A presença de indígenas do Ensino Superior

Foto: divulgação
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A Constituição Federal de 1988 transformou a relação do Estado para com os povos indígenas, ao reconhecer que o país é pluriétnico e, portanto, reconheceu os direitos diferenciados a que estes têm direito. O aumento da presença de indígenas no ensino superior resulta da luta dos seus movimentos que junto com apoiadores buscaram avançar na promoção de políticas públicas que diminuíssem as desigualdades que historicamente os marginalizaram dos processos escolarizados.

A criação de escolas indígenas com oferta regular do ensino fundamental e médio – e mais recentemente na educação infantil – nos territórios indígenas, fez emergir a necessidade de políticas diferenciadas de ingresso no ensino superior. Por meio da pressão dos movimentos indígenas, as universidades são compelidas a criar oportunidades diferenciadas para o ingresso coletivo de jovens indígenas nos seus quadros discentes, para respeitar os inúmeros processos de formação recebidas na educação básica que tem como fundamentos a multietnicidade, os conhecimentos/saberes indígenas, a autodeterminação e a comunidade educativa, conforme preconiza o Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas/RCNEI.

As ações afirmativas tornaram-se políticas institucionais para o ingresso diferenciado nas instituições de ensino superior para este público e se estabeleceram por meio de cotas, licenciaturas interculturais, sobrevagas e, para as instituições federais, a Lei nº 12.711/2012 definiu também um percentual de vagas para aqueles/as que atendessem aos critérios estabelecidos.

No Mato Grosso do Sul a presença de indígenas de etnias originárias do estado, mas também de outros entes federados, é uma realidade perceptível nas universidades públicas, com números crescentes tanto na graduação quanto na pós-graduação, onde em torno de aproximadamente 1500 indígenas estão matriculados em cursos presenciais e em EaD. A UEMS foi a primeira universidade pública a ter uma legislação estadual (Lei 2589/2002) que garantiu o acesso de indígenas por meio de reserva de vagas, com percentual de 10% em todos os seus cursos para ingresso nos seu quadro discente. Em 2024, são 723 matrículas de indígenas que carregam em seus corpos a ancestralidade dos povos Guarani, Kaiowá, Terena, Kinikinau, Kadiwéu, Atikum, Pankará, Baré, Kaiapó.

Estudos apontam que esta presença é marcada pela tensão entre o reconhecimento do potencial transformador de uma instituição que se caracteriza por ser monocultural e etnocêntrica para criar espaços colaborativos e interculturais, enquanto por outro lado relatos de silenciamentos, racismo e discriminação não são raros em todo o país, causando sofrimentos que requerem apoios para que estes(as) estudantes permaneçam em seus cursos. Outro desafio são as políticas de permanência que devem ser adequadas a cada instituição.

Por outro lado, as contribuições dos indígenas para as instituições de ensino superior são inegáveis, entre as quais podem ser citadas: o descentramento do pensamento hegemônico, a desconstrução e ressignificação da racionalidade moderna, a produção de identidades interculturais, a discussão de pedagogias decoloniais, a emergência de temas que dialogam com as vivências dos povos indígenas e suas lutas, a realização de pesquisas em que a autoetnografia e a autobiografia são referências para a reflexão, a percepção de que o conhecimento universal é composto de saberes e culturas Outras que foram inferiorizadas. Assim, a presença indígena deve ser valorizada, apoiada e celebrada.

Beatriz Landa, Chefe do Núcleo Intercultural-PROE/UEMS, atua no CEPERSI-Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão Rede de Saberes Indígenas. Docente na Pedagogia/Dourados e Pedagogia Intercultural/Amambai. Docente no ProfHistória e ProfEduc da UEMS. E-mail: [email protected].

Este artigo é resultado da parceria entre o Jornal O Estado de Mato Grosso do Sul e o FEFICH – Fórum Estadual de Filosofia e Ciências Humanas de MS

 

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