“Elas fora da casinha” é arte que transforma

Seis mulheres: Da esquerda para direita - Lúcia Monte Serrat, Luciana Rondon, Ana Oiticica, Patrícia Helney, Rosane Bonamigo e Adriana Teixeira - Foto: Reprodução
Seis mulheres: Da esquerda para direita - Lúcia Monte Serrat, Luciana Rondon, Ana Oiticica, Patrícia Helney, Rosane Bonamigo e Adriana Teixeira - Foto: Reprodução

Artistas desafiam limites, tornando materiais reaproveitados em arte ousada e cheia de significados

Ousadia, reinvenção e liberdade criativa dão o tom da exposição “Elas fora da casinha”, que entra em cartaz neste mês e promete instigar o público com uma proposta inusitada. Seis artistas mulheres do coletivo “Inspiradas” aceitaram um desafio pouco comum no universo das artes: criar obras a partir de materiais e suportes que nunca haviam utilizado antes. O resultado é uma mostra, repleta de experimentações visuais e simbólicas, onde cada peça revela o processo de ruptura com o familiar e o mergulho em territórios desconhecidos.

Mais do que uma exposição de arte, “Elas fora da casinha” é um manifesto pela liberdade criativa e pela coragem de se reinventar. A escolha do título, carregado de humor e provocação, sinaliza o espírito da mostra: romper com padrões, sair da zona de conforto e explorar novas possibilidades estéticas.Cada obra exposta é um testemunho individual desse percurso, traduzido em formas, texturas, cores e materiais que contam histórias de risco, aprendizado e expressão.

Além da diversidade técnica e temática, a mostra também carrega um compromisso ético com o meio ambiente. Todas as obras, incluindo uma instalação coletiva, foram criadas com materiais reaproveitados, uma escolha consciente que transforma resíduos em arte.

Artista Rosane Bonamigo – Foto: Adriana Teixeira/Divulgação

Início da exposição

O grupo “Inspiradas” surgiu em 2023, idealizado por Rosane Bonamigo, com a proposta de promover encontros semanais voltados ao estudo da História da Arte e à troca sobre processos criativos. Embora o convite inicial tenha sido aberto a todos os artistas visuais da Confraria Sociartista, a iniciativa se consolidou com seis mulheres; Adriana Teixeira, Ana Oiticica, Lúcia Monte Serrat, Luciana Rondon, Patrícia Helney e a própria

O nome da exposição “Elas fora da casinha” foi criado de forma espontânea durante uma reunião, quando Patrícia sugeriu o título que foi imediatamente acolhido por todas, por traduzir com humor e leveza o espírito coletivo de sair dos próprios limites e se aventurar por novas possibilidades criativas.
Para a reportagem do Jornal O Estado, a artista Adriana Teixeira, com mais de 35 anos dedicados à pintura em tela, contou como projeto nasceu de encontros semanais marcados por trocas intensas e estudos, como os sobre a Escola Bauhaus.

“Ficamos encantadas com a liberdade criativa da Bauhaus, que incentivava a experimentação e o diálogo entre linguagens. Isso nos motivou a combinar técnicas e materiais que pareciam distantes para nós.Foi lindo ver as ideias surgindo, as mãos trabalhando juntas, cada uma saindo da zona de conforto. No fundo, estávamos honrando esse espírito de integrar arte e vida”.

Luciana Rondon, psicóloga de formação, se considera artista profissional desde 2018, quando participou de sua primeira exposição aberta ao público. Para a exposição, ela encarou o desafio de criar com materiais inéditos em sua trajetória.

“Foi maravilhoso me permitir ir além! No começo, tive dificuldade em soltar a criatividade, por causa de crenças que me limitavam a ficar no conhecido, que são as telas. Mas aos poucos me abri para o novo, e tudo começou a fluir. O ponto de virada veio com o desafio coletivo de trabalhar com peças de ventiladores. Esse exercício foi essencial para romper barreiras internas e dar corpo a uma criação mais ousada”, conta a artista.

Instalação coletiva Inspirada – Foto: Adriana Teixeira/Divulgação

Lugar de Reflexão

Aos 74 anos, a artista Ana Oiticica, professora aposentada com longa trajetória em exposições, traz para a mostra sua paixão por múltiplas linguagens, especialmente bonecos e pintura em tecido. Cada obra da exposição foi criada a partir de utensílios recicláveis, e Ana destaca o uso da grade de ventilador como símbolo central desse processo criativo.

