Sinfonia da necrópole

Recente na Netflix, filme nacional traz relação da morte com o poder capital, e com o progresso a qualquer custo

Entre os títulos adicionados recentemente à plataforma de streaming Netflix está “Sinfonia da Necrópole”, que chama atenção só pelo curioso nome, mas por ser classificado como uma “comédia de terror”. Brasileiro, a obra de Juliana Rojas é datada de 2014, mas, seja por sua identidade teatral musicada, por abordar a morte e o progresso, e a forma que lidamos com os sentimentos no nosso cotidiano, ou até mesmo pela relação dos personagens em cena, é um filme que vale a pena ter na lista de assistidos. 

No enredo do filme acompanhamos o personagem Deodato (papel de Eduardo Gomes), não muito animado por sua nova ocupação como aprendiz de coveiro. Desmaiando ao confrontar o luto e a morte, restos mortais ou até mesmo pela relação que o personagem desenvolve com a música, ele se mostra o mais sensível na trama. O vulnerável protagonista se vê afetado quando precisa trabalhar ao lado de uma funcionária do serviço funerário, Jaqueline (Luciana Paes). 

Remodelar o cemitério de forma que o local abrigue mais jazigos é o foco da história, que, mesmo em tom de humor e musicada, nunca perde o respeito. Nesta reforma agrária às avessas impulsionada pelo capitalismo, uma boa quantidade de túmulos precisa ser transferida para um cemitério vertical (e é aí que Deodato se incomoda), cuja capacidade de abrigar ossadas é bem maior – ou seja, mais dinheiro à vista. O aprendiz de coveiro, além de assombrado por aqueles que já foram, se coloca no lugar dos familiares e de como se sentiriam ao chegar ao cemitério e não encontrar os restos mortais de seus parentes onde os haviam sepultado. 

Juliana Rojas também assina a trilha sonora da obra, ao lado de Marco Dutra, com quem dirigiu seu primeiro curta-metragem, em 2004, intitulado “O Lençol Branco”. Com produção de Max Eluard, “Sinfonia da Necrópole” tem menos duas horas de duração (84 minutos), o que não impede o filme de abordar a forma como o capitalismo dita a vida – e a morte – e a maneira como deixamos passar nossos sentimentos no cotidiano, tornando nossas relações efêmeras. 

(Confira mais na página C1 da versão digital do jornal O Estado)

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