Exposição ‘Sofrência’: projeto traz a MS parte de acervo do Museu de Internacional de Arte naïf do Brasil

Dag França - Futebol no arraiá 1998
Dag França - Futebol no arraiá 1998

Conhecida como ‘ingênua’, mas carregada de significados sobre a realidade social, a Arte naïf será tema da exposição ‘Sofrência’, que traz a Campo Grande um total de 72 obras de diversos artistas, que fazem parte do acervo do Museu Internacional de Arte Naïf do Brasil (Mian), que já abrigou no Rio de Janeiro o maior conjunto do gênero em todo o mundo. A exposição começa nesta quinta-feira (5), no Centro Cultural José Octávio Guizzo, e irá até o dia 20 de outubro.

Odoteres Ricardo Ozias – Churrasco 2000

A curadoria se inspira na música sertaneja para apresentar a chamada ‘arte popular’, por meio de pinturas que retratam cenas do cotidiano. ‘Sofrência’ faz parte do projeto ‘Arte nas Estações’, idealizado pelo colecionador e gestor cultural carioca Fabio Szwarcwald. Esta é a primeira de três mostras que ocuparão os 200 metros quadrados de área expositiva do Centro Cultural José Octávio Guizzo, sob curadoria de Ulisses Carrilho.

Instalado no Rio de Janeiro entre 1995 e 2016, quando encerrou as atividades por falta de recursos, o Mian abrigou um acervo permanente de 6 mil pinturas de artistas de 120 países. Considerado o maior do gênero em todo o mundo, o conjunto foi reunido ao longo de décadas pelo joalheiro francês radicado no Rio, Lucien Finkelstein (1931-2008).

“Quando idealizei o projeto, meu objetivo era dar visibilidade a esta rara coleção e propor um olhar contemporâneo para esses artistas e suas produções, a partir de um diálogo entre eles e o mundo em que vivemos hoje”, diz Szwarcwald, diretor-executivo do Arte nas Estações.

Fernando Lemos Novaes – Gafieira de luxo 1990

Após o sucesso da primeira edição do projeto no interior de Minas Gerais, que atraiu quase 30 mil visitantes no ano passado, a segunda itinerância inicia-se com a mostra ‘Sofrência’, com temporada até 20 de outubro. Em seguida, serão apresentadas as exposições ‘A ferro e fogo’, de 31 de outubro a 8 de dezembro; e ‘Entre o céu e a terra’, de 19 de dezembro a 20 de fevereiro de 2025. As três exposições que englobam o projeto possuem 262 obras ao todo.

“O projeto encontra força discursiva, narrativa e poética ao contemplar a obra desses artistas que eram chamados de ‘ingênuos’. E contribui para a valorização da arte popular, dando seguimento a uma espécie de revisão do que vem sendo considerado arte no Brasil”, comenta Carrilho.

Para ficar no Brasil

‘Arte nas Estações’ nasceu do esforço liderado por Fabio Szwarcwald para dar visibilidade ao acervo do Museu de Internacional de Arte Naïf (Mian), chamando a atenção para uma problemática latente desde o encerramento da instituição com sede num casarão histórico no Rio de Janeiro. Desde que as atividades foram suspensas em 2016, devido à falta de financiamento, a coleção reunida pelo joalheiro francês radicado no Rio, Lucien Finkelstein (1931-2008), encontra-se armazenada num guarda-móveis e, gradativamente, vem sendo vendida para galerias e museus de fora do país.

Na atual ausência do Mian, o projeto se empenha em criar espaços para exibir a coleção e ressaltar a sua importância. “Essas exposições podem ser o último suspiro de uma movimentação importante para trazer luz à situação da venda da coleção naïf. É importante mobilizar as pessoas, fazendo com que essas obras fiquem no Brasil”, alerta Szwarcwald.

Inspiração

‘Sofrência’ reúne 72 obras que têm como matriz a figura feminina e retratam cenas de convívio social, ambientes domésticos e ruas das cidades onde florescem flertes, festas e trocas de olhares. A narrativa é entremeada por versos da música sertaneja, que popularizou o termo que dá título à mostra em canções que falam de amores mal resolvidos.

“Em Sofrência, a veia poética feminina tem como ponto de partida a canção ‘Troca de calçada’, em que a cantora e compositora Marília Mendonça traz para o eu lírico a voz de uma trabalhadora do sexo”, explica Ulisses. A força da poesia popular se manifesta nas obras de arte e nos versos de outros grandes nomes do sertanejo, como Maiara e Maraísa, e Cristiano Araújo, cujas letras foram impressas nas paredes da exposição.

Cantídio Brasil – Casamento no Sertão 1988

Para o curador, unir as artes plásticas e a música é uma forma de diluir preconceitos sobre o que é popular: “Assim como os artistas naïf são vistos como artesãos no mercado da arte, o cancioneiro sertanejo geralmente não é considerado poesia ou literatura. No entanto, esse é um Brasil que se pensa de dentro para fora, que começa no interior para depois pensar no modo de exportação da cultura pop”. Promover a valorização da arte popular e o reconhecimento do trabalho desses artistas no Brasil e no mundo tem sido um dos contributos do Arte nas Estações.

O projeto expositivo de Sofrência também ecoa uma estética pop ao convidar o público para uma experiência imersiva na área expositiva do Centro Cultural José Octávio Guizzo. A expografia de Janine Marques foi concebida para criar um “túnel de cor”, onde paredes e chão em tons de vermelho vibrante envolvem o público. Já a fachada espelhada do edifício, que esteve fechado para obras durante um longo período, vai ganhar uma intervenção com filtro colorido.

Mais que uma arte ingênua

Em francês, o termo naif significa “ingênuo, sem qualquer tipo de malícia”. No campo das artes visuais, a arte naïf identifica uma produção de caráter autodidata, daqueles que não tiveram acesso ao ensino formal de arte. No entanto, os temas do universo popular, abordados por artistas como o mineiro Odoteres Ricardo de Ozias, mostram que a ingenuidade que transparece à primeira vista também é capaz de revelar camadas mais complexas e profundas da realidade social representada nas telas.

Silvia de Leon Chalreo – Sem título sem data

O curador afirma que se trata de um termo questionável e defende a sua utilização para desmontar a ideia de inferioridade e sublinhar o texto político que estas obras carregam: “De naïf esses artistas nada tinham, eram politicamente engajados”, observa Ulisses. “Essas exposições são sobre saberes que precisam ser respeitados e que não fazem parte de uma norma”.

Para Szwarcwald, é gratificante levar um acervo tão expressivo a lugares que, muitas vezes, não têm oportunidade de receber exposições por falta de investimento: “É um projeto que nos traz muita alegria por seu ineditismo ao contemplar cidades de grande riqueza cultural, mas raramente assistidas pelas instituições e pouco visada por patrocinadores”.

Serviço

O projeto Arte nas Estações começa no dia 5 de setembro e irá até 20 de fevereiro de 2025. A exposição inaugural ‘Sofrência’, com curadoria de Ulisses Carrilho, terá sua temporada até 20 de outubro, no Centro Cultural José Octávio Guizzo, na rua 26 de agosto, 453, Centro. A entrada é gratuita e os horários de visitação são das 9h às 18h, de terça a sábado, sendo que na quinta-feira o horário será estendido até às 20h.

 

Por Carolina Rampi

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