“Foi muito divertido. Criar algo novo é sempre um desafio, mas também uma grande oportunidade. Cada uma deu seus palpites para criar o todo. Foi uma experiência rica, que deveria se repetir, inclusive com outros artistas. É algo muito construtivo”.

Com 33 anos de carreira nas artes visuais, Rosane Bonamigo é artista plástica, empresária e arte-educadora, reconhecida por obras que mesclam técnicas com aparência de aquarela.Na exposição, Rosane destaca a importância do coletivo “Inspiradas” como espaço de troca e crescimento.

“Participar do grupo é dividir pedaços da vida artística e ampliar horizontes culturais. Já sou acostumada a trabalhar com objetos recicláveis, mas encarei o desafio. Criei obras na técnica de ‘assemblage’ como homenagem às mulheres da minha família. Foi um resgate afetivo da força criativa feminina, expressa através da linha e da lã, mesmo que em objetos utilitários”, conta Rosane.

Lúcia Monte Serrat, arte-educadora e artista visual com 50 anos de carreira, destaca que sua participação tem ampliado seu processo criativo por meio do reaproveitamento de materiais. Em conjunto, o grupo criou uma instalação que reflete discussões sobre a mulher e seu lugar no mundo, representando um pouco de cada integrante.

“O desafio surgiu a partir dos nossos estudos sobre a história da arte, que nos motivaram a mexer em nossos processos e explorar novas técnicas, como a aquarela. Apesar de termos processos individuais, respeitamos muito o trabalho umas das outras. Esperamos que o público faça reflexões sobre o papel da mulher e sobre a reutilização consciente de materiais descartáveis”.
Saindo da zona de Conforto

Reflexões

Artista Adriana Teixeira – Foto: Adriana Teixeira/Divulgação

A questão da sustentabilidade tocou profundamente o grupo, que percebeu que, além de exercitar a criatividade, estava dando um novo significado ao que seria descartado, mostrando que a beleza também pode nascer do reaproveitamento. No fim, ficaram felizes ao perceber que, de alguma forma, sua arte contribuiu para o bem do planeta o que tornou todo o processo ainda mais especial e cheio de significado.

Patrícia Helney é artista plástica e ilustradora com uma trajetória marcada por mais de 130 exposições e 29 prêmios nacionais e internacionais. Durante a exposição, ela compartilha a experiência de romper com a zona de conforto.Para Patrícia, a proposta da mostra dialoga com o momento atual, que exige atenção aos resíduos e convida a sociedade a repensar caminhos.

“Sair da casinha me levou a um lugar de reflexão. É difícil, mas o grupo facilita esse processo, uma apoia a outra, e isso torna tudo mais possível”, afirma. “A arte tem esse poder de ressignificar não só os materiais descartados, mas também a nós mesmas”.

Para Luciana Rondon, uma das artistas participantes, o convite vai além do olhar estético: ela espera despertar nos visitantes uma reflexão profunda sobre o poder pessoal, a força interior e a resiliência.
“Queremos que cada pessoa possa olhar para dentro de si, enxergar com o coração e a alma, e perceber que, apesar das dores e lutas, somos corajosos e capazes de transformar e ressignificar o passado quando for necessário”, destaca Luciana.

Adriana Teixeira finaliza destacando que gostou tanto da experiência que já pensa em produzir novas obras usando a técnica de colagem explorada na exposição. Durante a mostra, o trabalho que ela desenvolveu, batizado de “Veredas”, recebeu muitos elogios.

“Nós todas sempre tivemos muito cuidado com o acabamento das peças. Só porque usamos materiais reaproveitáveis, não quer dizer que as obras fossem descuidadas. Queremos que as pessoas percebam que cada peça carrega histórias, trocas, desafios e afetos compartilhados. Que enxerguem que, muitas vezes, é justamente ao romper as próprias barreiras que nascem as maiores descobertas”.

Serviço: A exposição “Elas Fora da Casinha” foi inaugurada no último dia 2 de julho e segue aberta ao público na Galeria Leonor Lage (Av. Nelly Martins – Portal Itayara), às terças e quintas, das 14h às 17h, e aos sábados, das 9h às 11h30.

 

Amanda Ferreira

 

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