ela tinha 5 anos. No último dia 12, ele se suicidou na cela da Penitenciária Estadual de Dourados, onde estava preso.

Segundo a polícia, Raíssa e seus agressores estavam consumindo bebidas alcoólicas. Levantamento de especialistas em saúde indígena apontam que cerca de um em cada cinco dos quase 20 mil habitantes das reservas indígenas de Dourados tem algum tipo de vício.

Presente na reunião, o capitão Galdêncio Benítez, líder da Aldeia Bororó, disse que está cansado de reuniões com autoridades. “Sempre se fala que são enviadas verbas e nossa situação é de abandono constante”, disse, durante sua fala. Os indígenas pedem que um conselho criado, por eles, tenha contato direto com Brasília (DF) para fiscalizar e encaminhar os recursos.

“Isso é uma situação que nós recebemos apenas hoje, que muita coisa não tá chegando nas aldeias aqui. Existem os meios de controlar isso, Ministério Público, parlamento, vamos se debruçar sobre isso. O que está acontecendo? Não está chegando mesmo na ponta? Então nós aqui estamos recebendo todas as informações e vamos sentar junto com os órgãos de controle e entender o que acontece de fato para o nosso indígena. Há anos comitivas são feitas pra poder solucionar os problemas dos irmãos. Mas nesses anos eu não estava na comitiva, não era ministra. É um novo tempo, é um novo momento, são novas parlamentares, é uma nova ministra, é um novo governo que chega de violência contra a mulher e contra a criança indígena”, disse Damares.

Sobre o caso de Dourados, a ministra disse que, pelo fato de as aldeias serem praticamente dentro do perímetro urbano, as soluções passam pela integração deles à sociedade.

“A gente quando fala em direitos humanos, tem de entender que ter água encanada e saneamento básico está integrado nisso. Muitos dos problemas que eu digo estão sendo resolvidos, com urbanização, energia elétrica, água potável. Isso tudo também é violência contra a mulher. A falta desses serviços também é violência contra a mulher. E é por isso que esse ministério lida com tudo. Porque nós tamo fazendo essa verdadeira leitura do que é direitos humanos no Brasil”, disse.

Ainda em sua fala, Damares lembrou da acusação da revista “Época” em 2019 de que sequestrou a filha, atualmente com 21 anos, e da etnia kamayurá, de uma aldeia do Xingu, no vizinho Mato Grosso. “Eu ainda não fiz isso. Mas sou capaz de tudo para defender uma criança indígena. Faço qualquer coisa por ela. Inventaram essa mentira sobre minha filha, que agora vai voltar para ajudar o povo dela”, disse.

Bastante emocionada, Damares lembrou de sua própria tragédia para pedir desculpas à Raíssa. “Eu sei o que é essa dor. Nunca se esquece. Não tem remédio. Eu fui vítima de abuso quando tinha 8 anos. Tem noites em que eu me lembro do rosto do meu agressor, do cheiro ele. É uma coisa horrível. E eu desejava morrer. Desculpe, Raíssa, por chegar atrasada. Por chegar tarde demais. Agora estamos aqui. E vamos caçar qualquer um que cometa violência contra uma criança. Contra uma criança indígena”, disse.

(Texto: Rafael Ribeiro)

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