O olhar é tímido, e quando alguém se aproxima, Jonas (nome fictício) desvia os olhos para baixo. O homem de 40 anos frequenta há 2 meses as consultas no Centro de Atenção Psicossocial – CAPS AD III no Bairro Guanandi, e conta que está se adaptando bem à medicação receitada pelo médico. Usuário de crack durante 20 anos, Miguel (nome fictício) conta que uma das maiores conquistas foi começar a se sentir parte de um grupo, como na festa de aniversário do CAPS nesta quarta-feira (16), “o CAPS me ajuda muito, é um lugar público, mas ao mesmo tempo acolhedor. Aqui eu tenho auxílio sem custo nenhum, eu vou seguir em frente no resgate da minha dignidade. ”
Ao completar um ano de funcionamento neste mês de outubro, o CAPS AD III “Márcia Zen” realizou 21.600 atendimentos. “Nós temos cerca de mil pacientes fixos, que fazem tratamento conosco, e ainda temos a demanda espontânea de mais ou menos 20 pacientes por dia”, explica a gerente da unidade, Ana Paula Jonas. A equipe formada por 38 profissionais conta com médicos, enfermeiros e técnicos, psicólogos, assistente social e farmacêuticos. Neste período, a Secretaria Municipal de Saúde promoveu junto às equipes várias capacitações ambulatoriais, médicas e de atendimento para lidar com pacientes que enfrentam problemas com álcool e drogas.
O CAPS AD III também conta com 10 leitos de acolhimento para a estabilização de pacientes que chegam com transtornos ou precisam de atendimento de urgência. É o caso do Flavio (nome fictício) de 27 anos, que procurou o centro psicossocial depois de ter uma reação a medicamentos, “eu tive uma paralisia da face e de partes do corpo e eles me atenderam muito rápido, em menos de 20 minutos eu já estava bem. ”
Além dos leitos, são ofertados diversos outros atendimentos e serviços, como psicoterapia, atividades culturais e de lazer, entre outros, garantindo o tratamento das pessoas que moram, principalmente, nas regiões do Imbirussu, Anhanduizinho e Lagoa. A unidade tem como objetivo promover a reinserção social do usuário através de ações intersetoriais, sobretudo na educação, trabalho, saúde e lazer.
A coordenadora municipal da Rede de Atenção Psicossocial e responsável pelo setor de Saúde Mental da Sesau, Gislayne Budib, lembra que o ambulatório funciona todos os dias da semana, assim como os serviços de emergência, “a gente fica aberto até meia-noite, sábado e domingo também e feriados”, relata. O CAPS também faz busca ativa dos pacientes que faltam às consultas, “a gente vai atrás da família e tenta trazê-los de volta para o atendimento”, explica. Os pacientes também recebem suporte para tratamento de doenças que foram adquiridas muitas vezes sob o efeito de bebidas e drogas, nestes casos, os tratamentos mais comuns são contra doenças sexualmente transmissíveis (DSTs).
Miguel é frequentador do CAPS AD III há 4 meses, período em que começou a trabalhar na comunidade terapêutica do projeto Jaboque, uma chácara que fica na saída para São Paulo e atende cerca de 70 homens, todos em recuperação de drogas e álcool. Nesta manhã festiva, entre um pedaço de bolo e outro, ele conta que era jogador de futebol quando passou a usar cocaína, “destruí a minha vida e a minha carreira por causa das drogas”. Hoje, ele ajuda pessoas que querem deixar o vício. “Meu fundo do poço foi quando eu perdi minha casa, carro e minha esposa”, conta, emocionado, afirmando que foi Deus quem o salvou, mas que é sempre bom quando o paciente pode contar com uma equipe de médicos e de pessoas preparadas para entender o que ele está passando.
“A cabeça de quem usa drogas é tipo uma panela de pressão, fica muito barulho dentro, e quando alguém conversa com você e diz que vai te ajudar, você já começa a levantar”, explica. O sonho de Miguel é bem parecido com o do Jonas, o entrevistado no início da reportagem, ele agora quer ser visto como parte fundamental na construção de uma sociedade, e deixar o passado de abusos para trás.
Na manhã de hoje, a secretária municipal de Saúde, Rosana Leite, ressaltou a importância da implantação do novo CAPS, destacando-o como uma prioridade da atual administração municipal. “Ao longo deste ano, a Prefeitura investiu recursos próprios para garantir a implantação e o funcionamento da unidade,” explicou. Segundo Rosana, o governo federal realizou o repasse de R$ 150.000,00 nesta semana para o CAPS, conforme publicado no Diário Oficial da União. A secretária destacou que, devido à urgência em atender a população da região do Anhanduizinho, o Município decidiu antecipar os investimentos antes da chegada da verba federal. “Não podíamos esperar, era urgente oferecer esse serviço essencial àquela comunidade.”
Homenagem
O CAPS A.D recebeu o nome da ex-conselheira de saúde e ativista Márcia Gomes de Moraes, a Márcia Zen, falecida no dia 23 de abril de 2021, deixando marcado o seu legado de luta e dedicação em prol do Sistema Único de Saúde (SUS).
Estrutura da Rede
Com a inauguração do CAPs ADIII no ano passado, a Rede de Saúde Mental do Município passou a ser composta por 7 CAPSs, sendo 4 CAPS III, 2 CAPS A.D IV, 1 CAPS Infanto Juvenil, 2 Unidades de Acolhimento (uma infantil e outra adulta) e 4 Residências Terapêuticas. Todas as unidades funcionam 24 horas por dia, com média de 1.300 consultas ambulatoriais de saúde mental e 2 mil atendimentos nos CAPS por mês. Somente a Rede Municipal possui 110 leitos para atendimentos de pacientes com problemas psiquiátricos ou usuários de álcool e drogas.
CAPS AD III Guanandi – “Márcia Zen”
Endereço: Rua Manoel da Costa Lima, n.º 3.272, Bairro Guanandi
Horário: Urgência e Emergência das 7h à meia-noite, de segunda à sexta, sábados, domingos e feriados; Ambulatório, das 7h às 17h.
*Nome fictício usado para preservar a identidade do entrevistado