‘O Deus de Spinoza’

Foto: Ronaldo Gutierrez
Foto: Ronaldo Gutierrez

Com reflexão sobre humanidade, alma e existência do divino, peça estreia na Capital em outubro

Uma das grandes questões que permeiam a humanidade a tempos, é a existência de um Deus, ou força maior, responsável por gerir e controlar diversos aspectos da humanidade. Essa é a discussão que a peça ‘O Deus de Spinoza’ traz para o público campo-grandense no dia cinco de outubro, às 19h30, no Teatro Dom Bosco.

Com um cenário imersivo, figurinos detalhados e música ao vivo, o espetáculo conduz o público a uma jornada instigante, discutindo temas como a existência de Deus, o papel da alma e a fragilidade humana. A obra retrata um encontro entre o filósofo Baruch de Spinoza, após sua condenação pelo Conselho de Rabinos de Amsterdã, e o editor de livros Ian Reuwertsz. As conversas levantam questões profundas sobre a natureza, as crenças, o cosmos e as emoções humanas, tudo amparado por diálogos intensos e confrontos de ideias.

Contexto

Para o filósofo Barauch Spinoza, Deus é a natureza, a potência e a necessidade, e não um ser sobrenatural que criou o universo, ou seja, ele identifica o divino como natureza. Ele foi um dos primeiros pensadores do Iluminismo e da crítica bíblica moderna, incluindo das noções modernas de universo.

Em seu texto, Spinoza relacionava Deus não como um criador, e sim como a própria matéria. Sendo assim, considerava a reza inútil para quem não aproveitava a vida de maneira sincera, desacreditava de igrejas como locais sagradas de busca de Deus, já que, para ele, Deus está nas “montanhas, nos bosques, nos rios e nas praias”. Também mencionou as ‘escrituras sagradas’ como algo que não teria a ver com seu Deus.

Além disso, contrapondo as concepções Cristãs de inferno e punição, para o filósofo, Ele não julga, crítica, irrita, ou castiga, sem a necessidade de a humanidade pedir perdão por atos que apenas fazem parte do livre-arbítrio.

“Como posso te castigar por seres como és, se sou Eu quem te fez? Crês que eu poderia criar um lugar para queimar a todos os meus filhos que não se comportam bem pelo resto da eternidade? Que tipo de Deus pode fazer isso? Esquece qualquer tipo de mandamento, são artimanhas para te manipular, para te controlar, que só geram culpa em ti. Respeita o teu próximo e não faças aos outros o que não queiras para ti. A única coisa que te peço é que prestes atenção à tua vida; que teu estado de alerta seja o teu guia. Tu és absolutamente livre para fazer da tua vida um céu ou um inferno”, diz parte do texto de Spinoza.
Espinosa foi considerado ateu por propor uma concepção de Deus tão diferente da tradicional. Albert Einstein, por sua vez, afirmou acreditar no Deus de Spinoza, mas não em um Deus que se preocupa com os afazeres da humanidade. “Acredito no Deus de Spinoza que se revela por si mesmo na harmonia de tudo o que existe, e não no Deus que se interessa em premiar ou castigar os homens”, afirmou o cientista.

Em 27 de julho de 1656, a Sinagoga Portuguesa de Amsterdão puniu Espinoza com o chérem, o equivalente hebraico da excomunhão católica, em razão dos postulados a respeito de Deus, na qual defende que Deus é o mecanismo imanente da natureza, e que a Bíblia é uma obra metafórico-alegórica, que não pede leitura racional e não exprime a verdade sobre Deus.

A peça

O espetáculo “O Deus de Spinoza”, com texto de Régis de Oliveira e direção de Luiz Amorim. “O público terá a oportunidade de ver um filósofo que viveu séculos atrás, mas que tem muito a dizer sobre os dilemas contemporâneos. Spinoza falava sobre a importância do livre pensamento, e outros temas que ainda são muito atuais”, afirma o diretor. “E a peça tem o mérito de trazer o pensamento de Spinoza de maneira acessível, simples e, ao mesmo tempo, envolvente, sem perder a profundidade de suas reflexões.”

O ator Bruno Perillo, que interpreta Baruch de Spinoza, destacou o desafio de dar vida a uma figura histórica tão complexa. “Tive que mergulhar profundamente nas ideias de Spinoza para entender sua filosofia e transformá-la em ação no palco. Além disso, trabalhamos muito a composição física do personagem, considerando suas características reais, como os problemas respiratórios que teve ao longo da vida”, conta o ator, que em determinado momento da trama toca guitarra, reforçando o caráter transgressor e atual do personagem.

A peça também conta com a atuação de Juliano Dip, jornalista da Band e ex-repórter do CQC, no papel de Ian Reuwertsz, amigo e editor de Spinoza. “Interpretar Ian foi uma experiência enriquecedora. Ele é quem publica as obras de Spinoza após sua morte, perpetuando o seu legado. Além disso, faço o narrador, que costura a história, dando contexto ao espetáculo”, comenta Dip, que afirma ter “fascinação por discussões filosóficas”. Trabalhei no Vaticano, então, a peça me pegou de imediato”.

Régis de Oliveira, autor da peça, destacou sua paixão pelo filósofo que inspirou o texto. “Estudo filosofia há quase 20 anos e Spinoza sempre me impressionou. Ele enfrentou o julgamento de sua própria comunidade com coragem e uma convicção absoluta em suas ideias. Sua concepção de Deus, do mundo e das emoções humanas continua sendo uma das mais marcantes na história do pensamento.”

Diferencial

E se o enredo já não fosse envolvente o suficiente, no palco, ainda há música ao vivo, executada por uma banda com músicas sefarditas (descendente de antigos judeus de Portugal ou Espanha), o que dá um toque especial à peça, enriquecendo a experiência sensorial do público. Trabalho esse que é executado pelos músicos Marcus Veríssimo, e Gabriel Ferrara, além de Laura Visconti (voz e teclado), indicada ao Prêmio Bibi Ferreira pela direção musical do espetáculo Beetlejuice.

“As canções sefarditas, típicas do século XVII, são um elemento forte na dramaturgia. Elas nos transportam para a época de Spinoza, com arranjos que dialogam com o ambiente do espetáculo. Além dos músicos, os atores também participam da performance musical, contribuindo para o clima envolvente da peça”, explica Luiz Amorim.

“É um espetáculo que tem de tudo: boa música, conflitos de pensamento e, acima de tudo, uma mensagem poderosa sobre liberdade”, conclui o diretor.

Serviço
A peça ‘O Deus de Spinoza’ será apresentada no dia 5 de outubro, sábado, às 19h30, no Teatro Dom Bosco, av. Mato Grosso, 225, Centro. O evento é promovido pela Maktub Produções e os ingressos estão disponíveis no link.

Por Por Carolina Rampi

 

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