Violência doméstica: com mais de 13 mil denúncias só em 2025, vítimas encontram formas silenciosas de pedir socorro em MS

Foto: Freepik
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Polícia recebe capacitação para atendimentos e alerta população para reconhecer os sinais

Dizer que está pedindo uma pizza, um remédio ou qualquer outro serviço aparentemente inocente pode, na verdade, ser um pedido de socorro. Em Mato Grosso do Sul, como em várias partes do país, mulheres em situação de violência doméstica têm recorrido a códigos disfarçados para denunciar os abusos, principalmente quando estão sob vigilância do agressor.

Esses pedidos velados são cada vez mais reconhecidos por policiais, atendentes do 180 e 190, profissionais de farmácias e estabelecimentos parceiros, que foram treinados para identificar os sinais de que algo está errado, mesmo quando a vítima não consegue dizer isso em voz alta.

Essa prática tem ganhado destaque à medida que os números da violência doméstica continuam em alta. Até o dia 4 de agosto de 2025, o Mato Grosso do Sul registrou 13.560 denúncias de violência doméstica, segundo dados do sistema Sigo. Só nos primeiros quatro dias de agosto, foram 250 novos casos, o que indica uma média alarmante de mais de 60 casos por dia.

O mês com o maior número de ocorrências até agora foi março, com 2.296 denúncias. Apenas na Capital, 4.887 registros foram feitos neste ano, sendo 823 deles também em março, o pico da violência na cidade. Somente nos primeiros dias de agosto, Campo Grande já soma 87 ocorrências.

Em 2024, o Estado fechou o ano com 22.935 denúncias, março também foi o mês mais violento, com 2.150 registros. Em Campo Grande, o total foi de 7.564 casos em 2024, sendo 4.114 deles até julho.

Resposta da PMMS as denúncias
Em nota oficial, a PMMS (Polícia Militar de Mato Grosso do Sul) informou que o caso retratado recentemente em vídeo publicado em suas redes sociais, no qual uma mulher utilizou um pedido de “dipirona” disfarçado para denunciar violência, ocorreu em Campo Grande, e resultou na prisão em flagrante do autor, que foi encaminhado à DEAM (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher).

“Os atendentes do COPOM (Centro de Operações da Polícia Militar– 190) são policiais militares experientes, com histórico de atuação na radiopatrulha e contato direto com vítimas de violência doméstica. Esses profissionais recebem treinamentos periódicos e especializados pelo CIOPS (Centro Integrado de Operações de Segurança)”.

Os treinamentos desses profissionais abrangem desde os procedimentos técnicos até o estudo de casos reais, o que os capacita a identificar com maior precisão situações de risco e prestar um atendimento mais sensível e eficaz.

A PMMS também alertou para a realidade dos trotes recebidos via 190, o que torna a capacitação contínua essencial para distinguir casos reais e garantir respostas rápidas e assertivas.
A divulgação do vídeo mencionado integra a campanha “Agosto Lilás”, que visa conscientizar e mobilizar a sociedade no enfrentamento da violência doméstica. As denúncias podem ser feitas pelo telefone 190 ou, de forma anônima, pelo Disque 181.

Códigos que salvam vidas
Em situações onde gritar por socorro pode aumentar o risco, estratégias como fingir pedir uma pizza ou mostrar um “X” vermelho na palma da mão, símbolo da campanha “Sinal Vermelho”, tornaram-se ferramentas valiosas. Elas permitem que a mulher se comunique de forma silenciosa com quem pode ajudá-la, seja em uma ligação ou pessoalmente.

A Campanha Sinal Vermelho é uma iniciativa de combate à violência doméstica, criada em 2020 pela AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) em parceria com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça). A ideia central é permitir que mulheres em situação de violência peçam ajuda de forma silenciosa, desenhando um “X” vermelho na palma da mão e mostrando esse sinal em farmácias ou outros estabelecimentos participantes da campanha.

Ao identificar o sinal, os atendentes seguem um protocolo de acolhimento e acionam a polícia. A campanha se fortaleceu durante a pandemia, quando muitas mulheres estavam isoladas com seus agressores, e desde então foi ampliada com apoio de instituições públicas e privadas. Em 2021, foi sancionada a Lei 14.188/21, que reconheceu o “sinal vermelho” como forma de denúncia.

Outro sinal de ajuda com a mão que ganhou reconhecimento internacional foi criado pela Canadian Women’s Foundation durante a pandemia. Para fazê-lo, basta levantar a mão com a palma aberta, dobrar o dedão em direção à palma e fechar os outros quatro dedos sobre ele, como se estivesse “prendendo” o polegar.

Ao ver esse sinal, o ideal é buscar contato seguro com a vítima e acionar o 190 ou 180, conforme a situação.

Box Prefeitura lança campanha do Agosto Lilás
Como parte do lançamento do calendário de ações do Agosto Lilás – campanha nacional de combate à violência contra a mulher, a SEMU (Secretaria Executiva de Políticas para a Mulher) realizou, na tarde de ontem (6), uma palestra inspiradora voltada, especialmente, para mulheres com deficiência. Com o tema “Minha história, nossas possibilidades”, o momento foi conduzido por Paula Zanata, uma mulher cadeirante, servidora pública federal, que fala sobre a ocupação de espaços e suas vivências sendo uma pessoa com deficiência.

Durante a abertura do evento, que também contou com o Chá da Tarde nas Mulheres Inclusivas, a titular da pasta Angélica Fontanari, afirmou que, apesar de tudo, a Secretaria tem muito o que comemorar, porque, desde fevereiro de 2025, quando o feminicídio da jornalista Vanessa Ricarte jogou luz sobre as diversas falhas na rede de apoio e atendimento à mulher vítima de violência – não houve mais morte de mulheres na Capital e as políticas públicas de combate à violência doméstica tem se fortalecido cada vez mais.

“A palestra de hoje faz parte de uma política pública de fortalecimento das mulheres e, hoje, especialmente, das mulheres com deficiência para que elas vejam que um diagnóstico não é uma sentença. Queremos que elas sejam inspiradas pela Paula Zanata, que tem uma história de vida muito bonita. Estamos trabalhando para levarmos informação, prevenção e ensinar a essas mulheres como identificar situações de violência doméstica. Vamos mostrar o quanto elas são capazes de ter uma vida plena”, afirmou.

Às vésperas da Lei Maria da Penha completar 19 anos, a prefeitura ainda lançou o programa “Sorrindo para a Vida”, que vai oferecer atendimento odontológico completo para todas as mulheres que ficaram com sequelas orais e faciais em decorrência de violência doméstica. De acordo com Angélica, esta é uma forma de trazer de volta a autoestima da mulher e encorajá-la para que consiga emprego e reconstruir sua vida.

Por Inez Nazira e Ana Clara Santos

 

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