Artigo: Navegando pela história para compreender as ciências humanas e sociais na atualidade

José Barreto dos Santos (Zeca)
Foto: Arquivo

Prezado leitor…

Atuando como professor de uma Universidade Pública, na área de formação de professores, trago para nossa reflexão o ensaio publicado por Francis Fukuyama, em 1989, intitulado, “O Fim da História”. O autor afirmava que, com a derrota do fascismo após a Segunda Guerra Mundial, e com a queda do socialismo, concomitantemente com a derrubada do muro de Berlim, se consolidava então, a ideia de que o liberalismo colocava-se como ideologia de força política, isto é, diante da derrocada do fascismo e comunismo, triunfava a democracia liberal, cuja base intelectual fundava-se na economia de mercado, como horizonte possível da produção material humana, da sua organização social e econômica.

Nesse sentido, passadas algumas décadas, a evolução ideológica do liberalismo continuava seus ciclos de idas e vindas, de tal maneira que, seus fundamentos como, democracia com liberdade e equidade ganhavam novas formas e conteúdos políticos. O advento do neoliberalismo, do “novo” liberalismo, circulando pelos países hegemônicos, Inglaterra e Estados Unidos, traziam consigo a herança doutrinária do antigo liberalismo clássico, ao preconizar a intervenção mínima do Estado na economia, utilizando os efeitos privatistas dos gastos sociais, como os da área da educação e saúde.

Tal concepção, coloca os sujeitos trabalhadores, numa falsa importância social, precarizando seus trabalhos funcionais por meio de discursos persuasivos sobre o auto empreendedorismo. Sob a égide da competência e habilidade os mesmos teriam mais importância que o Estado, criando uma falaciosa valorização do ser humano, sob uma diretriz desumana, a favor de uma realidade cruel, desmerecendo a responsabilidade
do Estado, com a diminuição dos gastos sociais, fundamentalmente com a educação e saúde.

Diante do exposto, assistimos esse processo em andamento no Brasil, de maneira capenga, mas muito perversa, porque o cenário cultural da nossa singularidade, sublima sua patente histórica, cuja base econômica do campo à cidade, casa grande e senzala, determina “ainda” as suas formas políticas, jurídicas e o conjunto das ideias da sociedade brasileira, que marcam o sedimentado atributo dado ao coronelismo na República Velha, mas que ainda se perpetua no autoritarismo coercitivo do “elitismo” e na obediência persuasiva da “excludência”.

Machado de Assis, escrevia num panfleto em 1863, “in O Futuro”, o resumo de um pensamento – “Toda ciência tem princípios, de que deriva o seu sistema. Um dos princípios da Economia Política é o trabalho livre. Ora, no Brasil domina o fato ‘impolítico e abominável’ da escravidão”.

Haja vista que, continuamos a perpetuar com o modelo produtivo ainda na “terra”, com o slogan de propaganda trazendo a ideia de que o modelo do agronegócio fornece, basicamente, todas as coisas boas e necessárias da vida, forjadas no “agro é tech, agro é pop, agro é tudo”, e que afloram em nós a crítica para entendermos as condições materiais necessárias à universalização das ciências humanas e sociais.

Conclui-se que, hoje, no mundo globalizado, assistimos a um negacionismo perverso e autoritário, advindo do modelo neoliberal dos países capitalistas mais desenvolvidos, porém venerado e consagrado pela elite conservadora dos países periféricos, dentre eles, o Brasil, como pensa Roberto Schwarz, – “Nos últimos anos, em que reforçam o diagnóstico sobre ‘o fim do século’, é cada vez mais evidente que o ‘mercado’ (essa entidade tão abstrata mais ao mesmo tempo com agentes tão concretos) não é disponível para todos, restando uma desagregação sistemática e violenta da vida social”.

Concomitantemente, a educação nas Universidades Públicas adentram neste contexto de desumanização, como escreve Marilena Chauí no seu ensaio, publicado em 2001 – “O mal-estar na universidade: o caso das humanidades e das ciências sociais” – “Simultaneamente à forma acusatória, a inessencialidade surgindo de modo mais profundo, ditada, agora, não pela acusação abstrata, mas pelas condições materiais da sociedade brasileira, isto é, sua entrada na chamada ‘acumulação flexível do capital’ (na linguagem da esquerda) ou ‘desregulação econômica’ (na linguagem da direita), e pela adoção da ideologia neoliberal”.

À baila desse cenário, é fundamental compreender o movimento da sociedade brasileira. As leis que presidem a dinâmica da sua organização social, a partir da sua base econômica, o agronegócio, nos ajudam a entender as contradições que envolvem interesses antagônicos, as lutas de classes sociais, onde as ideias refletem e dão sentido aos acontecimentos educacionais, sobretudo o quanto é importante os fundamentos das ciências humanas e sociais para desocultarmos a fragmentação e dispersão dos conhecimentos, focados pelos especialistas, que buscam resultados mensuráveis, para que possam ranquear o/a melhor, o/a mais competente ou o/a mais habilidoso(a).

É nessa tentativa desastrosa que Francis Fukuyama, ao propor o novo, negando a história, que procuramos materializar a nossa compreensão do neoliberalismo e a educação superior pública, enquanto uma instituição social. Isso significa que ela exprime de modo determinado a sociedade que é e faz parte.

Pode-se concluir que, qualquer tentativa metodológica de “modernizar” e/ou “flexibilizar” o velho para ser substituído pelo novo, será minado historicamente pelas condições materiais que deu origem às humanidades brasileiras, que passam pelo negacionismo da literatura, da filosofia, da sociologia, da história, e o que fez nascer a Universidade Pública Brasileira, tal como a conhecemos.

Por José Barreto dos Santos (Zeca), Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul/Uems. 

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