Caminhoneiros se dividem sobre greve nacional convocada para esta quinta-feira

Caminhões no pátio da Mercedes-Benz do Brasil em SÃo Bernardo do Campo - Foto: Ravena Rosa
Caminhões no pátio da Mercedes-Benz do Brasil em SÃo Bernardo do Campo - Foto: Ravena Rosa

Sem consenso, autônomos de MS relatam endividamento e desconfiança sobre benefícios reais da paralisação

Caminhoneiros de várias regiões do Brasil articulam uma paralisação nacional para esta quinta-feira, 4 de dezembro, em rodovias de diferentes estados. O movimento é impulsionado em grande medida por lideranças como Francisco Dalmora Burgardt, conhecido como Chicão Caminhoneiro, representante da(UBC (União Brasileira dos Caminhoneiro), com apoio jurídico do desembargador aposentado Sebastião Coelho. A pauta oficial reúne reivindicações trabalhistas, como aposentadoria especial após 25 anos de contribuição, estabilidade contratual, reestruturação do Marco Regulatório do Transporte de Cargas e cumprimento efetivo das leis que regem o transporte rodoviário.

Apesar da mobilização nas redes e de vídeos que falam em “greve histórica”, o cenário em Mato Grosso do Sul é de divisão entre a categoria. Em meio a uma rotina de fretes apertados, longas filas em armazéns e boletos acumulados, parte dos caminhoneiros autônomos afirma não ver condições nem garantias para aderir à paralisação.

É o caso do caminhoneiro Marcos Roberto, que atua há anos na rota da BR-262 e, na manhã desta quarta-feira (3), aguardava para carregar em uma unidade da Cargill, em meio a uma fila de cerca de 150 veículos, muitos deles conduzidos por autônomos.

Dívida alta, incerteza e desconfiança
Marcos diz não se opor a pautas de melhoria para a categoria, mas afirma não acreditar que a paralisação, tal como está sendo convocada, vá trazer resultados concretos para quem vive do frete no dia a dia.

“Eu não tenho intenção nenhuma de parar. Uma porque eu nem sei o que estão reivindicando com essa greve. Outra, quem que inventou essa greve? Sindicatos?. E qual benefício vai trazer para nós essa greve? Com certeza nenhuma. Igual em 2018. Nada, só piorou, na verdade”, relembra.

Na avaliação dele, a convocação nas redes sociais não responde às dúvidas mais básicas de quem está com o caminhão financiado, pneus caros e custos crescentes com manutenção, pedágios e alimentação na estrada.

“Eu não concordo com a greve, porque só a nossa classe tem que parar. Se fosse para parar, tinha que parar tudo. Vamos parar, vamos fazer uma paralisação geral. Agora, parar os caminhoneiros, nós que estamos há quantos anos, já é uma classe massacrada”, desabafa.

Autônomo, dono do próprio caminhão, ele diz que não tem margem para ficar dias sem rodar.

“Eu sou caminhoneiro autônomo, tenho meu caminhão, um monte de conta pra pagar, todo dia boleto pra pagar. Como que eu vou parar? Quem que vai pagar minhas contas? É meu nome que vai sujar. Ouvi um pessoal falando aí, ‘ah, vamos pedir prazo, anistia das contas’, O banco não vai perdoar contas jamais e nem prorrogar cobrança de dívida”, opina.
Marcos afirma que só pararia se fosse impedido de seguir viagem.“Então. eu não vou parar. Eu vou parar só se me obrigar a parar mesmo, pra mim parar. Mas, caso ao contrário, não importa. Nesse meio, deve ter mais da metade aqui caminhoneiro autônomo. E nenhum concorda em parar.”

Quem convoca a greve e o que está em jogo
O movimento nacional ganhou força depois que Chicão Caminhoneiro foi à Presidência da República, em Brasília, para protocolar documento informando a intenção de paralisar a categoria a partir do dia 4 de dezembro. Ele apareceu em vídeos ao lado de Sebastião Coelho, que promete suporte jurídico para garantir que o ato se desenvolva “dentro da legalidade” e sem impedir o direito de ir e vir da população.

As principais reivindicações listadas por lideranças e entidades que apoiam o movimento incluem:
-Estabilidade contratual dos caminhoneiros, especialmente autônomos;
-Garantia de cumprimento das leis que regulam jornada, descanso e remuneração;
-Reestruturação do Marco Regulatório do Transporte de Cargas;
-Aposentadoria especial após 25 anos de trabalho, comprovada por documentos fiscais ou recolhimento previdenciário.

Ao mesmo tempo, parte das lideranças tenta dissociar a mobilização de bandeiras político-partidárias, reforçando que se trata de uma pauta trabalhista, embora o desembargador que dá o suporte jurídico seja aliado público do ex-presidente Jair Bolsonaro e já tenha defendido paralisações em torno de pedidos de anistia.

Lembrança de 2018 ainda pesa na decisão
A memória da greve de 2018, que durou dez dias, paralisou estradas, afetou o abastecimento de combustíveis e alimentos e gerou forte desgaste entre governo e setor produtivo, ainda pesa na avaliação de caminhoneiros, empresários e entidades.

Na época, muitos autônomos relataram não ter recebido compensações proporcionais às perdas com fretes suspensos, multas bancárias por atraso e desgaste nas negociações com embarcadores. Esse histórico alimenta, hoje, uma combinação de ceticismo e medo de novo prejuízo, especialmente em segmentos que trabalham com contratos frágeis e baixa previsibilidade de carga.

Falta de consenso entre entidades e bases
Assim como em outros estados, não há consenso entre sindicatos, associações e cooperativas sobre a adesão à paralisação. Em regiões como a Baixada Santista, por exemplo, entidades que representam caminhoneiros autônomos do Porto de Santos criticaram a falta de assembleias formais e votação, afirmando que não orientariam a parada sem debate interno estruturado.
No plano nacional, há entidades que avaliam a mobilização como necessária para recolocar o debate sobre as condições de trabalho nas estradas, enquanto outras defendem intensificar a negociação institucional com o governo, sem paralisação.

Em Mato Grosso do Sul, Osny Belinati, presidente do SINDICAM-MS (Sindicato dos Caminhoneiros de Mato Grosso do Sul) garante que os trabalhadores sindicalizados não aderiram à paralisação. “ Nós não vamos fazer paralisação. O sindicato dos caminhoneiros autônomos de Mato Grosso do Sul não vai fazer greve, nós estamos analisando tudo, mas acredito que se alguém entrar vai ser alguma pessoa que não é ligada ao sindicato”, explicou.

Osny ainda acredita que o momento também não seja o ideal para realizar este tipo de mobilização. “Eu acho que a greve nesse momento é muito difícil”, frisa.

Ao Jornal O Estado, o presidente do Sindicargas-MS (Sindicato dos Trabalhadores em Transporte de Cargas do Estado de Mato Grosso do Sul), Gilmar Ribeiro confirmou que até a tarde de ontem (3), ainda não tinham recebido a confirmação da adesão dos motoristas no Estado. “Estamos aguardando ainda, afinal a grave ela está sendo conduzida pelos caminhoneiros autônomos e por enquanto não temos nenhum posicionamento sobre a paralisação, tanto os trabalhadores quantos aos empresários transportadores”, explicou.

Por Suelen Morales

 

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