À mercê do tempo, construções que antes serviam como moradia e comércio agora são abrigo para a criminalidade
Moradores e comerciantes se queixam da falta de segurança e perda da beleza no centro de Campo Grande, ao longo dos anos. Um levantamento da PM (Polícia Militar) revelou que existem 291 imóveis abandonados na região central da Capital. Em uma pesquisa, o jornal O Estado ouviu a opinião da população sobre a situação desses locais.
Comerciantes que atuam há décadas no centro relatam os transtornos vividos diariamente no local. O barbeiro Carlos Bittar, por exemplo, trabalha na região há muitos anos e convive com o abandono de imóveis vizinhos. “Tem que procurar os donos dos imóveis e pressionar eles, pelo menos na limpeza. Esses imóveis servem para os viciados e moradores em situação de rua se acomodarem. É bem perigoso, principalmente à noite”.
Carlos contou que os invasores se escondem nos imóveis e praticam furtos na região. “Eles roubam fio, filtro, o que tiver mais fácil. O que der oportunidade, eles levam. Eles roubam muito por aqui, quase todos os dias tem roubo. Reforço que estamos no centro da cidade, isso não deveria acontecer com facilidade. A minha loja ainda não foi alvo, mas eu temo por isso. Já invadiram aqui do lado várias vezes, bem como o comércio na frente, que por conta disso tiveram que reforçar a segurança, colocaram ferro em cima do telhado e câmeras. E foram dias consecutivos, o que torna tudo pior”, relatou.

Esses imóveis servem para os viciados e moradores em situação de rua se acomodarem. – Carlos Bittar Barbeiro da região Central / Foto: Roberta Martins
O barbeiro reforçou também que a insegurança está forçando o fechamento de comércios na região. “Quase todas as lojas já foram furtadas, muitos fecharam por causa disso. Esse do lado era um bar, fechou. O outro também. Quando tem imóvel abandonado, o pessoal desiste. E é bom falar isso, que tem lojas fechando por causa disso. Eles [invasores] entram por cima, por onde der. Fica difícil continuar”.
Outro comerciante, Odimar Siqueira, dono de uma selaria de 65 anos de história, localizada na Avenida Calógeras, disse que atua no local há 52 anos e vê a degradação do Centro com preocupação. “Não traz benefício nenhum para a nossa cidade, porque são imóveis abandonados. Os donos mesmo não procuram arrumar nada. Aqui do lado tem vários em situação difícil. A prefeitura tinha que ter uma lei para prevenir e solucionar esses problemas. Não adianta tombar e não cuidar. Vai acabar virar uma favela, ou um centro fantasma. Triste a situação!”.

Os donos mesmo não procuram arrumar nada. Aqui do lado tem vários em situação difícil – Odimar Siqueira Proprietário de Selaria / Foto: Roberta Martins
Dimas, como é conhecido, defende que haja incentivo para a reforma desses imóveis e criticou o abandono por herdeiros que não demonstram interesse. “A maioria [dos imóveis] já está na terceira geração de herança e eles não estão nem aí, abandonam mesmo. E esse prejuízo fica para quem? Para a cidade. Vai virar um centro abandonado. A gente tenta continuar trabalhando, mas tem árvores nascendo dentro dos imóveis, rato, mosquito, que acabam vindo tudo para a nossa propriedade”
Complementando seu ponto de vista, relatando a falta de estrutura e segurança no Centro, Dimas pontua que ao redor do comércio as pessoas usam drogas ilícitas ao ar livre e sem medo. “Aqui do lado virou fumódromo de crack”. Segundo ele, mesmo com ações da polícia, é difícil conter as invasões. “Eles invadem pelo fundo, fazem depósito de droga. A polícia faz o que pode, mas é difícil. A gente tampa com tijolo na frente, mas eles entram por trás”.
Flávio Basso, morador da região, destacou a inutilidade dos imóveis abandonados. “Acho que deveria passar por uma função social. Fazer um acordo com os donos ou os órgãos públicos e reformar. Um imóvel parado poderia estar sendo útil para outras pessoas e também poderia ser usado para outros fins”.
Projeto quer transformação
Em entrevista ao jornal O Estado, o vereador André Salineiro (PL) destacou os riscos causados por esses espaços ociosos e cobrou ações do poder público para reverter a situação.
“Esses imóveis acabam sendo ocupados por moradores de rua, muitos são usados para esconder produtos furtados e também se tornam focos de proliferação do mosquito da dengue. É uma situação que prejudica o comércio, os moradores e quem transita pela região”, afirmou Salineiro.
Segundo o parlamentar, a falta de definição sobre a titularidade dos imóveis, sejam públicos ou particulares, dificulta a adoção de medidas mais eficazes. Por isso, ele encaminhou um ofício à prefeitura solicitando informações detalhadas sobre a lista de imóveis catalogados pela PM.

Foto: Roberta Martins
“Não sabemos quais são públicos e quais são privados. A primeira medida que tomei foi pedir à prefeitura essa relação. Imóvel público não pode ficar sem destinação, ou no mínimo, deve ser cuidado, zelado, para evitar que seja invadido e se torne abrigo para criminosos ou foco de doenças. Precisamos agir com estratégia para revitalizar o Centro e garantir mais segurança e saúde para todos”, explicou.
Salineiro também sugeriu a possibilidade de aplicar penalidades aos proprietários de imóveis particulares que os mantêm abandonados, como a progressividade do IPTU. “O imóvel abandonado é pior que um terreno. Ele não cumpre nenhuma função social e pode até abrigar produtos de furto, como fios elétricos. É necessário estudar a aplicação de um IPTU mais alto nesses casos”, defendeu.
Questionado sobre a realização de uma audiência pública para tratar do tema, o vereador afirmou que pretende buscar soluções diretamente com as secretarias responsáveis e com a prefeita da Capital.
“Vamos visitar secretarias, conversar com os secretários e com a prefeita para tomar as medidas cabíveis. O importante é agir com estratégia para revitalizar o Centro e garantir mais segurança e saúde para todos”, concluiu.
Por Inez Nazira
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