Artigo: Ernestine Rose: filosofia e ativismo social

Ricardo Oliveira da Silva
Foto: Arquivo

O papel da filosofia na busca de solução dos problemas que permeiam a vida humana possui longa trajetória, por vezes negligenciada, é verdade, mas que convém não ser esquecida.

Para ilustrar este raciocínio eu gostaria de recordar as ideias filosóficas e o ativismo social de Ernestine Rose (1810- 1892). Ela nasceu na Polônia, no seio de uma comunidade judaica. Aos 17 anos, após o falecimento da mãe e a recusa de um casamento arranjado articulado por seu pai, ela deixou sua terra natal.

Ao sair de casa, Ernestine Rose já havia rompido com a fé judaica, por discordâncias quanto ao papel subalterno que era atribuído à mulher pelos rabinos. E a sua inconformidade com a ordem social foi reforçada filosoficamente com o contato que teve com o ideário iluminista na Alemanha, França e Inglaterra na virada da década de 1820 para 1830.

A influência filosófica mais importante na vida de Ernestine Rose foi o reformador social Robert Owen (1771-1858). As ideias owenistas sobre reforma do mundo do trabalho, defesa da educação e rejeição da propriedade privada se inspiraram em pensadores iluministas: 1) Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), para quem as crianças poderiam aprender coletivamente sentimentos e hábitos; 2) os filósofos utilitaristas, que concediam alta importância à felicidade, que só poderia ser alcançada se tivesse uma dimensão coletiva; 3) William Godwin (1756-1836), que defendia a extinção da propriedade privada em nome da igualdade; e 4) Adam Smith (1723-1790), autor da premissa da riqueza como fruto de trabalho.

Em 1836 Ernestine Rose migrou para os EUA. Naquele país, ela desenvolveu um ativismo social inspirado no ideário filosófico owenista. O seu engajamento se deu, sobretudo, na luta pelo abolicionismo, livre- -pensamento e direitos para as mulheres. No caso da luta pela igualdade de gênero, Ernestine Rose encontrou nos EUA uma realidade onde as mulheres viviam sob o peso da dependência econômica em relação aos pais e aos maridos, eram coagidas a não exercerem a liberdade de expressão e a suportarem o trabalho doméstico. Tudo isso imposto sob argumentos supostamente científicos (mulher é fisicamente frágil) e religiosos (Deus determinou o papel de mãe e esposa as mulheres).

Ernestine Rose interpretou as adversidades enfrentadas pelas mulheres por meio do ponto de vista owenista como fruto da ignorância e do egoísmo presente na sociedade. Como solução para isso, ela defendeu uma ampla reforma social, pautada em medidas que promovessem a igualdade de oportunidades para homens e mulheres no acesso à educação, emprego, direitos políticos e sociais.

A história de Ernestine Rose é reveladora do papel que a filosofia pode desempenhar na reflexão e busca de respostas aos dilemas enfrentados por nossa comunidade social, ontem e hoje.

Por Ricardo Oliveira da Silva, doutor em história (UFRGS) e professor do curso de história da UFMS/CPNA. 

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